Na sala de entrada, havia fotografias com cenas da peça. Os figurinos de Manuela Bronze pareciam estranhos, num misto de vestuário dos gregos clássicos e dos filmes de ficção científica. Mas, dentro da sala, compreendi melhor os figurinos, em especial quando conjugados com o desenho de luz de Mariana Rego. A quarta parede do teatro era uma ampla tábua que recebia cores simples mas quentes - do amarelo inicial ao vermelho e ao verde. Em especial quando a luz recaiu sobre Hermíone no momento em que ela planeava vingar-se ora de Pirro ora de Orestes. Andrómaca, viúva de Heitor, derrotado e morto, vivia prisioneira de Pirro. Enquanto repelia a paixão sentida pelo seu carcereiro, procurava salvar o filho Astíanax. Ela pede a Hermíone que interceda junto de Pirro. Mas Hermíone estava mais preocupada em decidir entre Orestes e Pirro, velho e novo amor.
Vasco da Graça Moura traduzira a peça de Jean Racine Berenice, estreada em 2005. Depois, traduziu Andrómaca, incentivando o encenador Carlos Pimenta a montar a peça. Só agora, depois da morte do poeta e tradutor, na cidade onde ele nasceu, é que a peça foi dada a conhecer ao público, no Teatro Helena Sá e Costa, com os alunos finalistas do departamento de Teatro da Escola Superior da Música e das Artes do Espetáculo (ESMAE).
Além de verificar o entusiasmo dos alunos na representação, não tenho competência para aquilatar do valor de cada um dos jovens actores, nem sei prever o sucesso deles na actividade. Nove alunos representaram as oito personagens da peça, com Hermíone interpretada por Mariana Magalhães e Soraia Sousa, tendo visto esta última, cujo perfil no LinkedIn indica que ela já trabalhou no filme de João Sousa Cardoso (A Santa Joana dos Matadouros, 2014, a partir de Bertolt Brecht) e é modelo, portefólio necessário e complementar à actividade teatral. Também não me sinto competente para avaliar a colocação das vozes, embora me pareça que a acústica da sala nem sempre ajuda. No dispositivo da encenação criada por Carlos Pimenta, os actores ficam fora do tablado, nas laterais do palco, quando não entram no diálogo. Quando saem, ensaiam passos como se fossem soldados, atitude maquínica em oposição à organicidade da tragédia grega.
No texto de apresentação da peça, o encenador Carlos Pimenta escreve sobre a guerra. Ele compara a guerra de Tróia, onde homens corajosos se defrontavam com as suas virtudes e defeitos, com os actuais conflitos, mediados por drones, máquinas voadoras controladas de longe por homens. Como disse Baudrillard, a guerra hoje parece um simulacro - como, aliás, as imagens projectadas no começo e no fim da representação mostram. Mas, a guerra é sempre injusta e cruel, pelo que não há comparabilidade na sua substância.
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