Textos de Rogério Santos, com reflexões e atualidade sobre indústrias culturais (imprensa, rádio, televisão, internet, cinema, videojogos, música, livros, centros comerciais) e criativas (museus, exposições, teatro, espetáculos). Na blogosfera desde 2002.
sexta-feira, 9 de janeiro de 2009
PORTO, TASCAS DO PORTO
O livro de Raul Simões Pinto, com fotografias de Gabriela Felício e prefácio de Helder Pacheco, intitulado As Tascas do Porto. Estórias e Memórias Servidas à Mesa da Cidade, foi editado em Novembro de 2007 e teve uma segunda edição em Janeiro de 2008. Descobri-o agora.
Se os cafés são espaços mais "educados" e "polidos" de discussão e formação da opinião pública, as tascas (ou tascos, no masculino) podem igualmente sê-lo, talvez numa versão mais rude ou popular (a interpretação é do autor da mensagem; estou aberto a críticas). No prefácio, Helder Pacheco aponta o "operariado das fábricas, do mar e da terra, em cujos bairros os tascos eram instituições obrigatórias". O mesmo prefaciador indica que os tascos (as tascas) é um mundo masculino fechado, pois, durante muito tempo, as crianças e as mulheres sérias não podiam entrar. E é à noite, continua, que lá se encontram os melhores amigos, com discussões abertas sobre coisas sérias: política, amores, problemas sociais, questões de honra ou de dinheiro. Acrescento eu: e futebol.
Pelo que pude ver através do Google, Raul Simões Pinto é licenciado em filosofia pela Faculdade de Letras do Porto, bacharel em Comunicação Social e com pós-graduação em Direito da Comunicação, organizador de feiras do Livro Alternativo, membro da comissão de utentes do Bairro da Pasteleira para a manutenção de carreiras de transportes públicos, fundador do fanzine Pé de Cabra, em 1979. Mais conhecido por o filho do 39, Eduardo Augusto (ou Dino), o proprietário de uma tasca na rua da Pasteleira, no número 39 - daí o apelido. Além das tascas e do fanzine, Raul Simões Pinto envolveu-se noutras aventuras literárias, como o livro Pasteleira City (não sei se o título é correcto) e e Putas à Moda do Porto, numa configuração de autor de escritas populares e marginais, possivelmente sempre à volta das gentes do bairro onde não nasceu, mas que o criou (Público, creio que de 25 de Dezembro último, pois acedi ao ficheiro em formato cache).
As Tascas do Porto. Estórias e Memórias Servidas à Mesa da Cidade é um livro fantástico: pelo levantamento das tascas actuais existentes no Porto, com base em pequenos inquéritos aos seus proprietários, que dão conta do que servem de comida e de bebida, ficando-se com um roteiro clássico desses locais; pela contagem das tascas já desaparecidas, o que permite ver a mudança de hábitos ou a reconfiguração dos locais, pois muitos são agora restaurantes, no apagamento da marca social do vinho e do embriagado, pelas memórias vividas pelo autor e por relatos de pessoas mais velhas, numa reconstituição de uma certa memória cultural e de formação do espaço público urbano e mais local (bairro, rua). Registo a página 31, onde fala de utensílios desaparecidos ou em vias disso: mosqueteiros de arame e rendas brancas no balcão, salgadeiras, escarradores, serrim para limpar o vinho derramado. E dos jogos: sueca, damas, dominó, com mealheiros de madeira com ranhura e nome do cliente, preparação de jogos de futebol popular entre solteiros e casados, com uma petiscada no fim e taça para a equipa vencedora. E que públicos flutuantes as frequentavam? Cauteleiros, azeiteiros (vendedores ambulantes com o seu burro de carga), carteiristas, fadistas, malabaristas, amoladores, e muitos mais.
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