domingo, 11 de janeiro de 2004

BRITNEY PERDE A INOCÊNCIA

É este o título do artigo sobre Britney Spears, saido hoje na revista dominical de El Pais. O actual momento está a ser importante para ela: um casamento quase secreto e logo anulado e o lançamento do disco In the zone. Tudo bem embalado, pois o importante é amplificar acontecimentos para chamar a atenção. E vender.

No artigo do El Pais, assinado por John Aizlewood, da Q Magazine, fica a saber-se que ela votou em Scwarzenegger (que não lhe pôs a mão, quando se conheceram), que gosta de fumar (o que provocou as delícias da imprensa sensacionalista) e que aceitou a passagem de testemunho de Madona (após o beijo na cerimónia de entrega dos prémios da MTV enquanto cantavam Like a virgin e do convite a Madona para cantar no seu disco, na música Me against the music, consolidando a amizade entre ambas).

De 21 anos, o novo ícone mundial vendeu 50 milhões de cópias do seu disco anterior, suturando os insucessos do filme Croassroads e do restaurante Nyla, em Nova Iorque, que fechou com dívidas no montante de 400 mil dólares (o pai dela, construtor e dono de um ginásio, queria ser cozinheiro). A carreira de Britney começou em 1999, com Baby one more time.

Funciona a promoção - ou a publicidade, ou o escândalo. As fotografias, de Ellen von Unwerth, que acompanham o artigo fazem parte da campanha - Britney com piercing no umbigo, fazendo de pin-up, rainha do drama (sonha fazer um filme musical), mais sensual. Falta a Britney ser um pouco mais alta, como ela própria gostaria.

Sobre a produção na indústria cultural da música, nada diz. Vem isto a propósito do tema central do número de Outono de 2003 do JMM - The International Journal on Media Management, "Culture and the media industry". Em texto escrito por Jerald Hughes e Karl Reiner Lang, com o título "If I had a song: the culture of digital community networks and its impact on the music industry", os autores destacam o peso da inovação tecnológica na produção musical e sua reprodução. Hoje, a internet desenvolve uma audiência interactiva e mais vasta mas dispersa e atenta a um mercado mais fragmentado em nichos. O efeito da transformação da música analógica em digital trouxe consequências ainda difíceis de avaliar numa indústria estabelecida desde há muito segundo determinados padrões de produção e distribuição. Com as redes virtuais e digitais surgem comunidades de utilizadores tecnológicos - quer artistas quer consumidores -, envolvidos em entidades dinâmicas e organizadas por si mesmas, baseadas na troca de informação electrónica. Com a redistribuição do poder manifestam-se as mudanças nos valores culturais: mudanças comportamentais, mudanças de atitude e mudança nos juízos éticos.

Isto é, passou-se, ao longo do tempo, da concepção da música como experiência (o concerto público) para a ideia de artefacto (registo em disco ou outro suporte) e para a actual ideia de música como informação, com o MP3, por exemplo, que engloba e retrabalha as concepções anteriores. Assim, a música como experiência pode ser a transmissão ao vivo através da internet e o streaming, enquanto a música como artefacto engloba a subscrição de um CD. A música como informação permite a partilha de ficheiros, a sua remistura e o sampling. Passa-se de uma indústria baseada no artefacto para uma indústria baseada na informação, de uma distribuição em massa para uma baseada na P2P (de utilizador para utilizador), de uma produção com recursos escassos para uma de recursos de baixo custo de produção, de direitos fixos de propriedade para uma informação musical aberta (que permite a remistura e o sampling) e da dicotomia criador/consumidor para a convergência criador/consumidor (Hughes e Lang, 2003: 187).

Com certeza, isto vai abalar toda a cadeia de valor na indústria musical. De onde algumas interrogações: qual o papel das Britney Spears de amanhã?, será apenas o de motor da novidade e do efémero?, ou de alguém que salta de indústria cultural em indústria cultural, fazendo sinergia numa nova corrente, recombinando também as indústrias culturais em eixos horizontais?

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