sábado, 13 de dezembro de 2003

TELENOVELAS, RECEPÇÃO E INDÚSTRIAS CULTURAIS

Defendida em 2001 na Universidade de Coimbra, a tese de mestrado de Verónica Policarpo – Telenovela brasileira: apropriação, género e trajectória familiar – é um estudo sobre a telenovela como expressão de valores e representações de determinados grupos sociais. Para a autora, a telenovela, produto ou formato de indústria cultural, possui uma narrativa dramatizada de situações imaginadas, estrutura seriada e marcas próprias em termos de duração e estrutura. Herdeira do folhetim literário e romântico do séc. XIX, a telenovela explora as emoções como rir ou chorar.

O trabalho de Verónica Policarpo, professora da Universidade Católica Portuguesa, tem como objecto a audiência e os “contextos de leitura” da telenovela, em que a família surge como contexto indicado para estudar as práticas de recepção da televisão. Pergunta-se: como é que as pessoas “lêem” as propostas da telenovela? Que significados lhes atribuem? Que factores sociais decisivos para essa apropriação? A autora – que analisou a telenovela Terra Nostra (2000) e o seu impacto na recepção – parte da hipótese que as formas de apropriação da telenovela brasileira variam em função do género e da trajectória familiar. Ela considera a audiência como social (composta por indivíduos inseridos em complexas relações sociais) e activa, orientando a explicação para as diferenças de recepção, com possibilidade de leituras de resistência (usos alternativos que as mulheres fazem das telenovelas). A telenovela constitui um interlocutor privilegiado de certo tipo de sentimentos e experiências. Por exemplo, as mulheres podem rever a sua vida e reflectir sobre a sua situação. A telenovela oferece uma forma narrativa, um léxico e uma semântica para se constituir uma história de vida.

Tendo como base empírica um conjunto de 20 entrevistas, a autora traça uma tipologia de recepção dos géneros face à telenovela: 1) mulheres casadas – distância e contenção, 2) mulheres separadas – amor-romântico, espontaneidade e emoção, 3) homens casados – desvalorização do conteúdo como prática de distinção, e 4) homens separados – amor e emoção na apropriação da telenovela. Como conclusão, Verónica Policarpo demonstra a importância do género e da trajectória familiar na forma como os actores sociais se apropriam dos valores propostos pela telenovela brasileira. Ela conclui que homens e mulheres casadas produzem um discurso – sobre a telenovela – mais descritivo e denotativo, enquanto os homens e mulheres divorciadas aderem com mais emoção aos encontros e desencontros amorosos da telenovela.

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