SOCIOLOGIA DO JORNALISMO - UM LIVRO DE MICHAEL SCHUDSON
O livro The sociology of news, de Michael Schudson, é uma introdução ao estudo das notícias. Schudson analisa a questão dos efeitos das notícias, caso do modelo hipodérmico, de propaganda ou doutrinação, em que os media injectam ideias a um público passivo e indefeso. Neste modelo, a notícia enquadra e amplifica a posição de uma fonte, com o jornalista a ser simples mensageiro e não produtor autónomo da agenda pública (p. 28). Apesar de ultrapassada logo nos anos 40 do século passado, Schudson recupera, da teoria, o conceito de enquadramento: um jornalista faz o registo narrativo da realidade, mostra ângulos de vista, destaca e apresenta o que existe.
A notícia organiza-se como narrativa, decomposta em duas perspectivas, cultural e organizacional. Pela perspectiva cultural, a notícia centra-se na estória e destaca a relação entre facto e símbolo; pela organizacional, vê a notícia como produto manufacturado na interacção de empresas, mercado e recursos (p. 182).
Estuda-se também o fenómeno da distorção. Esta centra-se no acontecimento, na acção e na personalização, apresenta uma crescente negatividade quanto aos factos, associada ao olhar céptico e irónico do jornalista, realça as questões estratégicas e tácticas das fontes, como nas campanhas eleitorais, mostra a dependência dos jornalistas perante fontes oficiais e poderosas e revela a tendência para a glorificação do trabalho do próprio jornalista (p. 48). Mas Schudson detecta alterações neste quadro. Por exemplo, deixa de ser constante o centramento no acontecimento, pois os jornalistas escrevem mais peças analíticas sobre temáticas (pp. 219-220).
De outras transformações trata Schudson: o aumento do infotainment (mistura de informação e entretenimento) e da tabloidização (sensacionalismo e intrusão de valores de mercado sobre o profissionalismo dos jornalistas) (p. 90). A ideia de esquema de jogo, da corrida de cavalos (lutas nas campanhas políticas) e do cobrir a política como escândalo, com maior divulgação da vida privada das figuras públicas, ganha peso no jornalismo actual. Isto enquanto os jornalistas fazem face aos parajornalistas (empresas de relações públicas, responsáveis de informação pública, spin doctors, publicitários), que tentam orientar em seu proveito o desenrolar de acontecimentos (p. 2).
Porém, conclui Schudson, se cresce o cinismo dos jornalistas e a orientação para o infotainment, a informação é mais credível. Tal deve-se, segundo o sociólogo americano, à intervenção profissional dos jornalistas, ao aumento da coerência narrativa ou temática das notícias e ao consenso noticioso inter-institucional. Nota Schudson que as organizações noticiosas dão muita atenção à concorrência, vigilância que se traduz na elaboração de uma agenda nacional quase única (p. 110): os temas mais importantes têm tratamento semelhante nas cadeias de televisão e nos jornais. O livro é, assim, um registo dos media contemporâneos: história do jornalismo, estruturas e práticas profissionais, códigos e culturas, e impacto das notícias na sociedade, em especial as notícias políticas.
Michael Schudson é professor de comunicação e sociologia na universidade da Califórnia, San Diego. Escreveu nomeadamente Discovering the news (1978), Advertising, the uneasy persuasion (1984) e The power of news (1995).
Leitura: Michael Schudson (2003). The sociology of news. Nova Iorque e Londres: W. W. Norton, 261 páginas (obs.: este meu pequeno texto foi publicado na revista JJ - Jornalismo e Jornalistas)
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