CAPITALISMO DE IMPRENSA
Saíu em português o livro de Benedict Anderson, Comunidades imaginadas (em colecção das Edições 70), que eu já destaquei aqui no blogue. Trata-se de um texto fundamental para a compreensão dos mecanismos que promovem (e promoveram desde sempre) o nacionalismo. Mas é a análise da interacção entre capitalismo e imprensa no livro de Anderson que me fascina e me leva a escrever sobre ele.
Por capitalismo de imprensa, o autor entende um conceito vasto que cobre a edição livreira desde o séc. XVI e que se traduz num conhecimento que vive da reprodução e da disseminação (se quisermos, podemos aqui associar textos de Walter Benjamin, Harold Innis e Marshall McLuhan, que escreveram sobre o tema). Seguindo um livro de referência, de Lucien Febvre e Henri-Jean Martin (L'apparition du livre, 1958), Anderson detém-se no mercado inicial de leitores de latim e no aproveitamento posterior das línguas vernáculas para uma crescente produção de livros. As obras de Lutero representariam um terço dos livros em língua alemã vendidos entre 1518 e 1525 (p. 67). Entre 1522 e 1546 surgiram 430 edições das suas traduções da Bíblia.
Faziam-se novos públicos, incluindo comerciantes e mulheres, que não dominavam o latim mas línguas vernáculas, e instituiam-se instrumentos de centralização administrativa na Europa moderna. As nações debutavam apoiadas na língua e na imprensa. A principal característica da língua é a capacidade de gerar comunidades imaginadas, construir solidariedades particulares (p. 176). O fundamental do livro impresso é a manutenção de uma forma permanente, através da sua reprodução infinita.
Num outro lugar do texto, Benedict Anderson estuda a imprensa americana, que começara por ser um apêndice do mercado. Escreve ele: "As primeiras gazetas continham - para além de notícias sobre a metrópole - informações comerciais (datas de partida e chegada de navios, preços habituais de determinads mercadorias em determinados portos), bem como sobre as nomeações políticas nas colónias, os casamentos nas famílias ricas, etc." (p. 93). Esta imprensa adquire um carácter particular, pois se um crioulo (nascido numa colónia, apesar de descendente de metropolitanos europeus) poderia ler um jornal de Madrid, por exemplo, embora nada encontrasse sobre o seu mundo, o funcionário peninsular, mesmo que morasse na mesma rua, evitaria ler o jornal da colónia.
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