O segundo volume do livro de Rui Estrela, A publicidade no Estado Novo (da editora Caminhando), analisa o período de 1960 a 1973 (em post de 10 de Março, fiz referência ao primeiro volume da obra). No estudo - correspondente a tese de doutoramento defendida na Universidade de Salamanca -, o autor, professor universitário de marketing e publicidade, são abrangidas as áreas da imprensa, cartaz, cinema, rádio e televisão.
Se, no começo do período em observação, a imprensa era o principal receptor da publicidade, a televisão assumiria a liderança no final do período (p. 15). 1970 foi o ano em que a televisão passou a captar mais investimento publicitário que a imprensa, ainda que mínimo (39,9% contra 39,8%). Ao mesmo tempo, as revistas especializadas adequavam-se a públicos específicos [reprodução autorizada pela editora Caminhando da capa e de anúncios incluidos no livro].
Em 1960, Rui Estrela refere a existência de cerca de 200 diários e semanários, número que sobe para 250 em 1973. O preço de publicidade por página era de €25 no Jornal de Notícias (Porto) e de €50 no Diário de Notícias (Lisboa), em 1973. Quanto ao Século, também aqui na capital, oferecia vantagens em termos de pagamento. Mas desenvolvia-se uma área de revistas, algumas associadas com a televisão e outras orientadas para o público feminino: a Crónica Feminina, carregada de anúncios com produtos de beleza, higiene e saúde, tinha um preço de publicidade por página mais elevada: €63, em 1971 [optei por passar para euros os valores indicados no livro em escudos, porque me parece mais fácil raciocinarmos em termos da presente moeda].
Rui Estrela (aqui na imagem ao lado) aplica uma bem elaborada grelha para análise dos anúncios, tendo feito muito trabalho de classificação. Ele considera o estilo informativo o mais usado no período (1960-1973), presente nos transportes, turismo e banca, a que se seguia o estilo comparativo, que se usava em 20% dos anúncios de imprensa (electrodomésticos, automóveis, produtos alimentares, higiene e beleza). O estilo promocional chegava aos 10% - a época da óptica de vendas - e incluía o sector de higiene e beleza, caso dos detergentes, e electrodomésticos. Anunciantes importantes seriam a Companhia dos Telefones, Gazcidla, banca e RTP (promoção de programas). No sector de automóveis, verificar-se-ia uma diminuição dos anunciantes norte-americanos, um aumento dos europeus e o surgimento, mais para o final do período, dos construtores japoneses (p. 28). O sector relojoeiro, outrora uma fatia importante no mercado publicitário, perdia influência, o mesmo ocorrendo com o sector têxtil, ao passo que as empresas de higiene e beleza desviavam os seus investimentos publicitários para a rádio e para a televisão.
Os media audiovisuais
Cartaz, cinema, rádio e televisão passam a ter fatias mais elevadas em investimentos publicitários, que Rui Estrela analisa com muito pormenor. Anunciantes e empresas produtoras merecem adequada atenção. Para não alongar a mensagem - e não substituir o livro, que se lê com muito agrado -, detenho-me na produção de filmes publicitários. A Telecine-Moro era a maior produtora: realizou, entre 1960 e 1968, cerca de 31% dos filmes para o cinema. Chegava-se a uma altura de transferência de consumo deste meio audiovisual para a televisão, mas em que esta ainda operava a preto e branco. Em 1965, o preço do filme publicitário produzido pela Belarte, outra empresa de topo, com 30 metros (ou 15 segundos), exibido uma vez por sessão durante uma semana, custava cerca de €27. No início da década seguinte, a Belarte cobraria já €35 (p. 37).
A rádio captava cerca de 25% do total do investimento publicitário, em 1970, chegando assim aos €560 mil. As grandes vozes da rádio, como Artur Agostinho, Henrique Mendes, Igrejas Caeiro, Mary Tarant, Matos Maia e os irmãos Andrade, eram algumas delas. Gravados já em suporte magnético, o preço da publicidade ao fim do dia (19 às 20 horas) por 20 segundos era de €0,9 no Rádio Clube Português e €0,32 nos Emissores Norte Reunidos (Porto). O estilo de anúncio era o musical.
Finalmente, quanto à televisão, os anúncios iniciais eram dados em directo, com uma demonstradora a falar do produto. Por vezes, havia enganos. O primeiro equipamento de videotape seria comprado pela RTP em 1960. Do mesmo modo que tinha peso no cinema, a Telecine-Moro tornou-se a principal produtora de filmes publicitários para a televisão. De meados dos anos 1960 a 1974, 80% dos filmes publicitários na televisão pertenceram a essa produtora. Em 1967-1968, um filme de 15 segundos custava €12500 (preto e branco) ou €37500 (cores). O locutor recebia entre €1 e €1,25.
No período de 1960 a 1973, Rui Estrela observa os seguintes traços: 1) aumento considerável do negócio publicitário, 2) desenvolvimento de antigas agências e aparecimento de novas agências, 3) maior organização interna, 4) importância crescente dos meios rádio, cinema e televisão, 5) maior variedade de estilos, 6) necessidade de formação contínua e contactos diversificados com o estrangeiro, através de congressos nacionais e internacionais, 7) aparecimento de associações profissionais (pp. 126-127).
Com um sentido muito pedagógico, a obra tem, em cada começo de capítulo, uma síntese de enquadramento político e económico, bem como elementos demográficos e sócio-culturais, tudo para tornar mais compreensível o período em observação.
Leitura: Estrela, Rui (2005). A publicidade no Estado Novo. Volume II (1960-1973). Lisboa: Comunicando
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