Michele Hilmes, em A cultural history of broadcasting in the United States (2002), olha os media electrónicos ao longo do século XX, entrando já no novo milénio. Avalia a evolução de cada um deles (rádio, televisão, internet) década a década, comparando-os com as principais tendências sociais, empresariais, culturais e políticas.
Assim, seguindo a sua estrutura, dividi em 10 pequenos capítulos a evolução desde os amadores da rádio até à digitalização e internet. O primeiro abrange o período de 1919 a 1926, a data do começo da rádio. De acordo com Hilmes, foi o período em que a radiodifusão saiu das garagens e sótãos dos amadores e se tornou uma prática social americana. Apesar de questões sociais violentas (imigração, expansão urbana, desemprego), houve um aumento de riqueza na sociedade em geral e uma intensa experimentação cultural, como o jazz, e a que a rádio acrescentou a sua voz única. À medida que a rádio ganhava centralidade e importância social na vida das pessoas, também atraiu um debate sério.
O segundo capítulo decorre de 1926 a 1940, naquilo a que a autora chamou de redes comerciais na rádio. Os anos de 1920, após a guerra mundial, foram de expansão. Contudo, a grande depressão de 1929 trouxe uma quebra na construção civil e nas finanças e um grande reflexo no emprego. 28 de Outubro de 1929 foi a designada segunda-feira negra, com a bolsa de valores a cair 49 pontos, algo até aí inédito pela perda de dinheiro que acarretou e pelos prejuízos no mundo das empresas e do emprego. De modo interessante, a rádio foi uma das raras indústrias a escapar à Depressão (já o cinema, o teatro de revista e a imprensa foram afectados).
Na segunda guerra mundial, o uso da rádio foi intenso. A publicidade entraria na rádio, e esta seria palco de controlo empresarial e de domínio comercial. Longe de reflectir um processo natural e simples do desenvolvimento tecnológico, o audiovisual americano sairia de um grau elevado de indecisão e controvérsia na sua direcção. A indústria não foi uma actividade monolítica: apesar de a NBC e da CBS se tornarem rapidamente os dois principais interlocutores, exercendo um grande controlo oligopolista sobre a rádio, elas concorreram entre si e enfrentaram as forças poderosas da indústria publicitária. Há uma influência forte das agências de publicidade na produção de programas. Combinadas, as redes de rádio, as agências de publicidade e o público criaram a chamada idade de ouro da rádio americana.
O terceiro episódio recobre igualmente os anos de 1926 a 1940, apresentando outra faceta, a da rádio para toda a gente. No final da década de 1930, havia 80% dos lares americanos com receptores de rádio. Os rádios foram introduzidos nos automóveis em 1930. Em 1940, em cerca de 1/4 dos automóveis podiam sintonizar-se estações de rádio. O preço dos rádios baixou drasticamente, embora ainda representasse um investimento considerável no rendimento familiar. Para Michele Hilmes, a rádio tornava-se uma das formas mais híbridas do século XX, comparando, adaptando e criando, acções baseadas nas características e capacidades próprias da rádio.
Cada estação era uma mistura curiosa de entretenimento, levando o meio rádio a ser nos anos 1940 uma indústria lucrativa e um centro de vida. Agências de publicidade, redes e estações, com uma dose de actividade tirada a Hollywood em termos de novas formas de entretenimento, informação e expressão, criavam um novo mundo de estrelas e estilos de vida copiando a vida dessas estrelas. Assim, programas, géneros, estrelas e audiências de fãs emergiam. As redes de estações dividiriam os seus períodos em horários diurno e nocturno. O horário diurno tornou-se o espaço das mulheres, com a novela radiofónica. A crítica, vinda da esquerda e da direita, via a música como um meio que veiculava gostos de baixa cultura e muito permeável à publicidade.
Leitura: Michele Hilmes (2002). A cultural history of broadcasting in the United States. Belmont, CA: Wadsworth
[continua]
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