Textos de Rogério Santos, com reflexões e atualidade sobre indústrias culturais (imprensa, rádio, televisão, internet, cinema, videojogos, música, livros, centros comerciais) e criativas (museus, exposições, teatro, espetáculos). Na blogosfera desde 2002.
domingo, 27 de maio de 2007
NOTAS - 1
No programa de Marcos Pinto, Toda a Tarde, no Rádio Clube Português, de ontem, Rui Castelar e Luís Filipe Costa participaram como velhas glórias da estação, recordando histórias do seu tempo. Também Lara Santos (actual programa Posto de Escuta) e eu estivémos no Toda a Tarde, indo das 4 às 6 da tarde.
A honra maior foi, inevitavelmente, para Rui Castelar e Luís Filipe Costa, memórias vivas de um tempo fabuloso da rádio. E, a partir da audição de antigos anúncios publicitários, avivaram-se as recordações. Num dos anúncios, que publicitavam o vinho Messias, a voz de Elvira Velez aparecia identificada como "aquela santa". A personagem fazia parte de um sketch humorístico do programa Companheiros da alegria, de Igrejas Caeiro. A popularidade da personagem interpretada por Elvira Velez, reputada actriz, era suficiente para passar à publicidade.
Rui Castelar que, quando jovem, queria ser actor ou advogado - duas profissões próximas, afiançou -, ganhou alguns quinhentos escudos com o programa Companheiros da alegria. Igrejas Caeiro tinha uma rubrica no programa que premiava populares que dissessem poesia ou cantassem. Então, Rui Castelar, animador frequente de espectáculos, quer apresentando-os quer lendo poesia, repetia o êxito nos programas de Caeiro, sempre que eles fossem em zonas não muito longe de Lisboa. O que levou o autor dos Companheiros da alegria a não querer mais a presença de Castelar nas redondezas do programa.
Luís Filipe Costa contaria a história dos passarinhos. Nas vésperas de um Natal, no auditório onde a nossa conversa decorreu, chegaram 50 ou 60 gaiolas com passarinhos. Foram fechadas as janelas com flanelas pretas e apagadas as luzes, apenas entrecortadas pela entrada de um homem a colocar água e alpista para alimentação dos pássaros. Por volta das onze da noite da véspera de Natal, arrancaram-se as flanelas e ligaram-se todas as luzes - e os microfones também. Os passarinhos começaram a cantar. Era o concerto de Natal do Rádio Clube.
A comparação entre a rádio dos anos 1960 e 1970 e de hoje foi outro mote para a conversa, em especial Rui Castelar e Luís Filipe Costa. Rui Castelar, realizador de muitos programas, tinha sempre convidados. Quando chegavam cedo, ou após o programa, passavam pelo bar, O Coice, onde o uísque custava 12$50. Para disfarçar, havia quem o bebesse por uma chávena de chá. Rui Castelar, puxando das memórias, considerava esse tempo como sendo de grande convívio e até de grande solidariedade. A produção na rádio tinha um lado muito artesanal, caso de pôr discos de vinil e fazê-los rodar manualmente para trás e para a frente, como um disc-jockey hoje faz. Os realizadores tinham liberdade total para fazer programas, apenas tinham de cumprir o horário. Agora, muitas rádios cumprem uma playlist e os realizadores chamam-se animadores.
A distinção entre jornalista e locutor foi outro assunto recordado. Até um dado momento, o jornalista escrevia e o locutor lia (o chamado papagaio). O Rádio Clube, que teria, por essa altura, 10 a 11 jornalistas, procurou juntar a competência de ambos os lugares para reduzir o número de colaboradores. Para isso, procuravam-se as melhores vozes. De voz fanhosa, Luís Filipe Costa conta que, um dia, se cruzou com Maria Leonor, então uma figura de proa da Emissora Nacional, que lhe disse: "ó menino, você precisa de ter cuidado. Portugal é um país pequeno. Não aguenta dois fanhosos. Já basta o Fernando Pessa".
A procura de vozes era uma tarefa que Rui Castelar se propunha fazer. Levava-as para o seu programa. Contudo, as suas chefias, apercebendo-se da sua qualidade, convidavam os profissionais para a leitura dos noticiários, obrigando o realizador a fazer novas pesquisas. "Eu pagava-lhes poucochicho", comentaria Rui Castelar.
O assalto ao Banco de Portugal da Figueira da Foz pela LUAR, grupo que se opunha ao regime político de Salazar,foi também tema de conversa no programa. Luís Filipe Costa lembrou que tal notícia não podia ser lida no noticiário, devido à censura. Mas toda a gente em Lisboa já sabia do acontecido - o que prova que as informações chegam mesmo sem ser pelos media. O jornalista, de serviço na redacção, aproveitou a leitura do boletim metereológico para concluir a sua apresentação: "Felizmente, há luar".
Claro que, ouvindo os anúncios e as frases mais famosas sobre a rádio nas várias décadas deste meio de comunicação, veio à baila o filme de Arthur Duarte, A menina da rádio, mais a interpretação de António Silva no mesmo filme. E recordou-se igualmente Fernando Curado Ribeiro, o galã do filme e, igualmente, uma voz do Rádio Clube Português.
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