SOBRE O LIVRO DE DINA CRISTO
Já aqui escrevera sobre o lançamento, na passada segunda-feira, do livro de Dina Cristo, A rádio em Portugal e o declínio do regime de Salazar e Caetano (1958-1974). Aproveitei o fim-de-semana para o ler.
O texto divide-se em três partes: 1) discursividades: da rádio tradicional à rádio nova, 2) dispositivo técnico e condições de actuação, 3) rádio e poder: estratégias e relações. Tese de mestrado defendida em 1999, ainda bem que se processou a sua publicação, pois cobre um até agora pouco trabalhado período - e que será bom comparar, embora num outro meio de comunicação, com a tese de doutoramento de Ana Cabrera (sobre a imprensa no período marcelista), quando esta for editada.
Do livro, destaco as páginas intituladas Plano económico (pp. 73-78), onde a autora analisa a publicidade que "inundou a rádio, nos anos 50" (p. 73). As pequenas estações englobadas nos Emissores Associados de Lisboa e Emissores Norte Reunidos (Porto) beneficiariam com ela, após hesitações políticas ao longo de duas décadas, sobre a sua necessidade ou não para o funcionamento das emissoras. Uma das maiores estações de então, o Rádio Clube Português, aproveitaria o boom publicitário para inaugurar estúdios na rua Sampaio e Pina (Lisboa) e um novo emissor de ondas médias (p. 75). Com a liberalização publicitária, reaparecia o produtor independente (de que já havia antecedentes nos anos de 1930), formando-se empresas como APA, Produções Lança Moreira, Gilberto Cotta, Sonarte, que passariam a dominar as rádios privadas (p. 77). Mas na década de 1970, o peso excessivo dos produtores, que enchiam os programas com publicidade, começaram a ser contestados.
Dina Cristo, nas páginas iniciais, dá conta da rádio instalada no começo dos anos 1950 e na ruptura que se preparou nos finais da década de 1960, com relevo para programas como PBX (Carlos Cruz e Fialho Gouveia, 1967), Página 1 (José Manuel Nunes, Rádio Renascença, 1968), Tempo Zip (1970) e Limite. A esta programação, dispersa pelo Rádio Clube Português e Rádio Renascença, a autora designa-a como a rádio nova, em que a reportagem de rua e a passagem de discos novos criariam outros públicos de rádio, jovens embora minoritários. Ela chama a atenção para a importância da Rádio Universidade como centro irradiador de novas experiências estéticas que possibilitaram essa renovação da rádio em Portugal, em condições difíceis, dada a permanente censura.
A obra agora editada tem uma preocupação pelo lado jurídico do meio e por momentos de maior peso político por que a rádio passou. Daí, o realce dado à preparação do golpe de estado de 25 de Abril de 1974 - e os seus preparativos na rádio (pp. 28-32) - e à radiodifusão no começo da guerra colonial (1961) (pp. 44-54). E também à descrição e análise da propaganda, dividida em três parcelas: subversiva, de integração, contrapropaganda (pp. 93-118).
Baseada em entrevistas com agentes radiofónicos que participaram no período estudado (ao todo, 18) e na análise dos arquivos de Salazar, da polícia política PIDE/DGS e da RDP (rádio pública, até 1974 com a designação de Emissora Nacional), bem como leitura da imprensa da época, conclui-se que o trabalho de Dina Cristo está bem documentado e possui uma escrita leve, combinando o registo da citação com a análise histórica e social da época, o que permite uma leitura rápida e agradável.
Leitura: Dina Cristo (2005). A rádio em Portugal e o declínio do regime de Salazar e Caetano (1958-1974). Coimbra: MinervaCoimbra, 148 páginas, €16.
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