sexta-feira, 7 de outubro de 2005

A AULA DE ONTEM COM NUNO GALOPIM

A propósito de Nuno Galopim, lê-se num post recente do blogue Rádio Crítica que "ele é o astronauta que conduz a nave. Radialista já com um passado consideravel no éter (RDP Antena1; Antena2; Antena3; XFM; TSF) está desde a última primavera na RADAR (Lisboa, 97.8) com o programa Discos Voadores. A estação alternativa não tinha, até à data, programas de autor, exceptuando algumas rubricas e apontamentos de curta duração. Discos Voadores não foge à patine da estação que lhe serve de base, mas acrescenta-lhe substância. Música alternativa na maior parte da ementa, mas não só. Novas edições, algumas analogias, adendas informativas, «ódios» de estimação; memórias a propósito e convidado(a)s em estúdio para conversar num «encontro imediato de terceiro grau», sempre à volta da música escolhida pelos próprios e, mais uma vez a crítica, num inevitável «fio de azeite».

Claro que foi um prazer ouvi-lo (creio que o auditório de alunos e alunas partilha a minha opinião). Das notas que tirei do que ele disse, aqui ficam algumas, a primeira das quais se prende com o tempo de juventude do jornalista do Diário de Notícias e grande animador do suplemento de 6ª fª DN:Música. Nessa época, não havia concorrência à música como se nota hoje, em que existem o telemóvel, a internet, os DVDs. A música envolvia os ouvintes num movimento - e era uma reacção à cultura dos mais velhos.

O jornalista, que falava a um público que se está a treinar (formar) em olhar mais clinicamente os públicos e as audiências de indústrias culturais, elencou algumas das características da música nos nossos dias. Primeiro, os discos, razão pela qual os profissionais fazem música. Ele defendeu o quanto fundamental é o registo gravado (disco como entidade física ou virtual, MP3). E alertou consciências: fazer download gratuito é o mesmo que os jovens estudantes e futuros jornalistas verem as suas peças escritas copiadas e apropriadas por terceiros. Em segundo lugar, a música quer dizer procura de novos talentos, a nova geração que faz discos. E, em terceiro, o concerto, fenómeno musical para além dos discos, a intersecção do músico com o público. Para Nuno Galopim, nada se compara com o concerto ao vivo, com a escuta.

Ora, com os anos, a música transformou-se num mercado de quantidade e de cópias, devido à facilidade de pirataria. O que tem levado a baixas substanciais na venda de CDs, cujo preço ronda os €17 [também devido ao valor do IVA, a 21%, diferente do do livro, a 5%]. Ele lembrou que a pirataria anda em 20 a 25% na Europa, mas 90% em países como a China e o Panamá. As culpas podem também atribuir-se à indústria discográfica, que tem praticado preços elevados. Desde há muito tempo, os discos contêm uma ou duas canções de interesse, mas o resto é uma "salada", o que torna a aquisição de um CD um investimento elevado. Além disso, a indústria habitou-se a ganhar com a edição de discos antigos (do tempo do vinil), com som remasterizado, sem caixa, com caixa e livro, isto desde 190, quando o CD se implantou. E não se importando com os direitos de autor, caso de edições feitas num país e vendidas noutros países.

Para o jornalista, a música precisa de ser pensada de uma maneira profissional. Galopim defende a música enquanto indústria rentável (vê-se até pela procura do termo nos motores de pesquisa da internet). Isso passa pela definição de legislação: nos Estados Unidos, onde já entrou em vigor uma nova legislação, o volume de vendas on-line triplicou, ao passo que a União Europeia ainda anda à procura dela. No elencar de grandes questões, Nuno Galopim abordou o ensino da música na escola, que se resume quase ao ensino da flauta, e a má relação das estações de rádio e de televisão. Nos media impressos, para além dos suplementos do Diário de Notícias e do Público, há um jornal, o Blitz, a passar por uma nova fase. Para Janeiro, espera-se que o suplemento renovado de cultura do Expresso dedique mais espaço à música.

Na rádio, a música portuguesa passa somente na Antena 3, Radar e Oxigénio [música de qualidade dentro dos parâmetros estéticos do jornalista]. No restante espectro radiofónico, impera, por um lado, a memória, a nostalgia, e, por outro lado, uma programação para a faixa etária dos 15 aos 25 anos (mais disponíveis para ouvir música e ir aos concertos das bandas que constam nas playlists), mas sem ousar inovar na programação. Quanto à televisão, a RTP tem o Top mais, a SIC Notícias um mau magazine e a TVI "foge a sete pés" (tirando o fenómeno da novela Morangos com açúcar, os D'zrt).

Houve ainda tempo para falar do produto DN:Música mas não do seu programa da Radar. Nuno Galopim fez um pequeno historial da existência do suplemento do jornal, nascido em 1998 com o nome de DN Mais e que, para além da música, incluía cinema, DVDs, jogos vídeo e internet, o que nós, leitores, gostaríamos de ver recuperado. O suplemento visa dois públicos, o do Diário de Notícias e o que se interessa pelo fenómeno musical. Daí, o suplemento falar de discos novos e de gostos menos recentes. E sintetizou com uma história: a mãe que tem três filhas com gostos estéticos diferentes, uma punk, uma gótica e uma betinha. Um jornal tem de agradar, dentro de um certo equílíbrio, públicos diferentes. E em fazer pedagogia, saber explicar porque gosta de uma banda ou de um disco, e não ir na corrente ou na agenda dos concertos. Explicou ainda como organiza o suplemento: as entrevistas, as resenhas, os editoriais, a análise das indústrias culturais [reprodução parcial da página 54 do suplemento de hoje].

Nuno Galopim teve também uns minutos para falar no jornal que ia sair hoje, sobre a new wave, um bom trabalho como ele e os seus colegas nos habituaram a ler. E mais uns minutos para responder a perguntas do auditório.

1 comentário:

Anónimo disse...

"Primeiro, os discos, razão pela qual os profissionais fazem música. Ele defendeu o quanto fundamental é o registo gravado (disco como entidade física ou virtual, MP3). E alertou consciências: fazer download gratuito é o mesmo que os jovens estudantes e futuros jornalistas verem as suas peças escritas copiadas e apropriadas por terceiros

Comparação completamente irracional. Os músicos, jornalistas, artistas e intelectuais querem, em geral, que as suas obras e criações sejam ouvidas, lidas ou vistas pelo maior público possível. É por isso que iniciativas como a enciclopédia Wikipedia, o movimento de software livre ou mesmo alguns músicos no campo da electrónica obtiveram o sucesso que hoje têm.

Pura e simplesmente, os agentes das indústrias culturais têm que se convencer que se os consumidores não tivessem acesso online gratuito aos discos, filmes e livros, nunca os iriam comprar. Se tal vier a acontecer, a sua divulgação acabará por ser menor, alguns génios ficaram para sempre escondidos, a cultura irá decair, a indústria acabará por definar mais cedo.