quarta-feira, 26 de agosto de 2009

ROCHAS NA PRAIA

Para mim, a rádio é um meio mais sério que a televisão.

É uma perspectiva muito pessoal e carece de esclarecimento prévio: a rádio, porque não possui imagem, é um meio mais pobre. Num acontecimento, na televisão, podem ver-se pessoas, se entrevistadas, a rir quando a situação é dramática, ou a fazer corninhos e a saltar, as respostas podem roçar a imbecilidade. A rádio quase sempre é mais circunspecta e pedagógica.

O acidente na praia Maria Luísa (Albufeira, Algarve), que causou a morte de cinco pessoas, merece alguma reflexão sobre o modo como os media retrataram o acontecimento. Pessoas entrevistadas na televisão, deitadas a apanhar sol, responderam invariavelmente que o Estado era o responsável pela queda da arriba (como se os cidadãos em si não soubessem reconhecer o perigo, nomeadamente quando ele está assinalado). Outras diziam que, apesar do acidente, continuariam a abrigar-se nas rochas mesmo que elas apresentassem perigo de morte, no sentido que se aconteceu uma vez haverá poucas probabilidades de voltar a ocorrer. Pessoas pediram para ser fotografadas no local para ficarem com uma memória, tipo: aqui junto a esta pedra morreram umas pessoas. Familiares de uma vítima no regresso a casa queixaram-se da falta de apoio (presumo que psicológico; mas haverá uma cartilha de apoio a vítimas?). A televisão deu em directo a destruição da rocha que se desagregara parcialmente provocando a morte de banhistas em redor: uma escavadora tornava-se a estrela principal da história; com essa limpeza, ela iria fazer esquecer a mágoa.

A rádio foi menos exuberante, pois falta a imagem, como escrevi acima. Contudo, hoje de manhã, ouvi uma reportagem com grande falta de bom senso. A jornalista entrevistava um nadador-salvador que, na sua simplicidade, dizia: as pessoas gostam das rochas porque apanham sombra. Logo depois, enumerava algumas rochas que deveriam ser destruidas por falta de segurança. Contradições que a jornalista não soube aproveitar.

A informação dada ao longo dos dias não foi adequada, foi sensacionalista, usou directos desnecessários, entrevistou gente que não viu e que pouco podia adiantar a não ser coisas banais. Na sofreguidão da concorrência entre emissoras, as empresas de audiovisual tornam imbecil qualquer informação, descredibilizam-na, aproximam a informação da ficção - e neste caso da ficção trágica.

Os jornalistas deveriam reflectir nas condições de urbanismo, por exemplo, e retirar daí conclusões sobre a pressão nos terrenos. Ou sobre a necessidade moderna de bronzear a pele e estar na praia todo o dia, procurando-se uma sombra para reduzir a fadiga do corpo sufocado por tanto calor. Como Nelson Traquina ensina há muitos anos: as notícias são sobre os acontecimentos e não sobre as problemáticas. O que nos chega do trabalho dos jornalistas é a espuma dos acontecimentos, faltando-lhe sempre as ligações, as razões, os porquês. É uma época de jornalismo leve, adequado ao mês quente em que estamos.

[imagens da Praia da Rocha, Portimão]

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