domingo, 11 de junho de 2006

PEQUENAS NOTAS SOBRE A IMPRENSA NUM DOMINGO DE SOL

1. No Diário de Notícias de ontem, Ana Sá Lopes, escrevendo sobre Timor-Leste e a situação dramática que ali se vive, destaca a opinião de analistas australianos (quais?), segundo os quais Timor-Leste é um "Estado falhado", feito "à portuguesa". Nunca li coisa tão violenta sobre Portugal, a seguir ao recém-chegado Jack Welsh, que em conferência também não foi nada abonatório para com o nosso país. Parece que tudo o que o país faz é mau e tem implicações profundas em tudo aquilo em que tocamos e contactamos. A ser verdade o que a jornalista escreve, precisamos de mudar o nosso país; só não sei como.

Olhando melhor a notícia, percebe-se que Ramos Horta (ministro dos negócios estrangeiros e da defesa) vai defender uma proposta australiana na ONU (não sei muito bem qual), o que significaria uma derrota diplomática para Portugal. E, mais significativo, é um texto assinado por um filho do mesmo Ramos Horta, no Expresso de ontem, que considera Alkatiri (primeiro-ministro) e Xanana Gusmão (presidente da República) como os senhores da guerra, em que ambos estão a conduzir o país para o desaparecimento. Isto é: dos três dirigentes mais conhecidos de Timor - Xanana, Alkatiri, Horta - fica a ideia do pai como salvador da pátria. Claro que não lhe fica nada bem esta posição, além de que ele se assina como investigador num instituto australiano.

Certamente, as coisas, embora resultem de conflitos entre personalidades fortes, têm explicações mais profundas que apenas estas declarações impressionistas. Uma carta-artigo num semanário como o Expresso, sem qualquer explicação, é um pequeno barril de pólvora a rebentar muito longe daqui, exactamente em Timor-Leste. Aos jornais e jornalistas exige-se que enquadrem e contextualizem.

2. Hoje, começou o período de férias do provedor do leitor do Público. Tendo começado funções nos princípios do ano, Rui Araújo já tem uma marca de identidade na sua página. Menos conciliador e menos teórico que outros provedores de jornais - antigos ou actuais - tem a seu favor ter recebido 886 mensagens electrónicas e oito cartas (Público de 4 de Junho), número soberbo, se se considerar que outros provedores se queixaram ter pouca participação dos leitores, indicativo de um espaço de opinião alargado. Isto é, Rui Araújo é menos conciliador e teórico e isso agrada aos leitores.

A mim também. Os erros que aponta aos jornalistas são, com certeza, objectivos. Mas ele surge frequentemente como se fosse um matador de carácteres. Fica a ideia que os jornalistas são incapazes, quase incompetentes, que o melhor seria substitui-los por outros. Numa das últimas páginas do provedor, Rui Araújo fez referência a uma jornalista, pela qual eu tinha uma grande atenção em ler, dadas as matérias que habitualmente escreve serem do meu agrado (observação: eu nem sequer a conheço pessoalmente). Doravante, passarei a lê-la com cautela - ou a saltar para além dos seus textos.

O resultado final pode ser que deixe de comprar o jornal, por tantas incoerências e defeitos. Eliminam-se, de uma só vez, o mensageiro e a mensagem. Talvez a concorrência beneficie.

3. Por escrever em concorrência. Parece-me absurdo o uso de recursos humanos dos jornais no destaque do mundial de futebol. Por exemplo, o Diário de Notícias reduziu de duas para uma página a secção dos media, porque houve deslocação de jornalistas para cobertura do futebol. Será que os leitores do jornal vão ler a quantidade elevada de páginas sobre a matéria? Aos leitores não basta a televisão? E os jornais desportivos, mais especializados em fofocas, estratégias e tácticas do jogo, não são melhores e têm públicos fiéis? Será a atracção dos tablóides a surtir efeito, com os jornais de referência a descomprimirem a sua postura nestas ocasiões? Perguntas finais: servem a opinião pública? VENDEM MAIS?

Sem comentários: