domingo, 27 de julho de 2008

ARTIGOS SOBRE LIVROS


Da leitura de jornais neste fim-de-semana, encontrei vários sobre livros, mostrando aspectos sociológicos e tecnológicos.

O primeiro que quero destacar é o saído no Expresso de ontem e assinado por Luís M. Faria. O ponto de partida do artigo é o reconhecimento que a "leitura é uma das maiores conquistas da Humanidade e também uma das mais estáveis". Se a leitura nos últimos séculos tem estado assente no papel, a tecnologia de tinta electrónica parece estar a abrir um caminho diferente. O Sony Reader em 2006 e o Kindle mais recentemente representam a ponta tecnológica dessa mudança. Escreve Faria, seguindo Jeff Bezos, da Amazon, que música, cinema e leitura curta se renderam já ao digital, o que acabará por acontecer ao livro, ainda em tecnologia analógica. Um dos sucessos da tecnologia de tinta digital é que o aparelho não precisa de luz por detrás do texto, o que permite economizar energia. Isto além de poder armazenar muitos livros numa só memória e possibilitar a pesquisa por palavras - como se faz num texto em Word.

Já o texto de Isabel Coutinho, ontem no Público, fala igualmente de tecnologia, mas opõe o mesmo Kindle ao iPhone. Nos textos mais recentes da jornalista, é óbvia a simpatia que ela nutre por este segundo aparelho. E, na presente peça, argumenta ainda mais razões: o Kindle tem imagem a preto e branco, não é táctil, não tem o telefone do iPhone (e outras potencialidades como o tipo de programas, que incluem o PowerPoint e o Word) e será substituído por um novo modelo com ecrã maior. Mesmo que a Amazon, a detentora do Kindle, queira entrar no mercado do livro escolar, que vale nos Estados Unidos mais de cinco mil milhões de dólares.

Quanto ao texto do Público de hoje, assinado por Sudarsan Raghavan, o livro é apresentado como meio de cultura e de resistência política e cultural. A reportagem fala de uma livraria de Bagdad, de Nabil al-Hayawi. De sessenta anos, dirige a Renaissance, livraria que o seu pai abriu em 1957 na rua Mutanabi. Diz o texto que a livraria, após a invasão americana, expôs textos religiosos xiitas, literatura sunita wahhabi extremista e revistas ocidentais com mulheres pouco vestidas. Com o aumento da expressão religiosa extremista, a livraria passou a vender unicamente textos religiosos xiitas, o Corão e dicionários de inglês. No ano passado, al-Hayawi seria vítima da explosão de um carro armadilhado mesmo em frente à livraria, que lhe matou o seu único filho e quase também o matou, tendo de fazer várias operações e movimentando-se agora com muita dificuldade. Esta parte do texto é muito pungente, e igualmente a imagem do velho livreiro. Mas diz ele: "O Iraque é a minha alma. Eu vou e venho. Mas nunca partirei".

Isto é: enquanto as peças noticiosas que se referem à indústria do livro nos Estados Unidos dão um destaque inaudito à tecnologia e à desejada rápida substituição do livro em papel, a reportagem sobre a livraria de Bagdad mostra o livro como meio de conhecimento e tolerância, como objecto de cultura e património da humanidade. Aparentemente, temos aqui um movimento a duas velocidades. Ou mesmo dois mundos. Qual deles vai persistir? Qual o de maior valor simbólico? Ou: será que o livro digital manterá o espírito de cultura e de resistência, guardado em espaços onde as pessoas se encontram (ao sábado na livraria iraquiana, a qualquer dia nas nossas livrarias) e discutem, formando um dos meios mais importantes do espaço público moderno?

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