TRÊS CAPAS DE JORNAIS
Escolhi as primeiras páginas dos jornais de hoje do Diário de Notícias, Público e El Mundo (Madrid). Claro que elas referem a agenda nacional específica - mas também o moral (leia-se ânimo) de um país.
Assim, o destaque dos nossos jornais vai para as comemorações (perdão: recordação) dos 250 anos do terramoto em Lisboa. O desenho da capa do Diário de Notícias mostra uma devastação terrível da nossa cidade em 1 de Novembro de 1755. Dedica oito páginas ao assunto. Já o Público - se preferiu dar a imagem de capa ao funeral de Rosa Parks, mulher negra que se recusara dar um lugar no autocarro a um branco e, assim, iniciou a longa e justa luta dos negros nos Estados Unidos - ocupou cinco páginas à lembrança do terramoto e o que se pode fazer hoje para enfrentar um problema do género.
Não deixo de reflectir uma chamada de atenção do Diário de Notícias na primeira página e o título que acompanha as páginas 2 e 3: "Novo grande sismo talvez só daqui a 2000 anos". É que ele traz alguma segurança - nenhum de nós estará vivo para o testemunhar -, mas também angústias - e se houver uns sismos não tão grandes, continuaremos vivos? Este título é, assim, ambíguo. Claro que o texto de Filomena Naves é preciso e traz muita informação útil.
Já o El Mundo tem outras ocupações: o nascimento da infanta doña Leonor, filha dos príncipes de Espanha ("gordita, redonda, castaña y un poco llorona" ,segunda a avó Sofia, rainha do país vizinho). Procurei contar bem, mas não sei se me enganei: 19 páginas, entre textos, comentários, assuntos laterais (políticos, mas com ligações ao nascimento) e páginas de imagens a cores, desde o casamento de Felipe e Leticia até hoje, e infografias com as linhas sucessórias do reinado de Espanha. E a capa traz uma fotografia do príncipe Felipe, sorridente, a dizer: "Pero bueno... Qué ha sido"?
Mas há outro motivo de regozijo em Espanha: a Telefonica (accionista da Portugal Telecom) comprou a operadora inglesa O2 por €26100 milhões. O El Mundo dedica ao assunto o editorial (partilhado com o nascimento de doña Leonor) e três páginas da secção de "Economia".
Há, aqui, um bom motivo de reflexão. Do lado de lá da fronteira, um nascimento é razão para uma grande animação, a que se junta a maior operação da história da economia espanhola desde sempre. Deste lado, basta ler o que diz o homem do bar, o cartoon de Luís Afonso (jornal Público, p. 8) - quadrinho 1: "O Presidente da República apela ao sentido de missão e solidariedade colectiva para tentar combater as taxas altíssimas de insucesso escolar", quadrinho 2: "Há 234 mil pessoas em lista de espera para cirurgias", quadrinho 3: "A confiança dos portugueses na justiça atingiu os mais baixos valores de sempre", quadrinho 4: "O terramoto foi há 250 anos, mas tenho a sensação de estarmos a viver nos escombros de um país...".
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