domingo, 26 de setembro de 2010

TEATRO I

Ifigénia na Táurida, de Goethe, estreada no teatro Cornucópia em Setembro do ano passado, teve agora uma curta passagem pelo Teatro Municipal de Almada, saindo hoje de cena. A encenação coube a Luís Miguel Cintra, a recriação poética a Frederico Lourenço e o cenário e os figurinos a Cristina Reis.

Beatriz Batarda (Ifigénia), Luís Miguel Cintra (Toas, rei dos Tauros), Paulo Moura Lopes (Orestes), Vítor d'Andrade (Pílades) e José Manuel Mendes (Arcas) interpretaram a peça de Goethe, interessado pela cultura clássica grega, onde recuperou a história de Ifigénia, filha de Agamemnón e Clitemnestra, que aquele decidira sacrificar para obter os favores dos deuses no cerco a Tróia. A deusa Diana salvara-a, tornando-a sacerdotisa na Táurida. Mais tarde, Orestes vinga a morte do pai, assassinado pela mãe, e foge, perseguido pelas Fúrias. Com o amigo Pílades, chega à Táurida e resgata a irmã do rei Toas, levando-a de retorno à Grécia.

Escreve o encenador: "O trajecto é o das trevas para a luz. Em Ifigénia, em Orestes, em Toas. É o da transformação da barbárie ou da velha Cultura em Civilização. É o caminho até à revelação da verdadeira natureza de Deus através da revelação de cada um a si próprio. [...] É esse amor à verdade (o de Ifigénia, neste caso) que tudo move. No confronto com o que a vida nos traz, com o «acaso», se se quiser, «coisa que não dominamos». É esse o fogo, o desejo do confronto. O tema da peça julgo que é o próprio Conhecimento. Citando a própria Ifigénia: conhecimento de si próprio". Mais à frente, Cintra refere o autor, Goethe, que indica ser a peça pobre em vida exterior, "mas rica em vida interior. E é essa vida interior que o actor teria de recriar".

A peça gira em torno de Toas, Orestes e Ifigénia. Melhor, é Ifigénia o centro: ela, ciente da sua fraqueza, vê igualmente as fraquezas dos homens. As suas palavras, o poder que ela tem contra a espada dos homens, acabam por tecer os destinos daqueles seres, o da liberdade para Orestes e Pílades, igualmente para ela, e o da razão, da cedência e do reconhecimento do envelhecimento e da lenta perda de poder em Toas. Na realidade, Ifigénia ocupa todo o espaço do palco, e mostra-nos em quase duas horas o grande dramatismo da história de uma família amaldiçoada pela violência e pelas mortes desde Tártaro (fotografia retirada do sítio do Teatro da Cornucópia).

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