segunda-feira, 17 de novembro de 2008

A TELEVISÃO SEGUNDO FRANÇOIS JOST


François Jost tem um blogue, o Comprendrelatele, onde analisa a actualidade, a entrevista, os noticiários e a programação televisiva. No passado dia 22 de Outubro, ele respondeu a perguntas de Jair Fernandes Melo, do jornal brasileiro A Tarde (ver aqui, com tradução de Simone Ribeiro). Uma das perguntas foi: "Em seus livros, o senhor aponta três mundos onde se inserem os programas de televisão: real, ficção e jogo. Os reality shows são uma mistura deles três"?

Respondeu François Jost:


  • A novidade relativa da telerrealidade é que ela se presta melhor a variadas interpretações que os programas antecessores: quando a versão francesa do Big Brother foi lançada (Loft Story), o produtor e a mídia o ancoraram na realidade. Depois eles recuaram diante das críticas de que o programa forjava o conteúdo e se defenderam “não, isso não passa de um jogo”. Hoje, os animadores apresentam com freqüência alguns desses formatos como se fossem uma brincadeira. Depois foi pedido aos candidatos para parecer aquilo que eles não eram: por exemplo, um maçom se fazer passar por um milionário (Joe Milionário). Em O Incrível Noivo, um comediante fazia sem o conhecimento da candidata o papel de um rapaz detestável para desagradar a seus pais. A telerrealidade, portanto, pouco a pouco se transformou em ficção. Do ponto de vista da recepção, é a mesma incerteza: algumas pessoas tomam esses programas por realidade, outros por um jogo, de acordo com o grau de conhecimento que se tem da fabricação do programa. Eu não diria que os reality shows são uma mistura dos três mundos, mas talvez que possam ser deslocados de um lado para o outro segundo os diferentes atores da comunicação.
O livro de Jost, Seis Lições sobre Televisão (2004), oferece uma leitura semiótica sobre o meio audiovisual. Dividido em seis capítulos, correspondentes ao mesmo número de aulas, nota-se um crescendo teórico no seu texto. Assim, a um primeiro capítulo sobre comunicação televisiva, Jost apresenta a dicotomia de modelos de contrato e de promessa. No segundo capítulo, ele fala de três mundos do meio: real, fictício e lúdico. Na terceira aula assiste-se à aplicação das oposições anteriores ao reality-show, enquanto na quarta aula Jost interroga a origem da ficção através da escrita de John Searle. Se a quinta aula se posiciona entre a ficção e a realidade, a partir de um texto de Käte Hamburger, no sexto capítulo o autor vai buscar inspiração a Gérard Genette, autor que estudou profundamente.

De Genette retira, por exemplo, a noção de tempo, decomposta em ordem, duração, frequência. Genette trabalha também a categoria de focalização, a relação de conhecimento entre o narrador e a personagem (p. 128). O conhecimento do narrador é maior que o conhecimento das personagens (focalização zero), tanta como a das personagens (focalização interna) e menor que a personagem (focalização externa).

Um outro conceito que Jost operacionaliza é o de contrato, usado por analistas do discurso e por semióticos. Fala-se, por exemplo, de contrato com o leitor. Em televisão, diz ele, contrato pode definir o acordo pelo qual emissor e receptor reconhecem que se comunicam e o fazem por razões compartilhadas (p. 9). Mas se o número de receptores se alarga, por exemplo, para um milhão, esse contrato torna-se difícil de compreender. Por isso, Jost propõe a sua substituição pelo modelo de promessa. Dá o exemplo da comédia, que existe para fazer rir, ou do "ao vivo", que ilustra a autenticidade e simultaneidade do momento.

Leitura: François Jost (2004). Seis lições sobre televisão. Porto Alegre, Rio Grande do Sul: Editora Sulina

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