domingo, 29 de maio de 2005

Indústrias Culturais - I

Para Theodor W. Adorno e Max Horkheimer (1978), a indústria cultural surge quando a cultura se mercantilizou, através do desenvolvimento tecnológico e da capacidade de reprodução. Os dois autores substituíram a expressão cultura de massa pela de indústria cultural (1978: 287). Para eles, não é uma cultura que surge "espontaneamente das próprias massas, em suma, da forma contemporânea da arte popular" mas é "a integração deliberada, a partir do alto, de seus consumidores". As apreciações feitas ao jazz resultam de uma perspectiva radical de análise, que podemos enquadrar num quadro de etnocentrismo europeu.

Foi em meados dos anos 1940 que Adorno e Horkheimer, então a viver nos Estados Unidos, como exilados, criaram o conceito de indústria cultural. Os bens culturais inseriam-se numa lógica de produção industrial, logo como uma mercadoria igual a outras – seriação, padronização, divisão de trabalho. O padrão da criação artística é semelhante ao padrão de produção de um qualquer bem industrial.

A escola de Frankfurt, a que Adorno e Horkheimer estavam vinculados, partiu da concepção de formas e funções superiores de cultura, inerentes ao ritual e ao sagrado. No centro desta concepção encontra-se o conceito de obra de arte não reprodutível, possuidora de aura, valor cultural e autenticidade, o aqui e agora da obra de arte (Benjamin), peça única e de acesso difícil. Ora, com os seus objectivos de análise, a escola de Frankfurt ignorou a originalidade das culturas populares e a potencial identidade das culturas de massa [que autores da América latina redescobriram, como Néstor García Canclini (1980), Jesús Martín-Barbero (1997) e Hamilton Faria (2003)].

A concepção de Adorno e Horkheimer ignorou também o que reside atrás do princípio da reprodução, como Benjamin escreveu em A obra de arte na era da sua reprodução técnica (1985). Aqui, Benjamin mostra que a arte do cinema só se concebe no estádio da reprodução, da multiplicidade de cópias, tornando caduca a ideia de arte como peça única.

Nota acrescentada em 30 de Maio: sobre Theodor Adorno e indústria cultural (no singular) ver outros meus posts: 1) 27.2.2004 - a cultura da indústria; 2) 3.4.2004 - cultura e mercadoria; 3) 9.7.2004 - pensamento de Adorno; 4) 18.7.2004 - pensamento de Adorno (continuação).

6 comentários:

V.M. disse...

Parece-me que tem o calendário avançado. Terá? Ou sou eu que estou atrasado?

Rogério Santos disse...

Obrigado. Já corrigi.

Anónimo disse...

Até que enfim encontro um blog realmente interessante. O tema que eu estudo tem precisamente a ver com as indústrias culturais analisadas pela Escola de Frankfurt! Isabel
http://cinekultura.blogspot.com/

M V Cabral disse...

Se não estou enganado, Adorno apenas escreveu com Horkheimer um livro - a «Dialéctica do Iluminismo» - publicado em 1944. A indicação de uma edição em Português é equívoca pois em 1978 Adorno já tinha morrido e Horkheimer também. A noção de indústria cultural é objecto de um capítulo do livro de '44 e não creio que a «mercantilização da cultura» possa ser considerada recente. A arte e a literatura foram desde sempre pagas por instituições como as igrejas, por mecenas e a partir de certa altura difícil de determinar por coleccionadores, apreciadores e clientes como aqueles que compraram a primeira edição dos «Lusíadas? em 1570 mas a tipografia já existia desde meados do século XV e as artes desde, não direi sempre, mas quase embora fossem provavelmente «consumidas» colectivamente como o teatro grego, etc., etc. Na verdade a «indústria cultural» foi crescendo paulatinamente com o aumento dos mercados das produções artísticas, literárias, etc.

Rogério Santos disse...

A referência a 1978 é a da edição traduzida.

Rogério Santos disse...

A referência a 1978 é a da edição traduzida.