[continuação da mensagem de 13 deste mês]
O teatro radiofónico, segundo Eduardo Street
O livro de Eduardo Street (O teatro invisível. História do teatro radiofónico, com 222 páginas e editado pela Página 4) começa com os programas infantis e os amadores da rádio, nos anos 1930. E nomeia Armando Neves (1899-1944), colaborador da há muito desaparecida Rádio Luso, como o pai do teatro invisível ou teatro radiofónico. Será, contudo, na Emissora Nacional, no seu ano experimental (1934), que o teatro radiofónico se consolida. A primeira transmissão coube à peça de Júlio Dantas, A ceia dos cardeais. Samuel Dinis seria um dos intérpretes, marcando o começo de uma carreira muito ligada ao teatro na rádio. Já em 1936 seria transmitida a primeira peça escrita para a rádio: Bodas de Lia, de Pedroso Rodrigues.
Em 1938, surgia Virgínia Vitorino (1898-1967) (do grupo de Fernanda Castro, que era mulher de António Ferro, presidente do Secretariado de Propaganda Nacional e da Emissora Nacional, a partir de finais da década de 1930). Membro do Conselho Permanente de Programas, Virgínia Vitorino foi fundamental para a transmissão regular de teatro radiofónico (como autora e intérprete sob o nome de Maria João do Vale). Outra figura importante no arranque do teatro radiofónico seria Maria Madalena Patacho (1903-1993), autora de programas como Meia hora de recreio para crianças. Alice Ogando (1900-1981) e Odete Saint-Maurice (1918-1993) seriam duas das principais figuras na organização de programas de teatro radiofónico, havendo mesmo uma competição entre as duas para conseguirem séries mais longas de episódios. Outras ainda seriam Ema Paul e Judite Navarro (1918-1987).
Ao longo de 70 anos de teatro radiofónico, e num total de 237 folhetins, Alice Ogando foi a campeã da adaptação de romances a folhetins (28), seguindo-se Odete Saint Maurice (24), Judite Navarro (18), Ema Paul e Botelho da Silva (17) e Álvaro Martins Lopes (13). Dos autores representados, Camilo Castelo Branco vem à frente (11 títulos), acompanhando-o Alexandre Dumas (8), Walter Scott e Charles Dickens (6 cada um) e Júlio Dinis (5). Pelos autores, consegue-se perceber quais as estéticas políticas preferidas. Os folhetins de autores portugueses representam 51,5%.
No mapa das figuras pioneiras, destaque ainda para Olavo d'Eça Leal (1908-1976), poeta, dramaturgo, locutor e escritor de teatro, que criou a personagem Octávio Mendes (Mendes), que o acompanhou em trinta anos de diálogos. E Jorge Alves (1914-1976), que começara no Rádio Clube Português e fora para os Estados Unidos aprender a técnica de montagem - ou sonorização ou realização radiofónica. Com Jorge Alves nasceram os primeiros folhetins e os indicativos de cada programa, que alertavam os ouvintes para a sua transmissão. Assim como Álvaro Benamor (1908-1976), o responsável pelo programa Teatro das Comédias, que se prolongaria de 1952 a 1974.
No livro são evocadas outras vedetas - as vozes da rádio, de que se destaca a primeira locutora da Emissora Nacional, Maria de Resende, a qual ainda escreveu versos e contos para crianças e era muito popular entre os portugueses residentes no estrangeiro. Mas há muitas outras vozes lembradas no livro, tais como Manuel Lereno (1914-1976, que morreu amargurado pelo afastamento ditado pela mudança de regime político em 1974), Carmen Dolores (1924), Rui de Carvalho (1927), Eunice Muñoz (1928) ou Canto e Castro (1930-2005).
Eduardo Street apresenta algumas balizas na evolução do teatro radiofónico. Inicialmente, esse tipo de programa combinava canção e diálogo humorístico. A separação ocorre em 1942. Nessa época, surge o Domingo Sonoro, programa idealizado por Ferro, onde se combinam diálogos de Olavo, Francisco Mata (1915-1983) ou Costa Ferreira, entre outros. Diálogos do Zequinha e da Lélé, com Vasco Santana e Irene Velez, iniciavam-se em 1947, escritos por Aníbal Nazaré, e tornaram-se os mais famosos diálogos da rádio. O início da perda de protagonismo da rádio seria 1965, quando o auditório das grandes cidades troca o meio sonoro pela televisão. Nessa altura, gravava-se ainda um número impressionante de folhetins, à volta de 13 por ano, como aconteceu em 1965. 1974 ditou o fim de um ciclo de teatro radiofónico, retomado em 1997 na Antena 2, com o título de Teatro Imaginário, dirigido por Eduardo Street, e que apresentou 43 peças até 2002.
Uma referência obrigatória a esta história da rádio é a dedicada à publicidade. Segundo o autor, esta, a partir dos anos 1950, cercava os noticiários ou confundia-se com o sinal horário. A relação com o teatro radiofónico é a entoação da voz (suavidade, dramatismo) para apresentar o produto publicitado. A publicidade também seria responsável pelo patrocínio de muitas novelas, a primeira das quais teve como intérprete José Mensurado, mais tarde jornalista da televisão.
Leitura: Eduardo Street (2006). O teatro invisível. História do teatro radiofónico. Lisboa: Página 4.
2 comentários:
Será possível facultar contacto da editora? Tenho procurado o livro, no norte do país, e não o consigo encontrar.
Obg.
J. S. Vieira
Caro anónimo
deparei-me com este seu comentário em forma de pedido e não sei se entretanto já conseguiu obter o livro, mas a editora é a Página 4 este livro é o sétimo da colecção Antestreia.
Ana M. Santos
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