Quando escreve sobre moda, parte da distinção entre fala (acto individual de selecção e actualização) e língua (instituição, sistema) e distingue três sistemas diferentes: vestuário escrito, fotografado, usado (ou real). O vestuário escrito numa revista de moda é ajudado pela linguagem articulada; a sua descrição nunca corresponde a uma execução individual das regras da moda, é um conjunto sistemático de signos e regras (Barthes, 1981: 92). O vestuário fotografado não aparece como signo abstracto, porque é usado por uma mulher individual. Já o vestuário usado (ou real) é constituído pela oposição de peças, adornos ou "detalhes", como usar um chapéu ou uma boina.
Em Sistema de moda (1967/1999), retoma a distinção. Os primeiros dois sistemas interligam-se. Por exemplo, o texto que acompanha a fotografia: "cinto de couro um pouco acima da cintura, a que uma rosa dá um toque de festa, sobre vestido leve, de shetland" (Barthes, 1999: 15). Já o terceiro sistema, o do sistema do vestuário real, não pertence ao âmbito da língua. Além de que não vemos senão um modo pessoal de usar o vestuário, um porte particular. Daí três estruturas distintas: verbal, icónica, tecnológica (esta porque o vestuário é composto de materiais físicos). A estrutura tecnológica aparece como um tipo de língua-mãe, a que as outras - as publicadas na revista de moda - são línguas mais próximas da fala.
Barthes desenvolve a ideia de shifter (aparelho; translação), do real à imagem, do real à linguagem, da imagem à linguagem (1999: 18). Do vestuário tecnológico para o icónico, o shifter é o molde de costura, o desenho que reproduz o fabrico das peças de vestuário, a que se acrescem os processos gráfico e fotográfico. A passagem do vestuário tecnológico ao escrito envolve a receita ou programa

de costura - o texto assinado na revista de moda, a recomendação. Em terceiro lugar, a transferência do vestuário icónico para o falado significa não desenhos de moldes ou textos de receitas de costura mas anafóricos da língua: "este" saia-casaco, "o" vestido de shetland.
Claro, como observa muito bem José Augusto Seabra na introdução a Mitologias (1957/2007), que traduziu, Barthes analisa a moda real e a moda escrita, optando nitidamente por esta. A moda tem a inevitabilidade da mediação da escrita. Ou, como escreve Barthes: "desde que se observa a Moda, a escrita aparece como constitutiva" (2007: XXXVIII).
Sem comentários:
Enviar um comentário