sexta-feira, 29 de julho de 2016

Culpado ou Inocente


Extraio da sinopse da peça: em resposta à pergunta: "Tem alguma coisa a dizer a este Tribunal", três arguidos, julgados por crimes alegadamente cometidos por eles, decidem interpelar o tribunal. Os juízes estão na plateia e é-lhes perguntado qual a sua opinião do veredicto. Trata-se, leio ainda, de um texto a a partir de casos verídicos, trabalhado pelo coletivo Projeto Emergente, com encenação de Rute Cruz e interpretação de Carolina Justino, José de Mello e Mariana Rebelo.

Saí do Teatro Turim muito angustiado. As histórias são muito deprimentes, a encenação cria um ambiente mais constrangedor. Há narrativas de violência doméstica, violação e profanação de cadáveres, psicopatia. Os registos individuais podem ser uma caracterização de uma sociedade. Mas também pode ser uma representação estereotipada da sociedade.

Os intérpretes são jovens, ao que li ligados a uma escola de teatro de Cascais. Senti o empenho de cada um na melhor representação das suas personagens, chegando a interpelar o público-juiz para apoio ou reprovação dos seus atos. Mas fiquei com grandes dúvidas sobre a eficácia da encenação. As histórias são longas, em especial a primeira.

"O tipo não percebeu", dirá alguém que discorde de mim. Não existe distanciamento psicológico face ao espectador, de modo a este refletir sobre as situações. Elas aparecem relatadas nos media de hoje, tipo Correio da Manhã, são contadas a cru, desenquadradas, desequilibradas. O pós-modernismo da peça, no sentido de histórias isoladas, de fim das grandes narrativas, conduz a um beco sem saída, quase de compreensão pelo que aconteceu. Dois dos três espectadores, interrogados, deram mostras disso. A peça não é, por outro lado, um retrato realista, apesar de a encenação indicar precisamente que se trata de uma representação teatral, ao pôr os atores em fato de banho e em jaulas de prisão, isto é, sem direitos. A exposição dos corpos, a sua exploração, indicando uma atenção muito à Foucault.

Um elemento cénico essencial e usado duas vezes, em situações diferentes, é o conjunto de cordas. Da primeira vez, empregue para assegurar o sacrifício do marido a abater. Da segunda vez, para fazer de forca para dois dos condenados. Um deles dizia-se cristão. Num momento de conflitualidade religiosa na Europa como consequência de contínuos massacres executados por islamitas, a encenadora não poderia pensar que um cristão vê o suicídio como atentado à vida? Ou tal serve para pensar sobre a atualidade?

No fundo, senti que falta um mínimo de esperança às nossas vidas. Ou que vamos ao teatro para espiar no sentido do voyeur televisivo.

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