Dersu Uzala era um caçador da tribo Nanai que vivia na parte mais oriental da Sibéria no começo do século XX. A sua família fora dizimada pela varíola e ele errava pela floresta em busca de alimentos e caça, nomeadamente de martas, cujas peles vendia para obter algum dinheiro. Profundo conhecedor da natureza, tratava os animais como companheiros, a lembrar um pouco a consciência dos militantes urbanos que descobriram a ecologia na década de 1960, dentro da ideia de equilíbrio entre os diferentes elementos da natureza.
Um dia, encontra uma equipa militar que explorava em termos de geografia e topografia o território. Estava-se, como escrevi acima, no começo do século XX e o poder político russo precisava de cartografar adequadamente o país, em especial na vastíssima e quase inexpugnável zona mais a norte e mais a leste. Nela habitavam tribos ou grupos de comunidades muito isolados e vivendo uma economia de sobrevivência, com culturas antigas e povoamentos que incluíam mongóis e chineses, os vizinhos do sul. Muitos eram caçadores mas havia também pescadores e recoletores. A equipa de militares era comandada pelo capitão Vladimir Arseniev, que escreveria depois livros sobre as suas expedições e que narrou os contactos com Dersu Uzala (interpretado por Maksim Munzuk), rapidamente promovido a guia do grupo. Pela sua sabedoria ligada à natureza, ele foi muito benéfico para o avanço dos trabalhos científicos. Do seu contacto com o capitão Arseniev (interpretado por Yuri Solomin) nasceu uma profunda amizade e uma prova da importância de juntar o conhecimento teórico e intelectual ao prático.
Com a imagem conduzida por uma câmara à altura do homem quando se trata de mostrar a evolução da investigação guiada pelo caçador Dersu e uma posição de cima para baixo quando se mostra a posição do cartógrafo ficamos a compreender melhor o entrosamento de dois mundos tão próximos - o olhar a natureza - mas já tão afastados - o caçador e o cartógrafo veem duas coisas distintas conforme as suas necessidades. Isso torna-se evidente no final do filme, quando o caçador é recolhido em casa do capitão e se depara com proibições: acampar na cidade, dar tiros na cidade. Uma das sequências inesquecíveis do filme é a da investigação na estepe gélida ao final da tarde, quando o caçador e o capitão estão sós e perdidos do resto da expedição. O caçador conduz a operação de recolha de caules de plantas e improvisa uma cabana sob a qual dormem, escapando aos ventos que podem atingir cerca de 60 graus negativos. Outra sequência impressionante da luta contra a natureza é a do salvamento do caçador, que não sabe nadar, quando fica sozinho numa jangada. O esforço coletivo dos militares leva à rápida opção de lançar um tronco ao rio, devidamente controlado com cintos, e que chega a Dersu e o ajuda a sair da situação complicada.
Dersu Uzala (ou A águia das Estepes, デルス·ウザーラ em japonês, Дерсу Узала em russo) é um filme do japonês Akira Kurosawa (1975), a sua primeira obra fora do seu país, após um período em que ele se sentiu deprimido (e tentou o suicídio), que lhe trouxe o fracasso de um filme anterior Dodesukaden. O cineasta recebeu um convite soviético do estúdio Mosfilm para realizar o trabalho autobiográfico de Arseniev.
2 comentários:
"Dersu Uzala" é um filme inesquecível (vi-o pela primeira vez no Apolo 70, aquando da sua estreia em Portugal), que trata a imensidão do espaço de forma sublime, ao mesmo tempo que nos conta a história deste velho caçador. É de saudar esta nova política de reposição de filmes, pois possibilita às novas gerações descobrirem obras fundamentais da História do Cinema, na sala de cinema. que será sempre o espaço ideal para nos maravilharmos com a Sétima Arte.
Totalmente de acordo com o seu comentário.
Um filme inesquecível! E filmes... nas salas de cinema, sem dúvida.
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