No arquivo de fotografias de Bernardino Pires, que o filho Daniel Pires tem vindo a publicar no Facebook, destaco a que aqui ilustro. Título: "Peixeiras, Silhuetas". Sem data precisa, ela foi tirada durante as décadas de 1950 a 1960. [peixeira: mulher que vende peixe; no Brasil, designa faca que corta o peixe. Existe também o termo varina: vendedora ambulante de peixe]
A composição é notável. Na frente, duas mulheres com a canastra à cabeça, logo seguidas de um exército de outras peixeiras (quatro e ainda silhueta de mais duas, pelo menos). Vestem roupa escura, do lenço na cabeça ao avental, e andam descalças. Elas caminham ao lado de um braço de rio, julgo, atendendo a que se vê uma margem ao fundo da imagem. O que baralha a minha interpretação.
Se fosse mar e atendendo à sombra das peixeiras projetada no chão seria de manhã ainda cedo. O rio não está identificado mas sabe-se que os rios em Portugal atlântico correm todos de leste para oeste, a invalidar a sombra matinal vinda de leste. E, além disso, parece-me que as canastras vão vazias, a averiguar pelos panos em cima de uma delas. Por isso, não sei se saem da doca a caminho dos clientes ou se regressam.
Repito: a composição fotográfica é notável. Há linhas distintas e que dão dinâmica à imagem. À linha que demarca o horizonte (a dividir a fotografia em duas partes), e que revela equilíbrio e sossego, junta-se a diagonal do muro e do trajeto das varinas, dando movimento a estas. Elas deslocam-se apressadas. Pelo tema (transporte artesanal de peixe) e pela composição, não tenho dúvidas em classificar a fotografia dentro do padrão estético do neorrealismo.
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