Texto publicado na revista da Universidade do Minho Comunicação e Sociedade, vol. 7, 2005, pp. 137-152.
[original em Comunicação e Sociedade]
Textos de Rogério Santos, com reflexões e atualidade sobre indústrias culturais (imprensa, rádio, televisão, internet, cinema, videojogos, música, livros, centros comerciais) e criativas (museus, exposições, teatro, espetáculos). Na blogosfera desde 2002.
sábado, 16 de dezembro de 2017
Federação de rádios locais (maio de 1988)
No Jornal de Notícias de 20 de maio de 1988, há quase há 30 anos, noticiava-se a vontade de criar uma federação a englobar o movimento das rádios livres (ou locais ou piratas). Era um tempo de reuniões e encontros.
O comentário de Fernando Moura no Facebook seria o seguinte: "Grande luta pela legalização das rádios locais. Encontro no Teatro Paulo Quintela. Ainda me lembro que a UC levou uma data de contos de réis para alugar a sala. O poder politico acabou por ceder e as frequência foram a concurso. Coimbra teve direito a 3. Contra tudo e contra todos, o projecto dos mentores da então Rádio Actividade ficou em 1º lugar no concelho de Coimbra.Trata-se da frequência que foi da 90 FM e agora transmite a Mega Hits. Sai logo de seguida porque o patrão estava a entregar aquilo a um partido. Fui para o segundo classificado, a Rádio Jornal do Centro. A Rádio Universidade de Coimbra ficou com a 3ª frequência. Deu que falar a estrondosa derrota do Diário de Coimbra relegado para um 6º ou 7º lugar. Boa altura para enviar um abraço ao meu amigo Alfredo Nunes Silva, que, guiando uma potente Renault 4L, me levou aos 4 cantos do Portugal que queria mais liberdade radiofónica".
O comentário de Fernando Moura no Facebook seria o seguinte: "Grande luta pela legalização das rádios locais. Encontro no Teatro Paulo Quintela. Ainda me lembro que a UC levou uma data de contos de réis para alugar a sala. O poder politico acabou por ceder e as frequência foram a concurso. Coimbra teve direito a 3. Contra tudo e contra todos, o projecto dos mentores da então Rádio Actividade ficou em 1º lugar no concelho de Coimbra.Trata-se da frequência que foi da 90 FM e agora transmite a Mega Hits. Sai logo de seguida porque o patrão estava a entregar aquilo a um partido. Fui para o segundo classificado, a Rádio Jornal do Centro. A Rádio Universidade de Coimbra ficou com a 3ª frequência. Deu que falar a estrondosa derrota do Diário de Coimbra relegado para um 6º ou 7º lugar. Boa altura para enviar um abraço ao meu amigo Alfredo Nunes Silva, que, guiando uma potente Renault 4L, me levou aos 4 cantos do Portugal que queria mais liberdade radiofónica".
quinta-feira, 14 de dezembro de 2017
A Guerra dos Mundos em Braga (1988)
A minha primeira tese é a do jornalismo atender ao facto e não à problemática. Explico melhor, a partir de duas notícias publicadas no Jornal de Notícias (30 e 31 de outubro de 1988). O episódio radiofónico emitido por Orson Welles ocorrera cinquenta anos, pelo que o jornal o recordou. No primeiro daqueles dias, o jornalista deu o destaque ao episódio e, em texto pequeno, informou a realização de uma evocação em rádio pirata. 1988 foi um ano muito rico em experiências radiofónicas e nada melhor do que experimentar a guerra dos mundos.
O texto do segundo dia tem título, antetítulo e pós-título bem expressivos. A homenagem voltara a assustar uma população e a polícia teve de intervir (e proteger os animadores da rádio). Os dois telefones da rádio não pararam de tocar nessa tarde. Brincadeira de mau gosto e ameaça de bomba nos estúdios da rádio foram consequências não previstas. Por isso, um dirigente da estação de Braga prestou declarações ao jornal mas manteve o anonimato. O medo voltara-se contra ele.
A minha segunda tese sobre o jornalismo é a ausência de memória cultural. Em 1958, o então jovem realizador José Matos Maia, levado pela leitura de revistas e fanzines, descobrira Welles e produzira o episódio para a Rádio Renascença. O episódio não chegou ao fim, porque as linhas de telefone da polícia estavam "entupidas", com ouvintes muito amedrontados, e agentes da polícia entraram na estação e puseram cobro à aventura estética. Nos dias seguintes, Matos Maia foi responder a um inquérito na polícia política. Se repetisse um pânico semelhante, ficaria preso.
O jornalista não fez qualquer alusão a essa história. No caso de 1958, esteve em causa a ausência de liberdade e a presença constante da vigilância e da censura. Em 1988, o episódio português era já conhecido e o realizador voltaria a repeti-lo, agora em situação de liberdade de expressão e com igual medo coletivo, o que indica o impacto dos media. A rádio talvez tenha maior peso que a televisão, porque falta a imagem e o ouvinte obriga-se a reconstruir o que ouve para o tornar mais real ou inteligível.
A meu ver, houve preguiça - é mais fácil retirar a informação oriunda de uma agência, ou hoje de um sítio da internet, do que procurar divulgar o que aconteceu no país.
O texto do segundo dia tem título, antetítulo e pós-título bem expressivos. A homenagem voltara a assustar uma população e a polícia teve de intervir (e proteger os animadores da rádio). Os dois telefones da rádio não pararam de tocar nessa tarde. Brincadeira de mau gosto e ameaça de bomba nos estúdios da rádio foram consequências não previstas. Por isso, um dirigente da estação de Braga prestou declarações ao jornal mas manteve o anonimato. O medo voltara-se contra ele.
A minha segunda tese sobre o jornalismo é a ausência de memória cultural. Em 1958, o então jovem realizador José Matos Maia, levado pela leitura de revistas e fanzines, descobrira Welles e produzira o episódio para a Rádio Renascença. O episódio não chegou ao fim, porque as linhas de telefone da polícia estavam "entupidas", com ouvintes muito amedrontados, e agentes da polícia entraram na estação e puseram cobro à aventura estética. Nos dias seguintes, Matos Maia foi responder a um inquérito na polícia política. Se repetisse um pânico semelhante, ficaria preso.
O jornalista não fez qualquer alusão a essa história. No caso de 1958, esteve em causa a ausência de liberdade e a presença constante da vigilância e da censura. Em 1988, o episódio português era já conhecido e o realizador voltaria a repeti-lo, agora em situação de liberdade de expressão e com igual medo coletivo, o que indica o impacto dos media. A rádio talvez tenha maior peso que a televisão, porque falta a imagem e o ouvinte obriga-se a reconstruir o que ouve para o tornar mais real ou inteligível.
A meu ver, houve preguiça - é mais fácil retirar a informação oriunda de uma agência, ou hoje de um sítio da internet, do que procurar divulgar o que aconteceu no país.
terça-feira, 12 de dezembro de 2017
O fim das rádios livres (dezembro de 1988)
As rádios piratas ou livres fecharam a emissão na noite de 23 de dezembro de 1988. Uma comissão nomeada pelo governo iria estudar condições económicas e técnicas para atribuir as cerca de 400 alvarás de emissão e precisava de silêncio no éter. Uma condição de preferência era um projeto de estação incluir profissionais da comunicação social.
Nesse mesmo dia, o Jornal de Notícias (Porto) editava uma página completa ao tema. O sugestivo título era Rádios locais. Agora é o som do dinheiro. Da página, retive dois textos assinados por dois radialistas piratas, que tinham estado na Rádio Caos (e ainda na Rádio Delírio), as duas estações mais ousadas ou dessintonizadas do Porto.
No dia seguinte, o jornal voltaria a dar destaque ao tema, com entrevista ao ministro António Couto dos Santos, que esperava que a comissão governamental concluísse o seu trabalho em dois meses. Uma nota do governo, colocada em destaque nessa página, concluía que era forçoso acabar com a anarquia das ondas radioelétricas.
sábado, 9 de dezembro de 2017
Escutam a Rádio Caos em 102 MHz
Daniel Guerra (Expresso, 2 de julho de 1983), falou com Krenox, Oliveira, Silveira, Goldstein e Hermenegildo [vários colaboradores ou um e seus heterónimos?]:
“A Caos tem já ouvintes fieis, que sabem de cor os dias e as horas em que é preciso procurar, na frequência conhecida boca a boca, a informação alternativa, a discussão de problemas que raramente encontram debatidos nas emissoras com alvará e programa anunciado nos jornais”. O animador António da Silva Oliveira diria: “O que queremos acima de tudo é comunicar, estabelecer uma comunicação de rutura perante as exigências de integração num espírito novo. Tudo isto tendo em vista a proposta de uma alternativa aos modelos tradicionais de fazer rádio. […] A Caos não é um sítio de emoções fracas, nenhum dancing, nenhum centro de repouso. É assumidamente um lugar de prazer, um espaço de interpelação”.
Sob o tema geral “Os Binários do Planeta em Vigor”, o jornalista, também colaborador da Rádio Caos, registou rubricas como “O Crepitar da Pipoca”, “Leite, Literatura e Assassinos”, “Os Cogumelos da Masmorra” e “Jazigo de Família”. Naquele momento, um grupo estava a reestruturar a secção de noticiário e reportagem, para dar importância ao setor. Objetivo: lutar contra a “massificação desregrada da produção cultural”. Em montagem nessa data uma entrevista com elementos da FDR (El Salvador) e Comissão Justiça e Paz (Guatemala). A Caos daria voz aos presos do PRP, levando em direto os pontos de vista de Isabel do Carmo. O microfone da estação assentava em cima de dois tomos das obras completas de Lenine!
Como as outras rádios piratas, a Caos encerrou em 24 de dezembro de 1988. Ainda concorreu a uma licença mas ficaria fora dos lugares elegíveis.
“A Caos tem já ouvintes fieis, que sabem de cor os dias e as horas em que é preciso procurar, na frequência conhecida boca a boca, a informação alternativa, a discussão de problemas que raramente encontram debatidos nas emissoras com alvará e programa anunciado nos jornais”. O animador António da Silva Oliveira diria: “O que queremos acima de tudo é comunicar, estabelecer uma comunicação de rutura perante as exigências de integração num espírito novo. Tudo isto tendo em vista a proposta de uma alternativa aos modelos tradicionais de fazer rádio. […] A Caos não é um sítio de emoções fracas, nenhum dancing, nenhum centro de repouso. É assumidamente um lugar de prazer, um espaço de interpelação”.
Sob o tema geral “Os Binários do Planeta em Vigor”, o jornalista, também colaborador da Rádio Caos, registou rubricas como “O Crepitar da Pipoca”, “Leite, Literatura e Assassinos”, “Os Cogumelos da Masmorra” e “Jazigo de Família”. Naquele momento, um grupo estava a reestruturar a secção de noticiário e reportagem, para dar importância ao setor. Objetivo: lutar contra a “massificação desregrada da produção cultural”. Em montagem nessa data uma entrevista com elementos da FDR (El Salvador) e Comissão Justiça e Paz (Guatemala). A Caos daria voz aos presos do PRP, levando em direto os pontos de vista de Isabel do Carmo. O microfone da estação assentava em cima de dois tomos das obras completas de Lenine!
Como as outras rádios piratas, a Caos encerrou em 24 de dezembro de 1988. Ainda concorreu a uma licença mas ficaria fora dos lugares elegíveis.
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