sábado, 14 de abril de 2018

Vedetas dos programas infantis de rádio (final da década de 1930)


Na década de 1930, a programação infantil na rádio tinha um conjunto de pequenas vedetas, reconhecidas por nomes diminutivos. O Século Ilustrado (17 de dezembro de 1938) dedicou algumas páginas a revelar ao público essas vedetas, de onde retiro as imagens. Na época, havia revistas em papel destinadas a um público juvenil e infantil e associadas a programas de rádio. Pela amostra das estações de Lisboa, parecia haver mais vedetas meninas do que rapazes.

Um grupo era constituído por Mimi, Odete Passos de Saint-Maurice (autora de programas juvenis até cerca de 1974) e Julieta Marques Cardoso, para Rádio Clube Português, então a emitir da Parede. Além da fotografia em grupo, Mimi aparece sozinha, sorridente, quase irreverente e de cabelo de franjas.

Outra pequena vedeta era a Esterinha das emissões Papagaio ( Rádio Renascença), na  fotografia em cima de uma cadeira. Ester de Lemos (1929-), depois licenciada em Filologia Românica, seria assistente de programas literários da Emissora Nacional (1956-1959), deputada em 1965 e docente universitária (1957-1963 e 1971-1974), professora do ensino secundário e docente no Instituto de Novas Profissões, de onde se reformou em 1990.

Além da Esterinha, a Rádio Renascença contava com Manon, Misette e, na fotografia de grupo e atrás, da esquerda para a direita, José Fernandes (pai Paulino), Carlos Santos (coelho), Adolfo Madeira (gato), Manuel Campos (pombo), Arnaldo Silva (tenor) e José Castelo (diretor). Pela designação dos papéis, adivinha-se o teor habitual do programa, o do tempo em que os animais falavam. Além de música e diálogos, havia ainda leitura de poemas e historietas.

A antepenúltima imagem diz respeito a Rádio Hertz, uma estação que desapareceria pouco depois, a contar com algumas Marias no elenco da programação infantil. Chamo a atenção para o design do microfone. Aliás, em todas as fotografias, o microfone é um elemento central. A penúltima imagem, da Rádio Luso, fechada no final da II Guerra Mundial, por ligação a interesses alemães, mostra outras particularidades, a do acompanhamento musical - piano e acordeão. Na imagem inicial (Rádio Clube Português), também se observa a existência de um piano de cauda e de suporte de pautas musicais. As emissões eram em direto. Certamente que haveria um tempo para ensaio antes da emissão.

Deixo para o fim uma imagem do grupo inteiro a colaborar em Rádio Graça, conjunto compacto e sorridente (O Século Ilustrado, 24 de dezembro de 1938). Às crianças, em primeiro plano, sucediam-se os outros participantes. À maneira da pintura renascentista, em que o doador (o que pagava a obra) aparecia ao canto, aqui o senhor à direita seria Américo Santos, o dono da estação. Talvez ao lado esteja Lili Santos, a filha, e intérprete de folhetim como escrevo a seguir. Pelo menos, se comparar esta à fotografia incluída no livro de Matos Maia, Telefonia, há muitas parecenças.

Rádio Graça, a estação da rua da Verónica, quase em frente a uma escola secundária, ganharia muita fama quando em 1955 começou a emitir um programa para o público jovem adulto, a radionovela A Força do Destino, título muito à Verdi mas popularizado pela Coxinha do Tide. O patrocinador era o detergente Tide, que irrompera no consumo nacional um ano antes e a coxinha era a personagem principal: Margarida, doente de uma perna, seria operada pelo Dr. Humberto Figueirola. Eles apaixonaram-se, mas havia um problema: Figueirola era casado com Raquel, prima de Margarida. O argumentista resolveu o imbróglio: matou Raquel e deixou caminho livre para Humberto. Conta quem ouviu que a morte de Raquel foi dolorosa, com a agonia prolongada em sucessivos episódios. Depois da boda do casal "bom", veio um descendente. Antes do nascimento, a Rádio Graça viu-se invadida por roupa de bebé. Quem ouvia, julgava tratar-se de coisa verdadeira.

As fotografias denotam outros elementos. Um deles é o vestuário das crianças vedetas, especialmente em dois rapazinhos (calção e meias enroladas). Um segundo é o da assistência. Na fotografia de Esterinha, há um grupo de senhoras sentadas atrás, como formando a assistência ao programa (podemos comparar à assistência e palco nos atuais programas televisivos à tarde).


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