Textos de Rogério Santos, com reflexões e atualidade sobre indústrias culturais (imprensa, rádio, televisão, internet, cinema, videojogos, música, livros, centros comerciais) e criativas (museus, exposições, teatro, espetáculos). Na blogosfera desde 2002.
domingo, 4 de janeiro de 2009
VALSA COM BASHIR
Os planos iniciais de A Valsa com Bashir são de uma simultaneamente grande beleza e terror: cães pretos de olhos amarelos e dentes afiados (parecem lobos) em grande corrida na direcção de um homem que espreita à janela da sua casa. Alucinação de um antigo soldado israelita que matara cães na guerra do Líbano de 1982.
O filme, um documentário em forma de animação, com entrevistas a antigos soldados na frente de combate israelita dessa guerra, psicólogos, políticos, narra a redescoberta (ou recuperação da memória) de Ari Folman, o realizador do filme e ele próprio soldado nessa época. A lenta recordação dos massacres de campos de refugiados palestinianos em volta de Beirute, como vingança pelo assassinato do recém-eleito presidente Bashir Gemayel, exerce uma forte pressão sobre os espectadores. Mesmo que se trate de um filme de animação, a descrição dos acontecimentos e as histórias que ele conta são de um grande realismo.
Nos dias em que decorre uma nova guerra em que entram israelitas e palestinianos, agora na Faixa de Gaza, o filme não deixa de ser oportuno. Por nos mostrar os horrores da guerra, o pouco valor da vida humana (em especial os cidadãos inocentes), o medo dos que são retirados de suas casas com destino incerto e o igual medo nos jovens soldados israelitas. Estes, após a guerra, procuram esquecer o medo e o horror, para que a vida pareça continuar igual.
A valsa é, afinal, a do soldado que se julga valente e pretende atravessar a estrada para o outro lado e surpreender os adversários, mas que acaba por não conseguir. Quanto tempo dura esse acto? Cinco segundos, quinze segundos, meio minuto? Parece uma eternidade o que não passa de um movimento em direcção à morte.
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