Depois de ontem o número de casos de gripe A (H1N1) em Portugal ter acalmado, hoje o balanço volta a ser menos positivo: foram confirmados laboratorialmente mais 13 casos. A boa notícia é que são todos importados. O total situa-se agora nos 174, sendo que a maioria das pessoas já retomou a sua vida normal (Público Última Hora, texto de Romana Borja-Santos, às 18:58).
Margaret Chan, a principal responsável da Organização Mundial de Saúde (OMS), nasceu em Hong Kong há 62 anos, num ano do porco no calendário chinês. Começou por ensinar economia, chinês e inglês, quando o seu namorado foi estudar medicina para o Canadá. Ela seguiu-o, mas como ele tinha pouco tempo para lhe dedicar, por ocupado nas aulas, acabou por ingressar também em medicina. Licenciados, regressaram a Hong Kong. Mais tarde, Chan foi nomeada directora de saúde, à frente de uma equipa de sete mil pessoas. Por ela passou a condução da informação da gripe das aves - aquele ameaça vinda do oriente que nunca cá chegou. Ela, que continuou a comer frango, mandou matar 1,5 milhões de aves. Estávamos em 2003.
Logo depois, a senhora Chan - em fotografia aqui ao lado (de Laurent Gillieron, publicada no Guardian, de 16 de Julho último, de onde retiro toda a informação a partir de notícia de Aida Edemarian) - tornou-se a primeira chinesa a concorrer (e ganhar) a liderança de uma agência das Nações Unidas, a OMS. Corria o ano de 2006. 2007 foi, de novo, o ano do porco no calendário chinês. E, a 11 de Junho de 2009, ela tornava-se a primeira pessoa na OMS em 41 anos a anunciar ao mundo o aparecimento de um novo vírus a atingir proporções de pandemia. Um relatório de 2007 daquela agência da ONU previa uma pandemia de gripe que poderia afectar um quarto da população do mundo. Claro que há grupos e países de maior risco: grávidas, pessoas entre os 30 e os 50 anos; países com taxas elevadas de doenças como VIH, desnutrição ou diabetes ou com grandes concentrações populacionais em cidades.
O quadro está quase traçado. Primeiro, Chan tem experiência em gripes associadas a animais: a primeira não terá tido impacto, a segunda certamente. Mas não nos podemos esquecer que ela mandou abater frangos. Segundo, a mutação do nome da gripe. Todos nos lembramos que começou por se chamar gripe mexicana, dado o primeiro surto ter nascido lá. Os mexicanos reagiram - e bem -, em especial os que têm interesses turísticos. Depois passou a chamar-se gripe suína. Por razões religiosas, os muçulmanos não usaram essa designação. A um outro nível, os produtores de porcos devem ter exercido pressão, pois não queriam associar o animal a uma possível quebra de vendas. Gripe A é mais simpático porque não há defensores da letra A, ou de outra letra ou número. Mas o número da gripe é H1N1, saúde em inglês e número um, o que é significativo. A designação H1N1 tem a assinatura da senhora Chan. Terceiro, a produção de Tamiflu, o antiviral já preparado desde o tempo da ameaça da gripe das aves, tem sido enorme. Só a Roche produziu 5,6 milhões de doses para o mundo desenvolvido e Margaret Chan quer mais 5 a 6 milhões de doses para os países pobres ou em vias de desenvolvimento. Por lembrança, há anualmente entre 250 e 500 mil pessoas que falecem com a gripe sazonal, número que não inclui os que morrem por dificuldades respiratórias ou ataques de coração. Quarto, os media foram obedientes a mudar a designação da gripe, a retirar-lhe carga conotativa, a higienizar o nome. Do mesmo modo, os media contabilizam dia a dia o número, como a notícia que encabeça esta mensagem (apesar da jornalista indicar que muitas pessoas já estão livres de perigo, fala em boa notícia: os casos assinalados hoje são importados, como se importado ou exportado fosse distinto). Isto é a estratégia da prevenção: aumentar o número. Em campanhas anteriores, mensurava-se o número dos diabéticos, dos doentes cancerosos por causa do tabaco, dos estropiados pelos acidentes de viação. A estratégia da prevenção aproxima-se da propaganda, e os media, de modo ligeiro, vão atrás.
Observação: não sou adepto de qualquer teoria da conspiração. Logo não digo que a senhora Chan exagerou, como no caso da gripe das aves. Mas a gripe pode ter interessados. Numa altura em que se põe em causa a ida dos americanos à Lua, com o argumento "então se eles foram há 40 anos porque não voltaram?", também se pode contestar a gripe, os seus nomes e os seus números. Espero que a agenda noticiosa mude e haja outras notícias.
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