terça-feira, 30 de julho de 2013

Encontro sobre serviço público de televisão

Em parceira com a RTP e a Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, o INESC Porto (Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores) vai realizar um workshop dedicado à temática do serviço público de televisão e das novas dimensões do operador público (11 de outubro de 2013, das 10:00 às 16:45 (instalações do INESC Porto: Rua Dr. Roberto Frias, 378, Porto). Para os organizadores do encontro, "numa altura em que se debate o futuro da RTP e dos seus serviços, este workshop liderado pela Prof. Dr. Karen Donders, da Vrije Universiteit Brussel, Bélgica, irá abordar as várias opções de evolução do serviço público, modelos de colaboração, de inovação e desafios. Serão também apresentados casos de estudos de países Europeus". A participação é gratuita, mas solicita-se a inscrição até ao dia 13 de Setembro. Uma vez que o número de vagas é limitado, é importante confirmar a presença o quanto antes. Depois, às 17:30 do mesmo dia, tem lugar no auditório daquela Faculdade do Porto uma conferência pública intitulada PSM in a Small Country with a Global Culture, com apresentações do Eng. Beato Teixeira, do Conselho de Administração da RTP, e da Prof. Dr. Karen Donders, docente da Vrije Universiteit Brussel, Bélgica. O painel é moderado pelo Prof. Dr. Pimenta Alves, FEUP/INESC Porto. A entrada é livre e gratuita.



Entretanto, e como mencionei há dias, na Universidade de Coimbra, vai realizar-se o Congresso Internacional Desafios dos Media de Serviço Público, planeado para os dias 10 e 11 de Dezembro de 2013. E o Governo criou um grupo de trabalho informal para debater o futuro da RTP, constituído pelo antigo vice-presidente da RTP e atual presidente da ANA, Ponce Leão, antigo diretor de programas da RTP e atual diretor-geral da agência de meios Nova Expressão, Manuel Falcão, fundador e diretor-geral das Produções Fictícias, Nuno Artur Silva, e presidente do Instituto do Cinema e do Audiovisual, José Pedro Ribeiro, segundo anunciava o Expresso online ontem.

Por uma estética radiofónica

Quando alguém quer escrever sobre estética radiofónica, lembra-se dos textos de Brecht e de Arnheim. Mais perto de nós, escrevem a partir de Baitello, Flusser, Schaffer. Nunca ninguém se lembra de Fernando Curado Ribeiro. Ele via a questão deste modo: "É sempre, ou quase sempre, através da montagem e por uso da sonoplastia que o radiodrama (ou qualquer outro género radiofónico) dá uma ilusão completa, recorrendo aos meios próprios de originar sensações semelhantes às de sonho, da angústia, do medo" (Fernando Curado Ribeiro, Rádio. Produção-Realização-Estética, 1964, p. 97). Acabo de pôr o livro na minha mala de férias. Até depois!

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Museu do Chiado

ANJosé de Almada Negreiros (1893-1970) foi um artista de diversos talentos: poeta, escritor, bailarino, actor, desenhador, pintor. O Museu Nacional de Arte Contemporânea (Museu do Chiado) dedica, em exposição temporária, uma sala ao artista, nomeadamente o moderno desenho A Sesta (1939). Além de outra exposição temporária, a de Jorge Oliveira (1924-2012), A Invenção Contínua, congratulo-me com a exposição permanente, onde dialogam obras do século XIX com o século XX, numa melhor aproximação à história da arte portuguesa. Uma visita ali não esgota a necessidade de conhecer melhor a cultura artística portuguesa. O museu fica ao serviço dessa divulgação, que faz parte das suas obrigações. O que pareceu esquecido nos anos mais recentes.

sábado, 27 de julho de 2013

Conference "History and Memory of Media Reception" - call for papers

University of Beira Interior, Faculty of Arts and Letters - Portugal. February, 27 and 28, 2014. Working languages: English, Portuguese, Spanish. Topics: calls are particularly (but not exclusively) encouraged on: (1) Epistemologies, theories and methodologies of memory reception, (2) Media reception research and oral history and/or biographic methods, (3) Empirical research crossing cultural identities with reception history or memory, (4) Empirical research about reception history or memory in an everyday life perspective, (5) Women and reception, and (6) History of media and ethnographic research. Norms: extended abstracts (500-800 words) should indicate title, theoretical perspective, methods and results (if applicable); Author(s) identification and contacts should be sent in a separated file along with the paper title. Abstracts and papers should be submitted via e-mail to history.memory.media.reception@sapo.pt. LabCom Books will publish a selection of articles on e-book. Calendar: deadline for extended abstracts: November 30, 2013. Notification of accepted abstracts: December 20, 2013. Submission of full papers: January 25, 2014. No registration fees. Conference promoted by LabCom – Laboratory of Online Communication. More information soon available at http://www.labcom.ubi.pt/.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

ECREA Communication History Workshop

History of the media in transition periods. Lisbon, 4-6 September 2013. Preliminary programme:


quinta-feira, 25 de julho de 2013

Um barbeiro na rádio

O programa dela na rádio tinha uma réplica num jornal da cidade. Ou, pelo menos, o mesmo título. Nessa altura, as emissões eram em onda média. Não estou em condições para garantir que ela foi a pioneira dos textos publicitários como hoje se conhecem (ou publi-reportagens): um enredo conduz lentamente ao produto a publicitar. Mas gostaria de puxar para mim essa relação social. Na altura, a rádio dela não tinha permissão oficial de emitir publicidade, mas a sabedoria daquela gente fizera uma inovação a partir de tal negação. A ideia era contar uma história, com personagens e sítios, para no fim revelar o patrocínio ao programa. Tipo: água de colónia, tinturaria, pastelaria. Ou uma mais prosaica Casa Carlos. Num período curto, ela fez entrevistas a colegas seus da rádio, um deles autor de novelas radiofónicas. Era um tempo anterior ao da televisão, mas pelo êxito atual vê-se a força que tinha o género. Ao fim e ao cabo, contar uma história com personagens e sítios, como na publicidade. Descobri que, da produção desse autor de novelas radiofónicas, há pelo menos uma que está publicada (com exemplares na Biblioteca Nacional e na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra). E que o autor escrevera vinte anos antes sobre barbeiros, com muita acutilância, tipo barbear, pentear e cortar cabelo, o que denota o conhecimento próprio da matéria. Acho que ele foi barbeiro antes de escritor de novelas de rádio, outra ilação que gostaria de chamar para mim. O saber acumulado num espaço público como a barbearia pode ter feito do profissional um excelente contador de histórias. Parece bizarro, mas ele também dirigiu a revista de um grupo excursionista e recreativo. De igual maneira que a realizadora do programa de rádio dava recitais de poesia noutra emissora e publicou um romance, um diário escrito pelo namorado, com 23 anos, para a namorada, com 15, revisitar quando ele morresse. E a narrativa, de modo muito ambíguo, leva a pensar que o jovem morreu nessa altura. Paixão ideal mas curta como a primavera de uma andorinha; memória e fidelidade para sempre. Afinal, valores de uma época. Aquela rádio parecia viver num devaneio puro. Ou de perplexidade. Então, a oposição ao regime concorrera às eleições, mas não obtivera nenhum deputado para a Assembleia, uma grande estranheza, digo. Talvez um dia escreva sobre a estação e os seus profissionais diligentes mas com um problema imenso de censura.

domingo, 21 de julho de 2013

Tertúlia sobre rádio

1Hoje à tarde, na Praça da Liberdade, no Porto, realizou-se a tertúlia Porto, uma novela da rádio, organizada por Cultureprint e Rádio Manobras dentro do programa Letras na Avenida, com Jorge Guimarães Silva (ao centro, na fotografia em baixo). Presente, também Bernardino Guimarães, daquela estação e fundador da Rádio Caos, no tempo das rádios livres (década de 1980), à direita na fotografia em baixo. No primeiro vídeo, eu (quase sempre fora de imagem) falo sobre o Portuense Rádio Clube (1937-1954). No segundo, Carlos Magno, atual presidente da ERC, faz um comentário sobre a rádio na década de 1980.

tertúlia

sábado, 20 de julho de 2013

Joana Vasconcelos

A exposição de Joana Vasconcelos, no Palácio Nacional da Ajuda, tem dois objectivos: além da própria obra dela, os visitantes acedem a um espaço pouco visto, o dos aposentos reais de D. Luís I e Maria Pia de Saboia (1847-1911).

JV2JV4JV3JV5

Maria Keil, de propósito

Maria Keil (1914-2012) trabalhou em sucessivas áreas, como azulejo, pintura e desenho, cenografia e figurinos, design gráfico e publicidade, ilustração, mobiliário e decoração e tapeçaria mural. Uma obra gráfica e visual notável de uma mulher que viu um dos seus quadros ser retirado pela PIDE em 1947 devido ao tema, de índole neo-realista. Ela desenhou cenários e figurinos para o Verde Gaio, grupo de bailado criado por António Ferro, tem conjuntos de azulejos seus em estações do comboio metropolitano de Lisboa, trabalhou no Estúdio Técnico de Publicidade, fundado por José Rocha, fez capas e desenhos de livros infantis, desenhou selos e anúncios, colaborou com a Manufactura de Tapeçarias de Portalegre. Título da exposição: De propósito. Maria Keil, obra artística.

739

A ver no Palácio da Cidadela de Cascais. Igualmente a visitar o palácio presidencial, restaurado com muito requinte e agora aberto ao público visitante.

sábado, 13 de julho de 2013

Os cortes nas indústrias culturais no Reino Unido

O DMCS (Department of Media, Culture and Sports), organismo público britânico da área das indústrias culturais, anunciou um corte no orçamento de 5% nos museus e outras organizações artísticas e 10% no Instituto do Cinema (BFI). O corte nesta última instituição causou muita preocupação, dada a atividade cinematográfica (e no geral as indústrias culturais e criativas) ser muito elevada e considerada no Reino Unido. Um dos argumentos é que se considera as indústrias criativas uma das jóias da coroa inglesa mas, ao mesmo tempo, introduzem-se cortes significativos.

Sena da Silva

Sena da Silva. Uma Antologia fotográfica é uma magnífica exposição na Cordoaria Nacional. Entre muitas atividades, Sena da Silva (1926-2001) foi professor da Cooperativa de Ensino Superior Árvore (Porto) entre 1983 e 1987. Cruzámo-nos por ali, então. Inspirado por ele, em especial nas suas fotografias a preto e branco, procurei usar o dispositivo fotográfico que trazia comigo. A qualidade não é boa mas ficam as ideias.

sena1sena2sena3sena4

sexta-feira, 12 de julho de 2013

O olhar da China

Beijing, a capital da China, quer estreitar a cooperação com Macau nas indústrias culturais e criativas. Antigo território administrado por Portugal, Macau continua a ser uma porta de entrada e de saída para os países de língua portuguesa, onde o Brasil se inclui. Este ano, Beijing planeia investir 31 mil milhões de yuans (cerca de 3,8 mil milhões de euros) em projetos culturais, o que se traduz em muitas oportunidades de negócio para Macau.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Peças de finalistas

No teatro Helena Sá e Costa, a ESMAE apresentou uma peça de Federico Garcia Lorca, Público, metáfora sobre o teatro, os tópicos e os ensaios, a sua visão e públicos. É uma alusão aos espaços do teatro com a distinção entre ar livre e da areia, entre as convenções e a ilusão da realidade, buscando exemplos na Grécia de Helena e na Inglaterra de Julieta, histórias do património artístico universal. A peça esteve proibida durante bastante tempo, pelo tema e pela sensualidade. No teatro Carlos Alberto, a ESAD apresentou uma peça a partir de Ésquilo (Agamémnon) e Eurípides (As Troianas), Máquina-Tróia, sobre a guerra, a vitória e a derrota, e sobre a vingança. O sacrifício de Ifigénia, a ira de Clitemnestra, o regresso de Agamnémnon e o cavalo de Tróia compõem a trama patente no palco.

Ambas as peças resultam de trabalhos dos alunos finalistas das duas escolas do Porto. Por isso, são textos clássicos que põem alunos e encenadores em diálogo, numa procura dos limites e das exigências da profissão. Como provas finais de alunos, há um recurso que não se encontra nas companhias profissionais: grupos grandes de atores e atrizes, com histórias mais gerais, sobre a sociedade e a humanidade. As histórias representadas nas companhias profissionais são sobre famílias ou indivíduos, extraindo o espectador inferências da sociedade.

A encenação de Público é complexa, cheia de luz, movimento e contra-movimento, com grande rapidez e muita ocupação de espaço, a extravasar o palco, com figurinos coloridos (roupa muito quente para os atores em dias de muito calor, como neste fim de semana). A peça da ESAD tem um primeiro quadro de uma luminosidade muito poética, retomada em alguns outros momentos. Posso dizer que uma é mais exuberante e a outra mais austera.

As duas peças são sobre a palavra mas a da ESAD disponibiliza uma atenção mais intensa. Ambas as peças incorporam alunos estrangeiros, de onde tiram partido: o inglês, o francês e o castelhano na peça da ESMAE; o castelhano e o grego na peça da ESAD. O teatro é, como a literatura, um domínio privilegiado da palavra, dos significados e das entoações. Mas é também dos gestos, dos movimentos e da música. Se em Público, se privilegia a música, em Máquina-Tróia o ruído do vento é dominante.

lorcaTUNA_T~1

domingo, 7 de julho de 2013

Ler Jorge Luís Borges

gatoOntem à tarde, Ana Sofia Ferreira e Rui Manuel Amaral leram Jorge Luís Borges na livraria Gato Vadio. Ana Sofia Ferreira está a fazer doutoramento em literatura, Rui Manuel Amaral é licenciado em História e redator publicitário, um dos autores do blogue http://last-tapes.blogspot.pt/, autor de Caravana (Angelus Novus, 2008) e Doutor Avalanche (Angelus Novus, 2010) e fundador e coordenador literário de Águas Furtadas, revista que fiz já alusão aqui no blogue.

Além da leitura de textos em diversas obras, que mostram a universalidade, profundidade e soberba imaginação do autor, que partia regra geral de uma premissa verdadeira ou tão próxima da verdade quanto possível ou verosímil para nos levar a mundos estranhos, minuciosos e de grande requinte filosófico, que enganavam o leitor que, seduzido, aceitava esse engano, houve comentários dos dois leitores e dos participantes na tertúlia.

Foram lidos, entre outros, os textos O Borges e eu, Os mortos, Diálogo sobre um diálogo, O punhal, O problema, O sono e O episódio do inimigo. Eu ouvi, fotografei e fiz imagens em movimento e som. Para o próximo outono, Rui Manuel Amaral promete uma terceira série de tertúlias literárias naquele espaço acolhedor de livraria e pequeno-bar à rua do Rosário, no Porto.

jlb

sábado, 6 de julho de 2013

Eldorado

eldoradoCamila, Tânia e Maria da Luz são jovens com cerca de 25 à procura de emprego. Respondem a um anúncio que prometia o emprego da vida. Encontram-se na sala de espera da empresa. Como concorrentes, a relação entre elas é fria. Mas fica-se a conhecer rapidamente a personalidade de cada uma. A primeira é mais extrovertida, a segunda é mais tímida, a terceira parece dissimulada. O entrevistador chega contente e reforça a ideia de um emprego de sonho, o Eldorado do título da peça.

Perguntas de perfil psicológico, provas de dramatização pessoal (para ver as capacidades individuais), algumas delas violentas. Mas o objetivo é conseguir o lugar. Mais peripécia menos peripécia, há lugar para as três. Só nessa altura perguntam o salário e o tipo de trabalho. O entrevistador e empregador é ambíguo mas continua a dizer que elas vão gostar de trabalhar no novo emprego. Elas vão para fora da cidade preparar kits alimentares de sobrevivência (ou outra coisa parecida). As habilitações literárias, as performances desempenhadas nas entrevistas e, até, a insinuação sensual já não parecem contar.

No ar paira a incerteza e a dúvida. Quando uma ameaça ir-se embora buscar uma coisa a casa, o empregador aponta o dedo ameaçador. As jovens ficam à espera do autocarro que as vai levar ao posto de trabalho. Além da precariedade evidente, a relação entre empregador e empregado é violenta, a lembrar o tempo da longa espera, na praça principal da aldeia, do camião que leva os candidatos a trabalhador para a plantação ou fábrica. Os mais ágeis saltam para cima do camião, os outros só lá entram com a ajuda e solidariedade dos já instalados.

Da parca sinopse que acompanha o programa lê-se “As personagens agarram-se de forma desesperada a uma esperança que pensam ser a solução dos seus problemas. Eldorado reflete (de forma irónica?) o panorama atual”. Eldorado tem direção artística, criação e construção do texto de Joana Moraes, com Ana Vargas, Gilberto Oliveira, Joana Carvalho e Sara Costa. Cartaz de Pascal Ferreira. Encenação minimalista, uma espécie de teatro pobre e direto ao espectador, boa condução dos atores. Os risos dos espectadores na representação de estreia (que não compreendi a maior parte das vezes) perturbou o trabalho dos atores. A sala, improvisada no Campo Mártires da Pátria, junto à antiga prisão central do Porto, mostra uma casa portentosa. Século XVIII? Um improvisado espaço, por generoso que seja, encobre dificuldades de organização dos eventos e das estruturas. Assim, o trabalho daquele grupo de jovens que ama o teatro, no coletivo chamado Musgo, tem uma mais árdua tarefa de continuidade.

terça-feira, 2 de julho de 2013

Resistência

No sábado à noite, antes do começo da estreia da peça O Preço, de Arthur Miller, João Lourenço, da direcção do Teatro Aberto, leu um texto sobre a situação muito precária do teatro português em geral e do seu teatro em particular, com os significativos cortes estatais aos apoios ao teatro. A sala apoiou longamente o texto, com as suas palmas. Em mim, ecoaram a palavra medo e a ideia não ter medo. A palavra que se formou em mim e ficou depois desse eco foi resistência, que quer dizer aguentar, ser ágil e perceber quais os rumos para obter de novo a confiança e a alegria de viver.

Nos dois últimos dias, a sucessão de factos políticos envolvendo o governo do país, com as demissões dos ministros das Finanças e dos Negócios Estrangeiros, não sendo uma tragédia em si levanta uma série de questões e lembra o que a peça de Miller trata: será que o contrato de credibilidade dos cidadãos nos agentes políticos se mantém ou está quebrado de um modo irremediável? Ou resta a resistência através da cultura e da solidariedade?

O Preço

PreçoSobre a peça de Arthur Miller, O Preço, estreada no sábado passado no Teatro Aberto retiro informação e imagem: "Dois irmãos [Vítor Franz, interpretado por Marco Delgado, e Walter Franz, representado por António Fonseca] voltam a encontrar-se, dezasseis anos depois da morte do pai, para desocuparem a casa que deixaram intacta ao longo de todos aqueles anos. Um velho avaliador [Gregório Salomão, pelo actor João Perry] vem dar-lhes um preço pelos móveis e objectos de que se querem desfazer. No entanto, a transacção não é tão simples como imaginaram: todas aquelas coisas fazem parte da história da família, estão repletas de memórias e obrigam-nos a confrontarem-se com o passado e com as escolhas que fizeram na vida. Qual foi o preço dessas escolhas? Qual é o preço das contas que ficam em aberto? Entre o deve e o haver, o que se perde e o que se ganha? Neste encontro cheio de emoções, debatem-se as grandes questões da vida, com a esperança sempre acesa de uma maior compreensão do que é profundamente humano".

O Preço

O polícia Vítor parece mais perto da realidade do que o irmão médico Walter, mas ambos representam uma desconfiguração perante a realidade, cada um tem um modo de focar a realidade que é diferente da própria realidade. Apesar da simpatia que o espectador atribui à personagem Vítor, o velho negociador Salomão vem chamar a atenção para a igual desatenção face aos factos. E não se regista a reconciliação entre irmãos que não se viam há muitos anos - que Ester Franz [São José Correia no papel], a mulher de Vítor, queria e que o negociador achava ser a melhor solução.

É que os dois irmãos partilhavam poucas coisas e a avaliação dos velhos móveis dividia-os de modo quase irremediável. Queriam um preço justo ou um preço alto, mas o negociante judeu chamou a atenção para os tempos modernos: os apartamentos são pequenos, sem espaço para móveis grandes, e o que as pessoas querem é comprar, mesmo que nisso haja alienação. Do mesmo modo que a aparente mudança psicológica e sociológica do irmão mais ilustrado e rico face ao mais novo e que entrara para a polícia. O preço, ou o custo, de um bem ou de uma atitude ou de um sentimento - tudo isso dividia os irmãos. O que os unia era a memória - dos berlindes ainda guardados num local secreto à recordação da mãe a tocar harpa e ao modo como ela distinguia os filhos.

A peça de Miller foi escrita em 1967 e produzida em 1968, num contexto da guerra do Vietname. Mas a história aborda a situação da década de 1930 - a derrocada da economia que levou à falência os pais de Vítor e Walter. A Grande Depressão foi, do mesmo modo que a Primeira Guerra Mundial, uma ocorrência que estabeleceu a desconfiança moderna dos cidadãos perante os governos: serão estes capazes de cumprir e honrar os seus compromissos?

Arthur Miller (1915-2005) ficou muito conhecido pelo seu casamento efémero com Marilyn Monroe, pelas peças Morte de um Caixeiro Viajante (1949), O Homem que Tinha Toda a Sorte (1940), Eram Todos Meus Filhos (1947), pela presidência do PEN Internacional (1965-1968) e pela acusação de simpatias comunistas (depôs em 1965 perante o Comité para as Actividades Anti-Americanas).