sábado, 15 de junho de 2019

Bernardino Pires (13)



Esta é a última fotografia da obra de Bernardino Pires que comento - pelo menos no formato de acesso livre na internet. Direitos de propriedade intelectual antes da necessária publicação de livro sobre o fotógrafo impedem a sua continuidade. Agradeço aos seus herdeiros, em especial a Daniel Pires, a gentileza de acesso para ter publicado e comentado diversas imagens do artista. Do que já conheço dele, há um precioso espólio temático - festas dos santos populares, trabalho fluvial e agrícola, vida e modernidade urbana, microcosmos social do Barredo (Porto) e trabalho artesanal e comercial, numa perspetiva de estética maioritariamente neorrealista. Bernardino Pires retratou bem o Porto, cidade onde viveu e trabalhou, e participou em muitos concursos nacionais e internacionais de fotografia (Espanha e Brasil).
A imagem não é das mais significativas do seu trabalho. Mas envolve dois meios de comunicação: comboio e telefone. Recupero, de novo, James W. Carey ("Communication as Culture. Essays on Media and Society", 1989) e a sua dupla definição de comunicação: transmissão, ritual. A segunda, a mais antiga, olha a comunicação segundo a perspetiva da religião e da cultura - comunhão, comunidade, partilha. Da segunda, e à qual dedica muita atenção, ele define comunicação como envio de mensagens e transporte. Pelo menos desde o baixo Egito, escreve Carey, que mensagem e transporte constituíam a mesma coisa. O aumento de velocidade dos transportes ao longo do tempo fez com que mercadorias e documentos chegassem ao destino mais depressa. Repito: transporte e comunicação tinham uma ligação inseparável. Mesmo com o jornal, o processo era centralizado em termos da produção e era transportado e distribuído. A invenção do telégrafo acabou com a identidade da ligação transporte-comunicação. O telefone, a rádio, a televisão e a internet eliminaram de vez essa ligação.
Na fotografia, o comboio movido a uma máquina de vapor parece dirigir-se à estação de S. Bento, analisando a posição da encosta à esquerda da fotografia. Entre aquela estação e a de Campanhã há alguns túneis e duas linhas, uma delas destinada à circulação para sul do país. Ao comboio, o fotógrafo incluiu um poste telefónico; por isso, evoquei Carey. Naquele comboio, viajavam pessoas e mercadorias; no telefone, mensagens de pessoas. O comboio é um meio físico de transporte, o telefone é um meio de transmissão.
(coleção de Bernardino Pires, espólio de Daniel Pires)



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