domingo, 2 de maio de 2004

ENCONTRO DE BLOGUISTAS EM VILA NOVA DE GAIA

Compareceram 36 blogistas e acompanhantes, perfazendo um total de 53 comensais. Foi um almoço-confraternização que decorreu durante cerca de cinco horas e onde falámos desta paixão comum que são os blogues - como apareceram, como nos envolvemos e como vai ser o futuro deles. Para além do almoço, eu aproveitei para tomar umas notas e fazer um pequeno inquérito, procurando saber a data de início do blogue, o tema, a idade do bloguista, a profissão e a média de mensagens semanais.

Mini-inquérito

Da recolha do inquérito, tenho os seguintes dados:

Data de início da actividade do blogue: 1º trimestre de 2003 - 1; 2º trimestre de 2003 - 4; 3º trimestre de 2003 - 14, 4º trimestre de 2003 - 9; 1º trimestre de 2004 - 8. Os meses de maior actividade foram Julho (7 novos blogues) e Agosto (6 novos blogues). Dos bloguistas presentes no almoço, o arranque desta actividade centra-se em especial na segunda metade do ano passado, e nos meses considerados de férias, o que demonstra a atitude de reservar os tempos livres para uma nova actividade. A sua durabilidade é já uma prova de empenho e resistência.

Áreas temáticas: generalidades - 17; literatura e cultura - 4; actualidades - 2; rádio, política, associativismo por uma causa social, tema quente, viagens, conhecimento, vida quotidiana, astronomia, jogos de palavras, desenhos animados, sobre o absurdo das coisas, enfermagem, direito à paisagem (um blogue cada por área temática). Notas: a área que eu designei por tema quente tinha uma expressão hard, que não posso aqui reproduzir; a área classificada como viagens é a de um bloguista que conta as histórias das suas deslocações profissionais em camião pela Europa. De outro modo, podia classificar em 17 blogues generalistas e 19 especialistas. Destes, quero salientar um profissional (enfermagem) e outro associativo e de apoio social, o blogue dedicado à causa dos cidadãos auto-mobilizados.

Idade dos bloguistas: até aos 25 anos - 4; dos 26 aos 35 anos - 17; dos 36 aos 45 anos - 10; acima dos 46 anos - 4; N/R - 1. Notas: um dos bloguistas tem 7 anos; de um blogue colectivo, a que responderam duas bloguistas, considerei a média etária. No encontro, esteve mais bem representada a classe etária dos 26 aos 35 anos (47,2%), seguindo-se a do nível etário 36-45 anos (27,8%).

Concelho em que residem os bloguistas: Porto - 11; Lisboa - 8; Braga - 4; Vila Nova de Gaia - 3; Alcanena, Castelo de Paiva, Caldas da Raínha, Coimbra, Leiria, Matosinhos, Santa Maria da Feira, São João da Madeira, Noruega [país onde reside o profissional de transportes] (um blogue por concelho). Dado que o encontro se realizou em Vila Nova de Gaia, houve um número mais significativo de participantes dessa zona do país. Contudo, se contarmos os participantes de Coimbra para sul, incluindo esta cidade, houve 12 participantes, que corresponde a um terço do total.

Média semanal das mensagens: de uma a três - 5; de quatro a cinco - 9; de seis a dez - 12; de onze a vinte - 7; mais de vinte - 1; NS/NR - 2. O(a) blogista que produz mais de vinte mensagens por semana só escreveu 1250 mensagens nos primeiros quatro meses do ano (121 dias), isto é, uma média de 10,3 mensagens por dia! Terei feito bem as contas?

Profissões/actividades: como o inquérito teve uma base muito informal, coloquei perguntas fechadas e sem opções, com um campo de respostas menos bem definido. Por isso, fica aqui um retrato aproximado (num outro inquérito procurarei ser mais rigoroso): profissões de grande exigência científica (medicina, engenharia, arquitectura, etc.) - 8; professores - 8; empresários e gestores - 4; quadros superiores e técnicos - 3; estudantes - 3; transportes - 2; arte e música - 2; empregados qualificados - 2; empregados - 2; jornalista - 1; reformado - 1.

Elementos qualitativos constantes na coluna de "observações": os blogues como defesa da desintermediação [por oposição à intermediação jornalística], partilha enquanto acto livre e fuga à vida solitária. Um dos respondentes ao inquérito anotou que apagou todas as mensagens devido à perda de anonimato que imprimira ao seu blogue, embora equacione retomar a actividade em breve.

Das notas que tomei, como se fosse antropólogo

Alguns dos blogues presentes têm e defendem a existência de linha editorial, de modo aproximado a um outro meio de comunicação. Mas com outros princípios, como aceitar a crítica vinda dos comentários dos internautas e não falar da vida íntima. Para outros dos presentes, o blogue exerce uma função terapêutica e opera num domínio de sofisticação, pois a mensagem que se coloca neste diário é simultaneamente privada e pública, o que obriga a uma elaboração mais elevada. Uma das bloguistas falou da angústia em não ter tempo de escrever um dado dia, quando descobriu que 600 internautas procuraram o seu blogue nesse mesmo dia. Até parece, pois, um vício: o blogue tem uma função de descompressão, mas a pressão dos que procuram o blogue acaba por "obrigar" a uma maior produção de mensagens. Outro bloguista mostrava o seu contentamento pela descoberta de um mundo diferente para além daquele que ele conhecia. Isto é, há uma realidade mais variada do que aquela que julgamos existir.

O que impressionou a todos(as) foi o à-vontade que manifestaram desde o primeiro momento, como se houvesse um conhecimento prévio uns dos outros. Dizia um dos presentes que ali se entenderiam em matéria política, desportiva ou filosófica, cabendo todos os estratos sociais e profissionais, dando exemplos concretos de bloguistas ali presentes. É que a blogosfera ilustra a capacidade humana de comunicar, com abolição de fronteiras como as do tipo que referi acima (o clube ou a tendência individual para...). E contaram-se muitas histórias de blogues, como os das mães que escrevem o dia-a-dia com os filhos, a sua alimentação, os seus problemas, como se contaram as histórias dos jornalistas do Primeiro de Janeiro recentemente despedidos por criarem um blogue criticando a situação interna da redacção e das chefias. E de outro blogue de uma desempregada que narrava as entrevistas que ia obtendo para arranjar emprego, até que o conseguiu e encerrou o blogue.

Além disso, o blogue é um meio alternativo, não restringido pelo filtro do editor de um meio profissional de comunicação [o gatekeeper, como se aprende em teoria do jornalismo]. É certo que o bloguista faz uma selecção do material que edita, mas não está sujeito a culturas e políticas de redacção, que passam também por critérios económicos. O bloguista tem liberdade total para falar dos seus gostos e preferências, sem limite de espaço. Ser lido ou não é outro problema, mas não está sujeito às leis do mercado e das audiências e vendas.

Resumindo, o que apurei está longe de ser uma amostra representativa dos bloguistas nacionais, mas tão só dos que estiveram em Vila Nova de Gaia. Por outro lado, a blogosfera ali presente (e toda a ausente) significa um tipo diferente de comunidade [ou tribo, como lhe chamo] em constante dinamismo, que se configura e reconfigura (isto é, muda de forma), com laços e afectos humanos cada vez maiores. A convidar a ler ou reler Manuel Castells.

O meu obrigado ao Orlando Braga pela organização, ao Jorge Guimarães Silva pelas boleias (de funicular e de táxi) e a todos pelos prazer da conversa e por terem respondido amavelmente ao meu inquérito.

[com intervalos, conclui esta mensagem às 20:00]

INVESTIMENTO PUBLICITÁRIO

Do Expresso de ontem, retirei a informação respeitante aos investimentos publicitários no primeiro trimestre de 2004, obtida a partir dos relatórios das empresas mediáticas. Assim, a Impresa (a que o Expresso, a Visão e a SIC pertencem) teve €37,758 milhões (aumento de 17,6%), a Media Capital (a que pertencem a TVI e a Rádio Comercial) teve €32,449 milhões (aumento de 7,7%), a Lusomundo (a que pertencem o Jornal de Notícias, o Diário de Notícias, o 24 Horas e a TSF) teve €16,4 milhões (aumento de 2,3%), a RTP teve €11,7 milhões (mais 17%), a Investec (Correio da Manhã e Record) teve €11,178 milhões (aumento de 15,2%), a TV Cabo teve €3,9 milhões (mais 39,3%) e o Público teve €3,559 milhões (perda de 1,2%). Exceptuando este jornal, do grupo Sonae, o comportamento dos outros grupos foi bom, tendo alguns subido bastante em termos de investimento publicitário, o que pode indiciar - como já escrevi aqui - a retoma económica. Nota: sobre as variações percentuais não sei se se referem ao trimestre anterior ou a período homólogo de 2003.

MUSEU DA RÁDIO EM PERIGO

Noticiou o Público de ontem que o Museu da Rádio está em perigo. Isto porque poderá perder a sua autonomia (pertencia à RDP) ao passar para o Museu das Comunicações. A administração da RTP (Rádio e Televisão de Portugal) - que aglutina as anteriores RDP e RTP (rádio e televisão públicas) - terá transmitido aos funcionários do Museu da Rádio a intenção de dividir a colecção do museu em quatro grupos: peças consideradas para exposição; fundo de reserva; peças alienáveis; venda para sucata.

Se a notícia tem veracidade, trata-se de uma atitude lesiva de enorme gravidade. O museu da Rádio é um espólio magnífico e parece-me incrível considerar peças alienáveis e para a sucata. Quem conhece o museu sabe que tal posição é estranha. Basta percorrer todas as salas do museu para ficar arrepiado com a ideia de deitar fora seja o que for.

Claro que, desde há muito tempo, se vem falando desta passagem para o museu a cargo da Fundação Portuguesa das Comunicações, que a peça jornalística assinada por Clara Teixeira nunca enuncia. A meu ver, há duas posições: a de se manter o acervo museológico da rádio nas mãos da RTP; a de integrar esse espólio na Fundação Portuguesa das Comunicações. Ambas as posições representam ameaças e oportunidades. Ameaça, porque a rádio se integrará num corpo mais vasto de conhecimento e perde, por isso, a sua identificação total; oportunidade, porque a Fundação terá boas condições para acolher as peças, os equipamentos e tudo que reside na rua do Quelhas. A Fundação Portuguesa das Comunicações tem a seu cargo um património de valor incalculável no domínio das telecomunicações, sendo que parte (chamemos-lhe reserva) se encontra num edifício da rua Visconde de Santarém. E tem um arquivo de comunicações que o Museu da Rádio não tem quanto à rádio. Digo isto porque o meu livro Olhos de boneca (Colibri, 1999), sobre telecomunicações, se baseou em muita da informação existente no arquivo documental e fotográfico da Fundação, e porque os textos que publiquei sobre rádio (revistas Observatório, Jornalismo e Jornalistas e Media & Jornalismo) partiram de algumas pastas de arquivo sobre rádio existente na Fundação.

Por mim, ficarei ansiosamente à espera de não ver confirmadas as suspeitas levantadas por esta notícia. E associarei a minha modesta voz para que se impeça tal risco. E sei que os blogues da rádio também o farão.

NO BRASIL, REGRESSA A FORÇA DA GLOBO

Vem hoje no jornal Folha de São Paulo que a rede de televisão Globo, após uma fase difícil, está a conseguir sucesso simultâneo com três novelas no Brasil. Assinado por Laura Mattos, a peça informa que a “direcção da TV Globo está andando nas nuvens”. É que as três fazem grande sucesso em termos de audiência, de acordo com os estudos do Ibope. Elas são exactamente Celebridade, Da cor do pecado e Chocolate com pimenta, que os telespectadores portugueses estão a acompanhar na SIC, e põe por agora fim às “discussões sobre um possível esgotamento dos folhetins”. O tema, apoiado pela expansão dos reality shows, “chegou a ser debatido em reuniões de autores da emissora”, de acordo com a jornalista.

Por exemplo, a novela Da cor do pecado tem a primeira protagonista negra da história da Globo, o que fez as pazes com os direitos humanos. Até agora (80 capítulos), a telenovela regista 41 pontos de média. Escreve ainda a jornalista que a telenovela “tem edição moderna, humor e núcleo teen. Mas o eixo é o folhetim, com amores e desencontros”. E considera-se que a Globo não tem concorrência sólida, mas tão só sucessos pontuais, como o Ratinho e os policiais. Com Laura Mattos a citar um publicitário que diz que o erro de alguns canais tem sido não manterem a programação durante uma crise: "A Globo manteve as novelas até a má fase passar, um bom sinal para o mercado e o espectador" (dica de Daniela Bertocchi, do blogue Intermezzo, a quem agradeço).

[texto concluido às 21:35]

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