segunda-feira, 23 de fevereiro de 2004

EFEMÉRIDE

LISBOA E PORTO LIGADOS POR TELEFONE HÁ CEM ANOS.
NOVAS FACILIDADES PARA A IMPRENSA.


Faz hoje cem anos que Lisboa e Porto se ligaram por telefone. Foi exactamente a 23 de Fevereiro de 1904 que começou a funcionar o novo meio de comunicação entre as duas cidades, ainda a título experimental. No início, havia apenas uma linha em actividade, sendo preciso estabelecer regras, em que o rei, o chefe do governo e os ministros tinham prioridade no acesso às comunicações. As chamadas para os jornais efectuavam-se a horas previamente marcadas, ao fim do dia. Em pouco tempo, o telefone adquiriria grande importância para a imprensa, numa altura em que esta se começava a massificar.

Claro que já era possível então comunicar com todo o país em termos de telecomunicações, desde 1883, mas usando uma tecnologia mais antiga, a do telégrafo. Em Lisboa e Porto, a empresa que explorava o serviço telefónico era a Anglo-Portuguese Telephone (APT). A permissão para instalação e proveito económico de telefones no resto do país pertencia à Administração-Geral dos Correios e Telégrafos (CTT).

A edição de O Século de 24 de Fevereiro incluía a notícia de banquete realizado no Palácio de Cristal, no Porto, oferecido a Tomás Ribeiro, alto funcionário da Administração-Geral dos Correios e Telégrafos, e que orientara a montagem da estação telefónica central naquela cidade, enquanto em Lisboa tomavam posse as quatro telefonistas nomeadas para a estação central de Lisboa. Nesse número de O Século, em despacho telegráfico do Porto, anotava-se que “ficou hoje [dia 23] concluída a linha telefónica estabelecida entre Lisboa e Porto. As experiências deram magnífico resultado, ouvindo-se perfeitamente o que se dizia. O sr. José Augusto Monteiro, empregado superior da casa António Montenegro & Cª, tendo de falar hoje para a redacção das Novidades, foi encarregado pelo sr. conselheiro Emídio Navarro [seu director] de felicitar a imprensa do Porto pelo importante melhoramento”.

Também o Jornal de Notícias (Porto), de 24 de Fevereiro, se referiu de maneira entusiástica ao êxito do telefone: o ministro das Obras Públicas, natural do Porto, trocou palavras com o presidente da Câmara daquela cidade, dr. Sousa Avides, “não havendo a menor dificuldade nem embaraço na emissão do som”.

A linha telefónica entre as duas cidades atingia uma extensão de 350 quilómetros, com um par de fios apoiado em 4550 postes de pinho colocados ao longo do percurso, junto à estrada, o que facilitava o acesso para qualquer reparação da linha. O custo da montagem foi calculado em 40 contos de réis e o Estado estimava arrecadar anualmente uma receita de 29 contos. Em 1904, contavam-se apenas 3415 assinantes nas redes telefónicas em Lisboa e Porto, áreas concessionadas pela APT; só muito lentamente, nos anos seguintes, houve assinantes no resto do país, à medida que os CTT abriram estações telefónicas, como Coimbra e Braga em 1905.

Desde esse momento, as comunicações entre as duas cidades facilitariam a produção de notícias. Ao velho telégrafo - com mensagens em Morse - sucedia-se uma forma mais rápida e mais humana de contacto, o telefone.

[texto incluído no meu livro Olhos de boneca. Uma história das telecomunicações, 1880-1952 (1999). Lisboa: Colibri]

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