A CULTURA EM RAYMOND WILLIAMS
Raymond Williams propõe distinguir: 1) as relações variáveis entre produtores culturais e instituições sociais reconhecíveis, 2) variáveis em que os produtores culturais se organizam em formações. Ele releva sobretudo as ligações entre produtores e instituições. Observa dois tipos fundamentais de relações: 1) patronato, 2) mercado.
O primeiro caso é o do artista instituído, aquele que, em certas sociedades antigas, era oficialmente reconhecido como parte da própria organização social central – muitas vezes um poeta. São os exemplos do bardo na organização oficial do reino ou tribo ou do historiador em termos actuais. A diferenciação de funções foi resultado do desenvolvimento interno, à medida que cada função requereu mais habilidade e tempo e também resultado de mudanças sociais na organização social.
O segundo caso analisado por Williams é o dos artistas e dos patronos. Distingue cinco áreas: 1) da instituição ao patrono, 2) contratação e encomenda, 3) protecção e manutenção, 4) patrocínio, e 5) o público como patrono.
O poeta, por exemplo, estava dependente de uma família aristocrata. O que significa a passagem de relações sociais numa instituição para relações sociais de troca, integradas na família patrocinadora. Uma outra forma de patronato é a instituída na corte ou dentro de uma família poderosa, em que havia uma organização de artistas como parte da organização social. Tal foi particularmente importante em pintura e música. Os detalhes em que ocorria o patrocínio eram variados e caminha-se para um sistema de mestre e aprendiz. Williams chama a atenção para o facto de algumas obras mais conhecidas de arte (pintura, escultura, arquitectura) se desenvolver no interior da Igreja, caso das obras encomendadas pelo Vaticano. E nos mosteiros encontram-se formas específicas de arte e literatura, conforme as regras religiosas específicas.
A terceira forma de patronato ocupa-se menos com o contrato ou comissão directa mas mais com o tipo de protecção ou reconhecimento social. As companhias teatrais da Inglaterra do tempo de Isabel I são um exemplo, com apoio face às condições sociais e legais inseguras em que viviam teatros e actores. As obras eram dedicadas a patronos específicos, os quais garantiam a protecção acima assinalada. Enquanto os patrocínios elencados no parágrafo anterior ofereciam hospedagem, recompensa e, em algumas situações, retribuição monetária directa, o tipo de patronato isabelino entrava já no domínio comercial. Havia mesmo apoios ao arranque de uma carreira.
Quanto ao público como patronato significa que é o conjunto do público que assume as funções anteriormente desempenhadas pela corte, pela família ou por um patrono individual. Contudo, a característica definidora das relações sociais do patronato é sempre a situação privilegiada do patrono.
Artistas e mercados
Raymond Williams dedica espaço a definir a posição dos artistas no mercado, dado que considera haver um longo período de sobreposição entre patronato e mercado nas artes. Mas o mercado implica a obra de arte como mercadoria e o artista como um tipo especial de produtor de mercadorias.
A situação mais antiga e simples é a do artesanato, do produtor independente que põe a sua obra à venda. A situação seguinte da produção de mercadorias tem duas etapas: 1) o produtor não vende a obra directamente mas através de um intermediário distribuidor, que pode tornar-se o seu empregador, 2) o produtor vende a sua obra a um intermediário produtor, começando a instituir-se relações tipicamente capitalistas, pois o intermediário ao comprar visa obter lucro na venda posterior. Williams aponta o caso de livreiros que passam a editores.
Uma nova etapa definida pelo autor é a do profissional de mercado. Há dois indicadores precisos das relações de mercado, situação visível no domínio dos escritores: copyright (direitos de autor) e royalty (pagamento relativo a cada exemplar vendido), este último resultado de um contrato negociado. Assim, o escritor tornava-se participante no processo da venda da sua obra no mercado.
Finalmente, a actividade profissional empresarial, associada a avanços nas áreas da cultura e de meios de comunicação de massa. Estes desenvolvimentos, no campo do escritor, por exemplo, resultaram na criação de empresas e consórcios editores de revistas e jornais. Os casos de maior crescimento profissional deram-se nos media (cinema, rádio e televisão), que oferecem emprego assalariado mediante um contrato.
[Raymond Williams (1921-1988), considerado um dos fundadores dos cultural studies ingleses, foi autor de livros como Culture and society (1958), Television: technology and cultural forms (1974) e Keywords (1976)]
Leitura: Raymond Williams (2000). Cultura. São Paulo: Paz e Terra, pp. 35-53.
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