segunda-feira, 18 de maio de 2009

A VITÓRIA DA VÍTIMA?

Em 1 de Abril de 2006, escrevi aqui no blogue sobre O BELO, A VÍTIMA E A VILÃ. Ele era Francisco Penim, então director de programas da SIC, a vítima era Clara de Sousa, de quem o primeiro se separara naquela altura, e a vilã era Soraia Chaves, então na moda pelo erotismo que pôs na sua representação no filme O Crime do Padre Amaro. Penim fora meu convidado dois dias antes numa aula de mestrado ("Media, Públicos e Audiências"); senti-o tenso, com muitos telefonemas. Só no dia seguinte é que percebi a razão: as capas das revistas de televisão e cor-de-rosa. Depois, devido aos maus resultados em termos de audiências da SIC, ele acabou por ser despedido e presentemente saiu das revistas cor-de-rosa. A actriz tem sido notícia regular por causa de outros filmes e séries televisivas polémicas, como Call Girl e A Vida Privada de Salazar.

Por seu lado, a jornalista Clara de Sousa (41 anos) tem mantido alguma presença nas revistas de televisão e cor-de-rosa pelos namorados que teve desde então e, nesta semana, por causa do seu casamento "secreto" com André Marques (29 anos e editor de imagem no mesmo canal onde Clara de Sousa é pivô do noticiário da noite), ocorrido a semana passada. Pelo menos vi quatro publicações (incluindo um diário) com manchetes com a jornalista, de que incluo aqui dois exemplares.

Pensei, quando vi as manchetes: a vítima de 2006 afinal virou vilã, aproveitando as armas de Penim e Chaves. Ainda por cima com títulos a marcarem esse território: Casou-se no domingo, em segredo, com um homem 12 anos mais novo e não teve na cerimónia os filhos, a mãe e a sogra. Família revoltada (TV Guia) [a mãe já faleceu] e Clara de Sousa. Desesperada por engravidar (Nova Gente). Com as fotografias de capa a ajudarem a configurar a mulher malvada em que se tornou. Parecia a vitória definitiva da vítima.

Mas lendo as notícias, fiquei com pensamentos duplos e ambíguos. Não há fotos do casamento, apenas umas fraquíssimas fotografias dos dois, e muitas imagens de arquivo. A Nova Gente fala do desejo antigo da jornalista ter mais filhos, mas referindo-se a uma situação de há dez anos. Nem esta nem a outra revista conseguiram falar com os recém-casados, pelo que montaram peças baseadas em ideias antigas, confidências de quem é mais ou menos próximo do casal (a única prova do novo estado civil da jornalista é a aliança que usa). Nem sequer o padrinho de casamento, de quem se publicam imagens, atendeu o telefone. A mãe do noivo diria que não foi ao casamento porque teve "medo destas coisas, das fotografias, da exposição mediática" (TV Guia). Linhas atrás a mesma revista explicava que só o pai e a madrinha da jornalista testemunharam o acto.

Quando em 2006 escrevi sobre O BELO, A VÍTIMA E A VILÃ, adiantava que as revistas de televisão e cor-de-rosa vivem de notícias para além da programação televisiva. Vivem, sobretudo, das estrelas e das celebridades da televisão, constroem narrativas paralelas às histórias que aquelas representam nos programas, revelam a parte privada das personalidades públicas. Melhor: eliminam a parte privada, porque esta ao ser publicitada nas revistas torna-se pública. E as leitoras (mais os leitores) gostam destas histórias de vilãs, mas também de vítimas que acabam por inverter a situação e ganhar, de casamentos e de crianças que nascem e crescem e se exibem nas revistas, num prolongamento natural das gerações tipo álbum de família.

Aparentemente, não há uma agenda de acontecimentos, mas eles encontram-se: foi a semana do casamento da modelo e apresentadora Marisa Cruz com o jogador João Pinto, depois veio a mágoa da actriz Alexandra Lencastre porque o namorado a queria trocar por outra (mas uma revista assegurava a falsidade da informação e mais tarde a vilã foi desmascarada e voltou tudo à normalidade). A agenda é distinta dos jornais de informação geral, não narram outras desgraças e acidentes a não ser divórcios e paixões desfeitas, mas os enredos tornam populares os que entram nas capas. Pode mesmo acontecer que as personagens que aparecem nas capas paguem bom dinheiro para haver boas histórias. Nesse sentido, surge, por vezes, um(a) jovem divorciado(a) a dizer que está solteiro(a) e à procura de par.

No caso presente, a jornalista pode ficar algo irritada, mas, no fundo, ela e a televisão que representa têm publicidade gratuita. A sua história palpitante, com enredos telenovelísticos, pode augurar um regresso da audiência aos programas do canal. Afinal, ela é uma estrela da televisão e ganha à concorrência feminina dos noticiários das 20:00.

1 comentário:

Anónimo disse...

A apresentação do Próximo Futuro será feita dia 19 de Maio, terça-feira, na Sala 2 da Sede da Fundação, às 15h30, por Emílio Rui Vilar, presidente da Fundação Calouste Gulbenkian e por António Pinto Ribeiro, coordenador do programa.