BRÉTEMAS
Já venho seguindo há algum tempo o evoluir do trabalho do blogue Brétemas, cujo autor vem de Vigo, na Galiza. E tenho gostado do seu trabalho, de modo que coloquei um link aqui na coluna da direita.
Aconselho, de novo, uma visita ao Brétemas. O texto de ontem foi sobre a capa do livro de "Farenheit 451, o clásico de Bradbury que editaremos en breve. A lectura da nosa tradución volveu emocionarme como hai tantos anos me sucedera coa película de Truffaut. É un deses libros que non envellece, quizais porque como 1984 e Un feliz mundo novo souberon describir profeticamente a submisión de Occidente aos medios e ao conformismo". Internet no centro da estratexia de normalización lingüística e aniversário da Rádio Galega são os temas antecedentes.
Agradeço também ao blogue galego a referência amável ao IC no passado dia 23.
Textos de Rogério Santos, com reflexões e atualidade sobre indústrias culturais (imprensa, rádio, televisão, internet, cinema, videojogos, música, livros, centros comerciais) e criativas (museus, exposições, teatro, espetáculos). Na blogosfera desde 2002.
quinta-feira, 31 de março de 2005
MARIA KEIL ILUSTRADORA
Foi sob este tema que a Biblioteca Nacional fez uma mostra bibliográfica da ilustradora Maria Keil, entre Setembro e Novembro do ano passado. Ocupado com as aulas, deixei passar a exposição; só agora me foi possível adquirir o catálogo (€5) e ficar com dobrada pena de não ter visto a mostra.
O catálogo é pequeno, lê-se em menos de uma hora. As reproduções das imagens, que ilustraram livros, merecem muita atenção. Há um traço fino e elegante, por exemplo na publicidade que fez para as cintas Pompadour. Além disso, o desenho envolve-se ou é envolvido por figuras geométricas ou circulares, nas ilustrações de livros para crianças, que dão uma sensação próxima do movimento e da alegria.
Aliás, é o que se conta da vida de Maria Keil, do marido Francisco Keil do Amaral e do filho (com o mesmo nome, mas conhecido por Pitum, também reconhecido mediaticamente num programa de televisão). Nas férias grandes, conta Raúl Hestnes Ferreira no catálogo, davam curso à imaginação e divertiam-se. Faziam fantoches, vestiam-se de reis, rainhas, princesas, dançarinas e outras figuras em cenários improvisados de representação. José Gomes Ferreira, Fernando Lopes Graça e Bento de Jesus Caraça contavam-se entre os convidados.
Arquitecto, Francisco Keil do Amaral ficou conhecido no país por ter ganho o concurso para o pavilhão de Portugal na Exposição Universal de Paris (1937). Maria Keil, "pintora, desenhadora, ilustradora, decoradora de interiores, designer gráfica e de mobiliário, ceramista, cenógrafa e figurinista, autora de cartões para tapeçaria e, sobretudo, para composições azulejares [...], firmou-se, há muito, como uma das referências obrigatórias da criação plástica portuguesa" (Rui Afonso Santos, no mesmo catálogo, p. 7).
Foi sob este tema que a Biblioteca Nacional fez uma mostra bibliográfica da ilustradora Maria Keil, entre Setembro e Novembro do ano passado. Ocupado com as aulas, deixei passar a exposição; só agora me foi possível adquirir o catálogo (€5) e ficar com dobrada pena de não ter visto a mostra.
O catálogo é pequeno, lê-se em menos de uma hora. As reproduções das imagens, que ilustraram livros, merecem muita atenção. Há um traço fino e elegante, por exemplo na publicidade que fez para as cintas Pompadour. Além disso, o desenho envolve-se ou é envolvido por figuras geométricas ou circulares, nas ilustrações de livros para crianças, que dão uma sensação próxima do movimento e da alegria.
Aliás, é o que se conta da vida de Maria Keil, do marido Francisco Keil do Amaral e do filho (com o mesmo nome, mas conhecido por Pitum, também reconhecido mediaticamente num programa de televisão). Nas férias grandes, conta Raúl Hestnes Ferreira no catálogo, davam curso à imaginação e divertiam-se. Faziam fantoches, vestiam-se de reis, rainhas, princesas, dançarinas e outras figuras em cenários improvisados de representação. José Gomes Ferreira, Fernando Lopes Graça e Bento de Jesus Caraça contavam-se entre os convidados.
Arquitecto, Francisco Keil do Amaral ficou conhecido no país por ter ganho o concurso para o pavilhão de Portugal na Exposição Universal de Paris (1937). Maria Keil, "pintora, desenhadora, ilustradora, decoradora de interiores, designer gráfica e de mobiliário, ceramista, cenógrafa e figurinista, autora de cartões para tapeçaria e, sobretudo, para composições azulejares [...], firmou-se, há muito, como uma das referências obrigatórias da criação plástica portuguesa" (Rui Afonso Santos, no mesmo catálogo, p. 7).
quarta-feira, 30 de março de 2005
A FNAC NO CAMPO PEQUENO?
A edição de sábado passado da revista do Expresso deixou-me água na boca. Três páginas com o título "O novo Campo Pequeno", em texto de Mafalda Ganhão e infografia de Hélder Brites e Jaime Figueiredo.
No texto: “O facto é que, debaixo da arena [da praça de toiros] um mundo novo passa a existir. Restauração, comércio e estacionamento, o Campo Pequeno passa a ter todos os argumentos modernos que justificam as visitas às novas «catedrais» urbanas”. Na infografia: informação de lojas-âncora como supermercado e FNAC.
Os meus olhos saltaram ao lerem FNAC. Isso quer dizer que deixo de ir ao Chiado ou ao Colombo para visitar e comprar livros ou DVDs. O centro de Lisboa é mesmo aqui ao lado! Vou incluir uma ida diária ao novo espaço comercial, no meu passeio higiénico a seguir ao jantar. E os €0,70 do custo do café no Spazio, ali na esquina, deixam de ser um roubo mas o preço pago pela centralidade.
A edição de sábado passado da revista do Expresso deixou-me água na boca. Três páginas com o título "O novo Campo Pequeno", em texto de Mafalda Ganhão e infografia de Hélder Brites e Jaime Figueiredo.
No texto: “O facto é que, debaixo da arena [da praça de toiros] um mundo novo passa a existir. Restauração, comércio e estacionamento, o Campo Pequeno passa a ter todos os argumentos modernos que justificam as visitas às novas «catedrais» urbanas”. Na infografia: informação de lojas-âncora como supermercado e FNAC.
Os meus olhos saltaram ao lerem FNAC. Isso quer dizer que deixo de ir ao Chiado ou ao Colombo para visitar e comprar livros ou DVDs. O centro de Lisboa é mesmo aqui ao lado! Vou incluir uma ida diária ao novo espaço comercial, no meu passeio higiénico a seguir ao jantar. E os €0,70 do custo do café no Spazio, ali na esquina, deixam de ser um roubo mas o preço pago pela centralidade.
"AI OS NÚMEROS!"
Uma das colunas do Público que leio com mais agrado é a escrita por Joaquim Fidalgo, um dos fundadores do jornal, onde atingiu um lugar elevado e foi provedor do leitor. Ele não escreve sobre temas dominantes ou fracturantes, mas sobre coisas simples – diria mesmo banais. Embora sempre com muita acutilância e sabedoria dos seus anos de vida (apesar disso, ainda é jovem).
O tema de hoje tem o título que pus no começo da mensagem. É a propósito de um estudo de opinião da Media Planning, citado pela Lusa, em que se diz que 95,3% dos jovens portugueses entre os 15 e os 24 anos compram jornais e revistas. Num outro sítio do estudo, e também referido pelo articulista do Público, lê-se que a média dos portugueses que lêem jornais e revistas atinge os 80,1%.
Comenta Joaquim Fidalgo: “Ora aqui está uma grande novidade. Eu não imaginava. E andamos todos a lamentar-nos por os portugueses lerem pouco, por os jornais terem difusões baixas, por estarmos (também) nesta matéria sempre na cauda da Europa, etc. etc. Nada disso. Agora há uma sondagem que repões, com rigor e objectividade, a verdade dos factos: os portugueses lêem jornais e revistas que se fartam”. Adiante, sugere ele. Mas conclui: “não há jornalista que ao pegar nesta «informação» se interrogue […] esses 95,3% de jovens que «compram jornais e revistas» compram quando? Todos os dias? Duas vezes por semana? Uma vez por quinzena? De mês a mês? Ou só uma vez por outra”?
Na realidade – e quase ao mesmo tempo –, eu lia na newsletter Meios & Publicidade e logo no blogue ContraFactos & Argumentos, de Pedro Fonseca, as tiragens por número dos principais jornais e revistas: Maria (261532), TV 7 Dias (168953), Nova Gente (153777), Selecções do Reader’s Digest (134941), Expresso (131070), Correio da Manhã (115943), Telenovelas (115433), Jornal de Notícias (112150) e Visão (102399). Há jornais de informação aqui representados mas muitas das publicações são sobre televisão e a sua programação.
Para rematar o seu texto, o nosso autor escreve: “Fizeram as contas?... Ou estão a gozar connosco”? Joaquim Fidalgo é actualmente professor na Universidade do Minho.
Uma das colunas do Público que leio com mais agrado é a escrita por Joaquim Fidalgo, um dos fundadores do jornal, onde atingiu um lugar elevado e foi provedor do leitor. Ele não escreve sobre temas dominantes ou fracturantes, mas sobre coisas simples – diria mesmo banais. Embora sempre com muita acutilância e sabedoria dos seus anos de vida (apesar disso, ainda é jovem).
O tema de hoje tem o título que pus no começo da mensagem. É a propósito de um estudo de opinião da Media Planning, citado pela Lusa, em que se diz que 95,3% dos jovens portugueses entre os 15 e os 24 anos compram jornais e revistas. Num outro sítio do estudo, e também referido pelo articulista do Público, lê-se que a média dos portugueses que lêem jornais e revistas atinge os 80,1%.
Comenta Joaquim Fidalgo: “Ora aqui está uma grande novidade. Eu não imaginava. E andamos todos a lamentar-nos por os portugueses lerem pouco, por os jornais terem difusões baixas, por estarmos (também) nesta matéria sempre na cauda da Europa, etc. etc. Nada disso. Agora há uma sondagem que repões, com rigor e objectividade, a verdade dos factos: os portugueses lêem jornais e revistas que se fartam”. Adiante, sugere ele. Mas conclui: “não há jornalista que ao pegar nesta «informação» se interrogue […] esses 95,3% de jovens que «compram jornais e revistas» compram quando? Todos os dias? Duas vezes por semana? Uma vez por quinzena? De mês a mês? Ou só uma vez por outra”?
Na realidade – e quase ao mesmo tempo –, eu lia na newsletter Meios & Publicidade e logo no blogue ContraFactos & Argumentos, de Pedro Fonseca, as tiragens por número dos principais jornais e revistas: Maria (261532), TV 7 Dias (168953), Nova Gente (153777), Selecções do Reader’s Digest (134941), Expresso (131070), Correio da Manhã (115943), Telenovelas (115433), Jornal de Notícias (112150) e Visão (102399). Há jornais de informação aqui representados mas muitas das publicações são sobre televisão e a sua programação.
Para rematar o seu texto, o nosso autor escreve: “Fizeram as contas?... Ou estão a gozar connosco”? Joaquim Fidalgo é actualmente professor na Universidade do Minho.
As meninas dos telefones
Para Fernanda de Castro, a telefonista "tem de desenvolver-se numa atmosfera de manivelas, de botões eléctricos e de alavancas, sob um céu metálico onde o sol não rompe nunca, nem mesmo neste claro mês de Julho". As telefonistas, como as outras raparigas, queriam o sol, o amor, as alegrias, "um certo vestidinho que viram em certa montra, para agradar a certos olhos queridos, certos perfumes, certas jóias que as fariam lindas e que todas desejam num impossível desejo; querem - pois têm apenas 20 anos! - quereriam sair dali para fora, fugir à rede dos fios telefónicos e vir procurar, à luz do sol, sob o céu que Deus fez para todos, o magro quinhão do sonho".
Mais à frente, no texto, Fernanda de Castro escreve: "- Está lá? Está lá? ... Não, não está, a menina do telefone foi atrás das vozes que dirigiu para Londres, para Berlim, para Paris; foi também viajar. Não fez as malas, não tomou o sud-express, não pôs os pés em nenhum transatlântico, não subiu em avião, mas já vai muito longe, já atravessou duas ou três fronteiras, já passou por duas ou três alfândegas".
"Pobres meninas dos telefones - continua o seu texto da primeira página do Diário de Notícias ainda em formato broadsheet -, que são as únicas meninas de Lisboa que não podem namorar ao telefone".
Mas o telefone da escritora toca: "Largo esta folha de papel e pego no auscultador. Uma voz amiga atravessa o espaço e vem até mim. De repente, o silêncio, a ligação cortada, o vácuo, a distância. Chegou a minha vez:
"-Está lá? Está lá?
"Nada. Ninguém.
"- Que grande pouca vergonha! Isto não pode continuar... Ah, estas meninas dos telefones! Amanhã faço uma queixa à Companhia...
"E, logo a seguir, depois deste desabafo, pego na pena e, com uma perfeita boa fé, assino esta crónica".
Uma pequena pérola estética esta página do Diário de Notícias! Até o itálico do texto, em contraste com a letra do resto da página, era uma nota de distinção. Vivia-se num tempo em que a literatura ainda abraçava o jornalismo (e em que, simultaneamente, António Ferro começava a brilhar nesse jornal com entrevistas feitas a líderes internacionais identificados com regimes autoritários e ditatoriais).
Nota: em Agosto de 1930, era inaugurada a primeira central telefónica automática (já sem recurso a telefonistas), na Trindade, em Lisboa, junto ao actual teatro.
ACONTECIMENTOS
1) Jornadas de Media, Cidadania e Proximidade na Covilhã, anuncia o blogue Baleia Branca, de João Carlos Correia, professor da Universidade da Beira Interior (Covilhã). O encontro, onde se discutirão media regionais, media comunitários e blogues, vai decorrer nos dias 13 e 14 de Outubro, naquela universidade. Iniciativa do Departamento de Comunicação e Artes e do Labcom (projecto Media e Proximidade).
Já coloquei na minha agenda o compromisso para o segundo destes dias, pois se trata do II Encontro Nacional de Blogues. Para quem quiser saber mais pormenores, perguntar ao João Carlos Correia, autor de um recente livro, A Teoria da Comunicação de Alfred Schutz (MinervaCoimbra, 2005).
2) Jantar de blogueiros(as) em Lisboa é já no próximo sábado. Uma organização da blogueira Caixa de Pandora. Já são 39 blogueiros (incluindo o IC), na última contagem da organização. A inscrição para este grandioso evento acaba hoje. Se anda distraido(a), contacte a organizadora; use o endereço acima indicado.
1) Jornadas de Media, Cidadania e Proximidade na Covilhã, anuncia o blogue Baleia Branca, de João Carlos Correia, professor da Universidade da Beira Interior (Covilhã). O encontro, onde se discutirão media regionais, media comunitários e blogues, vai decorrer nos dias 13 e 14 de Outubro, naquela universidade. Iniciativa do Departamento de Comunicação e Artes e do Labcom (projecto Media e Proximidade).
Já coloquei na minha agenda o compromisso para o segundo destes dias, pois se trata do II Encontro Nacional de Blogues. Para quem quiser saber mais pormenores, perguntar ao João Carlos Correia, autor de um recente livro, A Teoria da Comunicação de Alfred Schutz (MinervaCoimbra, 2005).
2) Jantar de blogueiros(as) em Lisboa é já no próximo sábado. Uma organização da blogueira Caixa de Pandora. Já são 39 blogueiros (incluindo o IC), na última contagem da organização. A inscrição para este grandioso evento acaba hoje. Se anda distraido(a), contacte a organizadora; use o endereço acima indicado.
MODA EM DOIS CONTEXTOS DISTINTOS
Os dois recortes de imprensa que ilustram esta mensagem provêem de situações diversas. O primeiro pertence a uma notícia saída no Sunday Times do último domingo (dia 27) e conta a história de três mulheres de uma certa idade que têm experimentado as várias modas ao longo da sua vida, em peças assinadas por Fiona Henderson. Caroline Elbert, que aparece na imagem, recorda os já idos anos 1950: nessa altura, as rapariguinhas vestiam-se como as suas mães.
Caroline devia ser uma mulher muito bonita, a avaliar pela imagem actual do seu rosto. Só em meados dos anos 1960, quando começou a trabalhar em antiguidades na rua Portobello (Londres), é que começou a experimentar a moda. Era hippie e um pouco selvagem que adorava o brilho dos veludos, camisetas e pernas à mostra com uma bracelete no tornozelo. Já mais para o fim da mesma década, Yves Saint Laurent abria a sua primeira loja pronto-a-vestir na Bond Street, um espaço lindo. Caroline, a trabalhar numa empresa americana e mãe de duas crianças, deixou-se levar pela moda francesa. Quando, dez anos depois, viajou pela Ásia central, foi a descoberta de um outro estilo, com um casaco do Uzebesquistão, que ela usava com umas calças jeans.
O segundo recorte pertence ao Público de 20 de Março e dá conta da ModaLisboa. Isto é, enquanto a notícia de cima mostra as escolhas em termos de consumo, esta apresenta o design que aponta para um estilo de produção. Tendências românticas e etno-chic marcarão influências lá mais para o fim do ano.
Pedro Mourão, Miguel Vieira, Nuno Gama e Osvaldo Martins foram nomes destacados na peça jornalística assinada por Maria Antónia Ascensão, em página agradável pelo seu design. Retiro só uma pequena parte do texto: "As silhuetas combinam bustos justos ao corpo com saias em balão. Mas o contrário também não é proibido". Ou seja, tudo é possível. Das nove imagens que ilustram a página, seis pertencem a modelos femininos.
A minha pergunta: em termos de indústrias culturais, quanto é que vale o negócio da moda em Portugal?
Os dois recortes de imprensa que ilustram esta mensagem provêem de situações diversas. O primeiro pertence a uma notícia saída no Sunday Times do último domingo (dia 27) e conta a história de três mulheres de uma certa idade que têm experimentado as várias modas ao longo da sua vida, em peças assinadas por Fiona Henderson. Caroline Elbert, que aparece na imagem, recorda os já idos anos 1950: nessa altura, as rapariguinhas vestiam-se como as suas mães.
Caroline devia ser uma mulher muito bonita, a avaliar pela imagem actual do seu rosto. Só em meados dos anos 1960, quando começou a trabalhar em antiguidades na rua Portobello (Londres), é que começou a experimentar a moda. Era hippie e um pouco selvagem que adorava o brilho dos veludos, camisetas e pernas à mostra com uma bracelete no tornozelo. Já mais para o fim da mesma década, Yves Saint Laurent abria a sua primeira loja pronto-a-vestir na Bond Street, um espaço lindo. Caroline, a trabalhar numa empresa americana e mãe de duas crianças, deixou-se levar pela moda francesa. Quando, dez anos depois, viajou pela Ásia central, foi a descoberta de um outro estilo, com um casaco do Uzebesquistão, que ela usava com umas calças jeans.
O segundo recorte pertence ao Público de 20 de Março e dá conta da ModaLisboa. Isto é, enquanto a notícia de cima mostra as escolhas em termos de consumo, esta apresenta o design que aponta para um estilo de produção. Tendências românticas e etno-chic marcarão influências lá mais para o fim do ano.
Pedro Mourão, Miguel Vieira, Nuno Gama e Osvaldo Martins foram nomes destacados na peça jornalística assinada por Maria Antónia Ascensão, em página agradável pelo seu design. Retiro só uma pequena parte do texto: "As silhuetas combinam bustos justos ao corpo com saias em balão. Mas o contrário também não é proibido". Ou seja, tudo é possível. Das nove imagens que ilustram a página, seis pertencem a modelos femininos.
A minha pergunta: em termos de indústrias culturais, quanto é que vale o negócio da moda em Portugal?
terça-feira, 29 de março de 2005
OS JORNALISTAS TÊM MEDO DA BLOGOSFERA
Fiquei com esta sensação depois de ler, de manhã, as duas páginas do Diário de Notícias dedicadas à blogosfera. O título não é tão poderoso - "Revolução da blogosfera pode criar um novo poder" - quanto o começo do lead - "A fronteira que distingue blogues e jornalismo é cada vez mais ténue. [...] Os jornalistas estão abrangidos por legislação própria, que não cobre a blogosfera. Assim, poderão os bloguistas [blogueiros] trabalhar dados como se fossem jornalistas?".
A percepção mais profunda do medo que os jornalistas têm da blogosfera foi a dada na infeliz resposta do jornalista (inteligente) Ricardo Costa, director da SIC Notícias, à pergunta sobre se é importante estudar e analisar a blogosfera: "Não perco muito tempo com a blogosfera. A maior parte dos blogues não tem qualquer interesse e os que têm raramente são os que se armam em «jornalismo»".
Todo o aparato do tema do dia do jornal, escrito por Diogo Sousa e Filipe Morais, gira em torno da relação da blogosfera e do jornalismo. Ora, aquela não é sinónima desta. É uma falácia possível dado que a profissão mais escrutinada e falada - depois dos médicos e dos militares e antes dos políticos - é a dos jornalistas. A blogosfera não é concorrente dos media tradicionais. Para não ser parcial, dou o link de um blogue de adolescentes, Destiiny, onde Jasmiine, nascido(a) a 8 de Maio de 1991, e frequentando a escola secundária de Santa Hilda, em Singapura, narra a sua vida diária, desde o levantar-se às 6:00 da manhã até aos deveres da escola e às curtas férias agora em Março. Trata-se de um diário pessoal - de um registo dos acontecimentos. Ora, Jasmiine não tem as características jornalísticas. Um blogue é isso: um diário.
Das seis fontes nomeadas nas peças que ocupam as duas páginas do Diário de Notícias, cinco são jornalistas identificados com os seus meios, exceptuando José Pedro Castanheira. Este, aliás, tem uma posição muito objectiva quanto ao que pensa que os blogues podem ser: "um sistema de vigilância à comunicação social tradicional". Papel que desempenha na perfeição outro dos citados nas peças, João Paulo Meneses, da TSF e animador do blogue Blogouve-se. Apesar de eu compreender a bondade desse papel, se o jornalismo precisa de sistemas de vigilância isso é o fracasso da actividade.
Entre o poder dos blogues e a necessidade de bem produzir uma notícia
A principal peça do Diário de Notícias apresenta a seguinte tese: "Os blogues têm trabalhado a informação sem limites, legais e deontológicos. Podem também agir como vigilantes e censores à informação dos media. Essa capacidade pode vir a transformá-los num novo poder".
Há, pelo menos duas questões em causa. Primeiro, a maioria dos blogues está alojada num servidor privado, a Blogger.com. Se este fechar, muitos dos blogueiros ficam sem endereço e arquivos. A minha interpretação é que isso significa ter pouco poder. Quem é o detentor do que eu escrevo? Eu? A Blogger.com? Os que me lêem e podem fazer copy and paste? A ideia que se tem de espaço público é a de liberdade e a de igualdade de força. Um jornal, que tem uma estrutura empresarial e que tem fontes próprias de receita (publicidade, leitores, uma marca) tem incomparavelmente mais poder quando comparado com um blogue.
Segundo, pode comparar-se o acesso aos media e aos blogues? Aqueles, na sequência do que escrevi atrás, têm força económica e cultural; estes, têm apenas trabalho voluntário ou funcionam como pequenos palanques egocêntricos para os seus autores. O blogue é um espaço muito individualista e não substitui outras formas de mensagens e estruturas electrónicas, como o jornalismo em linha já existente nas estruturas. Quando muito, um blogue será o equivalente às folhas volantes e anónimas de meados do século XVIII ou XIX.
Das seis fontes mencionadas, também consto do grupo - e agradeço ao jornalista que me contactou e me citou correctamente. Na conversa que mantivemos ao telefone, mais ou menos por esta hora mas ontem, eu também lhe falei de anonimato de muitos blogues, o que elimina qualquer credibilidade ao que se diz.
Curiosamente, nessa ocasião, eu estava na Biblioteca Nacional a fazer pesquisa sobre jornalistas de há cerca de um século. E esbarrei com um comentário de Acúrcio Pereira, que chegou a chefe de redacção de O Século. Na altura do acontecimento, ele trabalhava na concorrência, no Diário de Notícias.
Acúrcio Pereira fora encarregado de cobrir a passagem por Lisboa dos reis da Bélgica. Ele escreveu um texto de fundo e encarregou colegas dele de acompanharem os reis durante o percurso. Mas esquecera-se de mandar fazer a reportagem da saída: os reis tomariam o comboio no Rossio em direcção a Espanha, já de noite. A concorrência não se esqueceu: O Século e A Pátria tinham escalado repórteres para o trabalho. Isso obrigou-o a usar a experiência: telefonou ao ministro dos Negócios Estrangeiros, seu amigo de longa data, e procurou saber que declarações finais os reis belgas tinham feito na chegada à fronteira de Portugal com o país vizinho. O que ele publicou no seu jornal foi exactamente o que os outros jornais fizeram. É que os jornalistas da concorrência haviam também acabado de chegar a Lisboa. Concluía Acúrcio Pereira: "o que me favoreceu foi [o desejo dos] meus colegas de meterem o narizito em Espanha. Deviam ter descido no Entroncamento [...] e passar uma comunicação aos seus jornais pelo telégrafo dos Caminhos de Ferro".
Fonte desta informação sobre Acúrcio Pereira: Oliveira, A. Lopes (1997). Nos bastidores do jornalismo. Braga: Compolito - Serviços de Artes Gráficas
Fiquei com esta sensação depois de ler, de manhã, as duas páginas do Diário de Notícias dedicadas à blogosfera. O título não é tão poderoso - "Revolução da blogosfera pode criar um novo poder" - quanto o começo do lead - "A fronteira que distingue blogues e jornalismo é cada vez mais ténue. [...] Os jornalistas estão abrangidos por legislação própria, que não cobre a blogosfera. Assim, poderão os bloguistas [blogueiros] trabalhar dados como se fossem jornalistas?".
A percepção mais profunda do medo que os jornalistas têm da blogosfera foi a dada na infeliz resposta do jornalista (inteligente) Ricardo Costa, director da SIC Notícias, à pergunta sobre se é importante estudar e analisar a blogosfera: "Não perco muito tempo com a blogosfera. A maior parte dos blogues não tem qualquer interesse e os que têm raramente são os que se armam em «jornalismo»".
Todo o aparato do tema do dia do jornal, escrito por Diogo Sousa e Filipe Morais, gira em torno da relação da blogosfera e do jornalismo. Ora, aquela não é sinónima desta. É uma falácia possível dado que a profissão mais escrutinada e falada - depois dos médicos e dos militares e antes dos políticos - é a dos jornalistas. A blogosfera não é concorrente dos media tradicionais. Para não ser parcial, dou o link de um blogue de adolescentes, Destiiny, onde Jasmiine, nascido(a) a 8 de Maio de 1991, e frequentando a escola secundária de Santa Hilda, em Singapura, narra a sua vida diária, desde o levantar-se às 6:00 da manhã até aos deveres da escola e às curtas férias agora em Março. Trata-se de um diário pessoal - de um registo dos acontecimentos. Ora, Jasmiine não tem as características jornalísticas. Um blogue é isso: um diário.
Das seis fontes nomeadas nas peças que ocupam as duas páginas do Diário de Notícias, cinco são jornalistas identificados com os seus meios, exceptuando José Pedro Castanheira. Este, aliás, tem uma posição muito objectiva quanto ao que pensa que os blogues podem ser: "um sistema de vigilância à comunicação social tradicional". Papel que desempenha na perfeição outro dos citados nas peças, João Paulo Meneses, da TSF e animador do blogue Blogouve-se. Apesar de eu compreender a bondade desse papel, se o jornalismo precisa de sistemas de vigilância isso é o fracasso da actividade.
Entre o poder dos blogues e a necessidade de bem produzir uma notícia
A principal peça do Diário de Notícias apresenta a seguinte tese: "Os blogues têm trabalhado a informação sem limites, legais e deontológicos. Podem também agir como vigilantes e censores à informação dos media. Essa capacidade pode vir a transformá-los num novo poder".
Há, pelo menos duas questões em causa. Primeiro, a maioria dos blogues está alojada num servidor privado, a Blogger.com. Se este fechar, muitos dos blogueiros ficam sem endereço e arquivos. A minha interpretação é que isso significa ter pouco poder. Quem é o detentor do que eu escrevo? Eu? A Blogger.com? Os que me lêem e podem fazer copy and paste? A ideia que se tem de espaço público é a de liberdade e a de igualdade de força. Um jornal, que tem uma estrutura empresarial e que tem fontes próprias de receita (publicidade, leitores, uma marca) tem incomparavelmente mais poder quando comparado com um blogue.
Segundo, pode comparar-se o acesso aos media e aos blogues? Aqueles, na sequência do que escrevi atrás, têm força económica e cultural; estes, têm apenas trabalho voluntário ou funcionam como pequenos palanques egocêntricos para os seus autores. O blogue é um espaço muito individualista e não substitui outras formas de mensagens e estruturas electrónicas, como o jornalismo em linha já existente nas estruturas. Quando muito, um blogue será o equivalente às folhas volantes e anónimas de meados do século XVIII ou XIX.
Das seis fontes mencionadas, também consto do grupo - e agradeço ao jornalista que me contactou e me citou correctamente. Na conversa que mantivemos ao telefone, mais ou menos por esta hora mas ontem, eu também lhe falei de anonimato de muitos blogues, o que elimina qualquer credibilidade ao que se diz.
Curiosamente, nessa ocasião, eu estava na Biblioteca Nacional a fazer pesquisa sobre jornalistas de há cerca de um século. E esbarrei com um comentário de Acúrcio Pereira, que chegou a chefe de redacção de O Século. Na altura do acontecimento, ele trabalhava na concorrência, no Diário de Notícias.
Acúrcio Pereira fora encarregado de cobrir a passagem por Lisboa dos reis da Bélgica. Ele escreveu um texto de fundo e encarregou colegas dele de acompanharem os reis durante o percurso. Mas esquecera-se de mandar fazer a reportagem da saída: os reis tomariam o comboio no Rossio em direcção a Espanha, já de noite. A concorrência não se esqueceu: O Século e A Pátria tinham escalado repórteres para o trabalho. Isso obrigou-o a usar a experiência: telefonou ao ministro dos Negócios Estrangeiros, seu amigo de longa data, e procurou saber que declarações finais os reis belgas tinham feito na chegada à fronteira de Portugal com o país vizinho. O que ele publicou no seu jornal foi exactamente o que os outros jornais fizeram. É que os jornalistas da concorrência haviam também acabado de chegar a Lisboa. Concluía Acúrcio Pereira: "o que me favoreceu foi [o desejo dos] meus colegas de meterem o narizito em Espanha. Deviam ter descido no Entroncamento [...] e passar uma comunicação aos seus jornais pelo telégrafo dos Caminhos de Ferro".
Fonte desta informação sobre Acúrcio Pereira: Oliveira, A. Lopes (1997). Nos bastidores do jornalismo. Braga: Compolito - Serviços de Artes Gráficas
Ensaio sobre tipografia
Quando vi o pequeno livro (12,5x18,7) de Eric Gill (1882-1940), Ensaio sobre tipografia, já não o deixei ficar tranquilo na estante da livraria. E pensei logo em cotejá-lo com o escrito por Susana Durão, Oficinas e tipógrafos. Cultura e quotidianos de trabalho [embora este não caiba na presente mensagem].
No começo da nota prévia ao livro de Gill, escrito por João Bicker, lê-se: "A selecção dos textos para esta colecção tem resultado sempre de motivações emocionais. Editamos livros que amamos, autores que admiramos, textos que de alguma forma nos inspiram e influenciam. Assim aconteceu com o texto de Eric Gill". Mais à frente, Bicker anota, a propósito da necessidade de adaptar a edição original ao formato da portuguesa: "pareceu-nos desde logo claro que o uso do Joanna, um dos mais bonitos e menos usados tipos de Gill, era inquestionável. Já o desenho da página teria que ser alterado. [...] a página mantém, contudo, algumas das suas características mais relevantes: tipo, corpo e entrelinhamento, relação com as margens, inserção e legendagem das imagens, cabeças e numeração das páginas". A aproximação ao original justificaria o uso frequente do "&" e do "".
Nascido em Brighton (Inglaterra), desde cedo demonstrou uma inclinação para o desenho, vindo a frequentar a Central School of Arts & Crafts de Londres e, mais tarde, o Westminster Technical Institute, onde estudou gravura e lettering. Escreveu muito sobre arte, religião, política e vestuário, indica Luís Ferreira na introdução. Criou tipos (11, embora apenas um tenha o seu nome: Gill Sans) e foi designer tipográfico. O seu tipo Joanna, nome de uma das filhas, seria o usado no livro Ensaio sobre tipografia
Escreve Eric Gill: "temos uma tradição de escrita à mão que parece dar pouca, ou nenhuma, atenção à letra impressa ou pintada [...]. A caligrafia de juízes, advogados, eclesiásticos e outros, continuaram no seu calmo percurso, sem qualquer sinal aparente de serem influenciados por aquilo que pudesse ser a moda do seu tempo" (p. 84). Logo depois, Gill estabelece uma comparação entre a escrita à mão e a impressão de placa de cobre. A moderna escrita à mão pode "sê-lo através da aplicação de um bom conhecimento da técnica de caligrafia a um conhecimento de boa impressão, & não pelo ressuscitar da caligrafia medieval" (p. 83).
O autor releva a importância das letras romanas, que "se fixaram num tipo definitivo cerca do primeiro século d.c. Embora, ao longo dos séculos, tenham sido feitas inúmeras variações de pormenor, as letras romanas, no essencial, não se alteraram. Quatrocentos anos depois do talhe da inscrição de Trajano, fizeram-se as inscrições na placa da capela de Henrique VII, e nenhum romano iria encontrar qualquer dificuldade em ler as letras" (p. 50) [na imagem seguinte, retirada do sítio Identifont>, vêem-se as letras do tipo Joanna, desenhadas por Gill].
O conflito entre métodos antigos de escrita e o industrialismo, ainda salientados por Gill, chegou ao fim. Escreve ainda o mesmo autor (2003: 157-158): ""No estado actual das coisas, a caligrafia foi estragada, porque toda a gente é obrigada a garatujar. Só se usa a caligrafia, hoje, na comunicação pessoal entre amigos, e, apesar de todas as melhorias & baixas nos preços das máquinas de escrever, as pessoas terão sempre necessidade de comunicar pela escrita à mão". Mas, o uso do computador relega cada vez mais a escrita manual para o dedilhar das teclas. Perde-se individualidade e identidade própria e ganha-se em uniformidade. As letras escritas à mão degradam-se, como as parcelas de texto escritas por mim com um intervalo de 17 anos (1988-2005). Claro que fica o lettering dos livros, da publicidade e também da internet e dos blogues.
Leitura: Eric Gill (2003). Ensaio sobre tipografia. Coimbra: Almedina. 163 páginas, €13,50.
No começo da nota prévia ao livro de Gill, escrito por João Bicker, lê-se: "A selecção dos textos para esta colecção tem resultado sempre de motivações emocionais. Editamos livros que amamos, autores que admiramos, textos que de alguma forma nos inspiram e influenciam. Assim aconteceu com o texto de Eric Gill". Mais à frente, Bicker anota, a propósito da necessidade de adaptar a edição original ao formato da portuguesa: "pareceu-nos desde logo claro que o uso do Joanna, um dos mais bonitos e menos usados tipos de Gill, era inquestionável. Já o desenho da página teria que ser alterado. [...] a página mantém, contudo, algumas das suas características mais relevantes: tipo, corpo e entrelinhamento, relação com as margens, inserção e legendagem das imagens, cabeças e numeração das páginas". A aproximação ao original justificaria o uso frequente do "&" e do "".
Nascido em Brighton (Inglaterra), desde cedo demonstrou uma inclinação para o desenho, vindo a frequentar a Central School of Arts & Crafts de Londres e, mais tarde, o Westminster Technical Institute, onde estudou gravura e lettering. Escreveu muito sobre arte, religião, política e vestuário, indica Luís Ferreira na introdução. Criou tipos (11, embora apenas um tenha o seu nome: Gill Sans) e foi designer tipográfico. O seu tipo Joanna, nome de uma das filhas, seria o usado no livro Ensaio sobre tipografia
Escreve Eric Gill: "temos uma tradição de escrita à mão que parece dar pouca, ou nenhuma, atenção à letra impressa ou pintada [...]. A caligrafia de juízes, advogados, eclesiásticos e outros, continuaram no seu calmo percurso, sem qualquer sinal aparente de serem influenciados por aquilo que pudesse ser a moda do seu tempo" (p. 84). Logo depois, Gill estabelece uma comparação entre a escrita à mão e a impressão de placa de cobre. A moderna escrita à mão pode "sê-lo através da aplicação de um bom conhecimento da técnica de caligrafia a um conhecimento de boa impressão, & não pelo ressuscitar da caligrafia medieval" (p. 83).
O autor releva a importância das letras romanas, que "se fixaram num tipo definitivo cerca do primeiro século d.c. Embora, ao longo dos séculos, tenham sido feitas inúmeras variações de pormenor, as letras romanas, no essencial, não se alteraram. Quatrocentos anos depois do talhe da inscrição de Trajano, fizeram-se as inscrições na placa da capela de Henrique VII, e nenhum romano iria encontrar qualquer dificuldade em ler as letras" (p. 50) [na imagem seguinte, retirada do sítio Identifont>, vêem-se as letras do tipo Joanna, desenhadas por Gill].
O conflito entre métodos antigos de escrita e o industrialismo, ainda salientados por Gill, chegou ao fim. Escreve ainda o mesmo autor (2003: 157-158): ""No estado actual das coisas, a caligrafia foi estragada, porque toda a gente é obrigada a garatujar. Só se usa a caligrafia, hoje, na comunicação pessoal entre amigos, e, apesar de todas as melhorias & baixas nos preços das máquinas de escrever, as pessoas terão sempre necessidade de comunicar pela escrita à mão". Mas, o uso do computador relega cada vez mais a escrita manual para o dedilhar das teclas. Perde-se individualidade e identidade própria e ganha-se em uniformidade. As letras escritas à mão degradam-se, como as parcelas de texto escritas por mim com um intervalo de 17 anos (1988-2005). Claro que fica o lettering dos livros, da publicidade e também da internet e dos blogues.
Leitura: Eric Gill (2003). Ensaio sobre tipografia. Coimbra: Almedina. 163 páginas, €13,50.
segunda-feira, 28 de março de 2005
AS ONDAS MÉDIAS DA RÁDIO, DE NOVO
O blogue Media Network Weblog traz hoje mais informações sobre ondas médias. Agora a propósito de Ruud Poeze, "que tem licenças de frequências em ondas médias na Holanda, começando a activá-las com transmissores de baixa potência, com testes de sinais". Tal demonstração visa mostrar à entidade regulamentadora das comunicações daquele país que as frequências estão "em uso". Andy, animador da Rádio Netherlands (serviço internacional holandês da BBC) e do blogue acima referido, escreve sobre os pequenos transmissores (15 watts) ligados a antenas L invertidas activados nas frequências de 1584 kHz (Utrecht) e 1557 kHz (Amsterdão). O transmissor de Amsterdão começou a operar sábado em regime de teste com um sinal de mil hertz. Em Naarden, onde vive o editor do Media Network Weblog, a 25 quilómetros da capital holandesa, o sinal chegou audível. Nos comentários à mensagem, Noel Green escreve: "Ouvi tocar «música contemporânea adulta» em [frequência] 1395 por volta das 6:30 da manhã - e ainda estou a ouvir às 10:30... Mas não há identificação".
Parece haver uma grande excitação em volta das ondas médias da rádio para aquelas bandas da Europa. E, felizmente, não se trata de investigação histórica. Eu, por aqui, ouço a escolha da Inês Forjaz em termos da música em língua portuguesa, na Antena 2, mas em FM. Aproveito a ocasião para fazer uma saudação aos blogues A Rádio em Portugal, de Jorge Guimarães Silva, e NetFM, de Paula Cordeiro, por também terem destacado a anterior mensagem que eu colocara aqui, a 23 deste mês, apoiando-me na informação do blogue Media Network Weblog.
O blogue Media Network Weblog traz hoje mais informações sobre ondas médias. Agora a propósito de Ruud Poeze, "que tem licenças de frequências em ondas médias na Holanda, começando a activá-las com transmissores de baixa potência, com testes de sinais". Tal demonstração visa mostrar à entidade regulamentadora das comunicações daquele país que as frequências estão "em uso". Andy, animador da Rádio Netherlands (serviço internacional holandês da BBC) e do blogue acima referido, escreve sobre os pequenos transmissores (15 watts) ligados a antenas L invertidas activados nas frequências de 1584 kHz (Utrecht) e 1557 kHz (Amsterdão). O transmissor de Amsterdão começou a operar sábado em regime de teste com um sinal de mil hertz. Em Naarden, onde vive o editor do Media Network Weblog, a 25 quilómetros da capital holandesa, o sinal chegou audível. Nos comentários à mensagem, Noel Green escreve: "Ouvi tocar «música contemporânea adulta» em [frequência] 1395 por volta das 6:30 da manhã - e ainda estou a ouvir às 10:30... Mas não há identificação".
Parece haver uma grande excitação em volta das ondas médias da rádio para aquelas bandas da Europa. E, felizmente, não se trata de investigação histórica. Eu, por aqui, ouço a escolha da Inês Forjaz em termos da música em língua portuguesa, na Antena 2, mas em FM. Aproveito a ocasião para fazer uma saudação aos blogues A Rádio em Portugal, de Jorge Guimarães Silva, e NetFM, de Paula Cordeiro, por também terem destacado a anterior mensagem que eu colocara aqui, a 23 deste mês, apoiando-me na informação do blogue Media Network Weblog.
BLOGUES: A EXPERIÊNCIA PORTUGUESA SEGUNDO HUGO NEVES DA SILVA
Os blogues, que existem há pouco mais de sete anos, passaram de um fenómeno passageiro para objecto de estudo, como constatou Hugo Neves da Silva em trabalho de módulo do mestrado em Ciências da Comunicação (Universidade Católica), e disponível na totalidade no seu blogue lisbonlab.
Investigação empírica
O autor do estudo optou por consultar a página blogómetro do sítio o Weblog.com.pt, que "apresenta a lista dos blogues mais visitada no dia anterior". Ele constituiu como amostra a selecção dos cem blogues mais visitados no dia 19 de Janeiro de 2005, a quem enviou um questionário. Obteve 99 respostas ao questionário (99%).
Das respostas, concluiu que 26,3% dos blogues foram criados em 2004 e 41,4% em 2003. Em termos de classificação, 20,2% dos blogues não são classificados em nenhuma categoria particular, mas 14,1% tem uma orientação pessoal, 9,1% pertencem à categoria de humor, 7,1% a política e 5,1% simultaneamente a comentários e sexo. Quanto a actualização, a esmagadora maioria dos blogueiros (85,9%) afirma escrever nos seus blogues pelo menos uma vez por dia, sendo que 26,3% afirma executá-lo várias vezes por dia. A maioria dos blogueiros (76,8%) gasta mais de 30 minutos por dia para as actualizações do seu blogue, enquanto 27,3% afirma precisar de uma hora diária, 14,1% entre uma hora e 2 horas e 5,1% mais de 2 horas.
Uma das principais características dos blogues é permitirem que os seus leitores escrevam comentários. Questionados sobre a frequência com que lêem os comentários introduzidos nos seus blogues, 89,9% dos seus editores afirmam lerem-nos diariamente, sendo que 44,4% o fazem várias vezes por dia. Se 10,1% dos blogueiros não respondem aos comentários colocados nos seus posts, 37,4% afirmam responder ocasionalmente, 31,3% frequentemente e 18,2% respondem a todos os comentários colocados. Por outro lado, tendo em conta o espírito de comunidade dos blogues, 97% dos blogueiros apresentam-se como leitores assíduos de outros blogues, sendo que 79,8% afirma comentar posts de outros blogues. Nesta perspectiva, a maioria dos blogueiros (64%) despendem mais de uma hora nas leituras e possíveis comentários a outros blogues.
Segundo os resultados deste estudo, 76% dos blogueiros consideram os blogues generalistas e apenas 24% os consideram temáticos. Quanto a blogues preferidos por cada um dos editores desta forma nova de comunicação, elencaram Blasfémias, Blogotinha, Gato fedorento, Terceiro anel, Os tempos que correm e Webcedário.
A maioria dos participantes neste estudo é blogueiro há pelo menos 1 ano e 28,3% há pelo menos 2 anos. Relativamente à causa que os levou a iniciarem-se nestas lides, 44,4% dos blogueiros apontam os amigos e 18,2% a leitura de jornais, sendo que 31,3% não se identifica com as causas referenciadas neste estudo, afirmando ter sido outra a causa para terem começado a blogar. Apesar de 41,4% dos blogueiros indicarem apenas participar como editor num blogue, a maioria (57,6%) é editor de no mínimo 2 blogues, sendo que 27,3% afirma participar em 2 blogues, 19,2% em 3 blogues, 2% em 4 blogues, 5,1% em 5 e 4% em mais do que 5 blogues. A esmagadora maioria dos blogueiros, 92,9% considera que os blogues não são um fenómeno passageiro, mas algo que veio para ficar por muitos e longos anos.
Os blogues, que existem há pouco mais de sete anos, passaram de um fenómeno passageiro para objecto de estudo, como constatou Hugo Neves da Silva em trabalho de módulo do mestrado em Ciências da Comunicação (Universidade Católica), e disponível na totalidade no seu blogue lisbonlab.
Investigação empírica
O autor do estudo optou por consultar a página blogómetro do sítio o Weblog.com.pt, que "apresenta a lista dos blogues mais visitada no dia anterior". Ele constituiu como amostra a selecção dos cem blogues mais visitados no dia 19 de Janeiro de 2005, a quem enviou um questionário. Obteve 99 respostas ao questionário (99%).
Das respostas, concluiu que 26,3% dos blogues foram criados em 2004 e 41,4% em 2003. Em termos de classificação, 20,2% dos blogues não são classificados em nenhuma categoria particular, mas 14,1% tem uma orientação pessoal, 9,1% pertencem à categoria de humor, 7,1% a política e 5,1% simultaneamente a comentários e sexo. Quanto a actualização, a esmagadora maioria dos blogueiros (85,9%) afirma escrever nos seus blogues pelo menos uma vez por dia, sendo que 26,3% afirma executá-lo várias vezes por dia. A maioria dos blogueiros (76,8%) gasta mais de 30 minutos por dia para as actualizações do seu blogue, enquanto 27,3% afirma precisar de uma hora diária, 14,1% entre uma hora e 2 horas e 5,1% mais de 2 horas.
Uma das principais características dos blogues é permitirem que os seus leitores escrevam comentários. Questionados sobre a frequência com que lêem os comentários introduzidos nos seus blogues, 89,9% dos seus editores afirmam lerem-nos diariamente, sendo que 44,4% o fazem várias vezes por dia. Se 10,1% dos blogueiros não respondem aos comentários colocados nos seus posts, 37,4% afirmam responder ocasionalmente, 31,3% frequentemente e 18,2% respondem a todos os comentários colocados. Por outro lado, tendo em conta o espírito de comunidade dos blogues, 97% dos blogueiros apresentam-se como leitores assíduos de outros blogues, sendo que 79,8% afirma comentar posts de outros blogues. Nesta perspectiva, a maioria dos blogueiros (64%) despendem mais de uma hora nas leituras e possíveis comentários a outros blogues.
Segundo os resultados deste estudo, 76% dos blogueiros consideram os blogues generalistas e apenas 24% os consideram temáticos. Quanto a blogues preferidos por cada um dos editores desta forma nova de comunicação, elencaram Blasfémias, Blogotinha, Gato fedorento, Terceiro anel, Os tempos que correm e Webcedário.
A maioria dos participantes neste estudo é blogueiro há pelo menos 1 ano e 28,3% há pelo menos 2 anos. Relativamente à causa que os levou a iniciarem-se nestas lides, 44,4% dos blogueiros apontam os amigos e 18,2% a leitura de jornais, sendo que 31,3% não se identifica com as causas referenciadas neste estudo, afirmando ter sido outra a causa para terem começado a blogar. Apesar de 41,4% dos blogueiros indicarem apenas participar como editor num blogue, a maioria (57,6%) é editor de no mínimo 2 blogues, sendo que 27,3% afirma participar em 2 blogues, 19,2% em 3 blogues, 2% em 4 blogues, 5,1% em 5 e 4% em mais do que 5 blogues. A esmagadora maioria dos blogueiros, 92,9% considera que os blogues não são um fenómeno passageiro, mas algo que veio para ficar por muitos e longos anos.
GOODBYE DRAGON INN
É a última sessão num velho cinema de Taiwan. O jovem que entra encontra a sala quase vazia. Mas, por vezes, vêem-se pessoas (ou serão fantasmas?): um jovem casal que come algo ruidosamente, uma rapariga que tira os sapatos, espectadores que fumam, alguns velhos, uma criança. Elas mudam de sítio ou deambulam pelo edifício do cinema. A história anda também à volta de dois empregados do cinema, a arrumadora e o projeccionista. Ela aproxima-se da cabina de projecção, mas não o encontra, como sempre. Deixa-lhe parte da sua refeição, após o que deambula pelo edifício labiríntico do cinema. No ecrã, passa um filme realizado 36 anos antes, Dragon Inn, cuja acção lembra o kung-fu e os filmes de artes guerreiras antigas no Oriente [imagens retiradas do sítio WELLSPRING].
Nascido na Malásia, o realizador do filme, Tsai Ming-Liang, instalou-se em Taiwan no ano de 1977. Em 1981, concluia um grau universitário de arte dramática na Universidade de Cultura Chinesa. Tornou-se autor de teatro e trabalhou para a televisão (telefilmes).
Os trabalhos deste mestre de geometria, como lhe chamou A. O. Scott, o crítico de cinema do New York Times, andam à volta da sociedade actual, da solidão e dos estilos de vida urbana frenética. Mas a mim parece-me mais do que isso.Tsai Ming-Liang usa igualmente a harmonia nos enquadramentos, as sombras das personagens projectadas no chão, o som da queda dos pingos da água dentro de baldes, o andar da arrumadora, que coxeia, em especial quando ela sobre uma escada metálica, produzindo sons diferentes consoante o pé. Os diálogos são raríssimos e não têm uma sequência na acção - a palavra é menos importante que a imagem (quase sempre com câmara parada, em posição semelhante à de um espectador numa sala) e o som dos movimentos das personagens, mostrando a alienação e o tédio da vida urbana.
Há uma homenagem aos actores e actrizes que caem no esquecimento e aos cinemas que morrem. O espectador que chora é Tien Miao, actor do filme em exibição dentro do filme, Dragon Inn. Na minha história pessoal, lembro-me de desaparecerem salas onde formei e apurei o meu conhecimento cinematográfico, como o Trindade, no Porto, e o Mundial, em Lisboa.
É a última sessão num velho cinema de Taiwan. O jovem que entra encontra a sala quase vazia. Mas, por vezes, vêem-se pessoas (ou serão fantasmas?): um jovem casal que come algo ruidosamente, uma rapariga que tira os sapatos, espectadores que fumam, alguns velhos, uma criança. Elas mudam de sítio ou deambulam pelo edifício do cinema. A história anda também à volta de dois empregados do cinema, a arrumadora e o projeccionista. Ela aproxima-se da cabina de projecção, mas não o encontra, como sempre. Deixa-lhe parte da sua refeição, após o que deambula pelo edifício labiríntico do cinema. No ecrã, passa um filme realizado 36 anos antes, Dragon Inn, cuja acção lembra o kung-fu e os filmes de artes guerreiras antigas no Oriente [imagens retiradas do sítio WELLSPRING].
Nascido na Malásia, o realizador do filme, Tsai Ming-Liang, instalou-se em Taiwan no ano de 1977. Em 1981, concluia um grau universitário de arte dramática na Universidade de Cultura Chinesa. Tornou-se autor de teatro e trabalhou para a televisão (telefilmes).
Os trabalhos deste mestre de geometria, como lhe chamou A. O. Scott, o crítico de cinema do New York Times, andam à volta da sociedade actual, da solidão e dos estilos de vida urbana frenética. Mas a mim parece-me mais do que isso.Tsai Ming-Liang usa igualmente a harmonia nos enquadramentos, as sombras das personagens projectadas no chão, o som da queda dos pingos da água dentro de baldes, o andar da arrumadora, que coxeia, em especial quando ela sobre uma escada metálica, produzindo sons diferentes consoante o pé. Os diálogos são raríssimos e não têm uma sequência na acção - a palavra é menos importante que a imagem (quase sempre com câmara parada, em posição semelhante à de um espectador numa sala) e o som dos movimentos das personagens, mostrando a alienação e o tédio da vida urbana.
Há uma homenagem aos actores e actrizes que caem no esquecimento e aos cinemas que morrem. O espectador que chora é Tien Miao, actor do filme em exibição dentro do filme, Dragon Inn. Na minha história pessoal, lembro-me de desaparecerem salas onde formei e apurei o meu conhecimento cinematográfico, como o Trindade, no Porto, e o Mundial, em Lisboa.
LEITURAS E APONTAMENTOS
Os apontamentos e leituras deste post apontam para questões de educação e moral (videojogos), tecnologias (televisão digital), cultura (CD-ROM do Expresso) e lixo mediático (televisão e blogues).
1) Hillary Clinton e a violência nos videojogos
O Sunday Times de 27 de Março chama a atenção para a violência dos videojogos. Desta feita, aproveita uma condenação feita por Hillary Clinton ao jogo Grand Theft Auto. Segundo a notícia, a antiga primeira dama americana e actual senadora democrata considera que o jogo encoraja os jogadores, em especial as crianças, a "terem relações sexuais com prostitutas e a matá-las depois". Ela entende estar-se perante uma epidemia silenciosa dos media, de perda de sensibilidade para com mulheres, pessoas de etnia diferente ou estrangeiros.
Hillary juntou-se a dois senadores republicanos, os quais querem que se faça uma investigação ao impacto dos media electrónicos nas crianças, em termos de desenvolvimento cognitivo, social, emocional e físico das mesmas. Calcula-se um custo de 90 milhões de dólares. A mulher do antigo presidente Clinton lançou o desafio em simpósio promovido pela Kaiser Family Foundation, que estuda os hábitos de leitura das crianças. A última pesquisa demonstra que o uso diário de jogos vídeo e de computador pelas crianças duplicou desde 1999. Os jogos violentos são os favoritos entre os rapazes.
2) Campanha para a televisão digital terrestre em França
Conforme o Le Monde de 26 de Março, arranca no dia 31 a campanha de publicidade a anunciar o lançamento da televisão digital terrestre (TDT) nesse mesmo dia. A campanha liga o digital (numérico, em francês) a modernidade e simplicidade.
A Leo Burnett-Paris, agência publicitária encarregada da operação, produziu um slogan que diz "a vossa televisão por zero cêntimos por mês", pondo de relevo um ponto forte da TDT: a gratuitidade, com acesso a 14 canais digitais, dos quais oito são novos. Isto significa, para os desenhadores da campanha, que a TDT não é tão só um serviço mas uma nova idade da televisão. Diz o presidente da agência publicitária: "A palavra digital produz uma associação com a fotografia digital; mas, no caso da televisão, apenas um quarto dos telespectadores optou pela oferta digital. Assim, deve falar-se de revolução digital".
3) Expresso - CD-ROM de Abril
Como de costume, filmes, música, espectáculos, livros, exposições, desporto, crianças e videojogos fazem parte do menu do CD-ROM que acompanhou a última edição do Expresso. Da muita oferta cultural, saliento a festa da música, anunciada para o CCB (22 a 24 de Abril, em torno de Beethoven e os seus amigos) e a exposição da colecção Berardo, no mesmo CCB.
Nota não muito agradável: não se consegue saltar a publicidade da Optimus, quando se acede ao CD-ROM.
4) Quinta das celebridades II
Ainda não vi qualquer sessão da nova Quinta das celebridades, mas tenciono passar pelo programa da TVI. Enquanto não faço o trabalho de casa, faço minhas as palavras de Carla Hilário Quevedo que escreve com a elegância do costume sobre o programa (Expresso, 25 de Março):
"Participam Elsa Raposo, Lili Caneças, Capitão Roby, um actor, outro actor, um cantor, uma engenheira alimentar, Rute Marques, Arlinda Mestre, uma rapariga grande, um treinador de futebol e Gonçalo da Câmara Pereira. À medida que o programa avança, vou escolhendo os meus favoritos. Lili, que faz de José Castelo Branco, que por sua vez já fazia de Lili, já ganhou! Meia hora depois, Arlinda Mestre é a minha favorita de sempre e não se fala mais nisso. Só se Elsa Raposo e a «criança grande que tem dentro dela» não participassem. Finalmente, decido: Gonçalo da Câmara Pereira. Não. Talvez José Pedro Vasconcelos, metido no tanque, descalço, a morrer de frio".
Pelas hesitações da também blogueira [bomba inteligente], vejo que estou a perder um grande programa!
Observação: a fotografia nos mupis com o conjunto dos habitantes da quinta é sofrível, para não ser mais radical. Olhando para ela, surge-nos um conjunto de fantasmas, com rostos pálidos e cheios de esgares, apesar dos sorrisos. Pela imagem, o programa não vai divertir mas ser campo de ajuste psicológico de contas com o passado. Uma das revistas que cobre o programa já fala do apoio da filha do "capitão" Roby, que enfrenta uma doença. Ou seja: as publicações cor-de-rosa e das fofocas lideram as narrativas do reality-show-parente-de-novela.
5) Será Lisa Hilton a blogueira de Belle de Jour?
Para o Sunday Times de 27 de Março, parece estar descoberta a identidade da blogueira Belle de Jour, diário de uma suposta prostituta. No começo do seu blogue, a miss de Jour explicara que começara a fazer sexo antes de discutir poesia francesa com o seu amante. Sob as iniciais LH, a autora (?) escrevia que o blogue era um veículo apropriado para falar das suas frustrações em termos pessoais e profissionais. No post de 7 de Março último, aparece uma mensagem de um português (José), que referencia a blogueira como tendo habilitações universitárias, com acento inglês (estudou em Londres há muitos anos) mas vivendo em Nova Iorque. Ora, LH - ou melhor, a escritora Lisa Hilton - tem estas características.
O Sunday Times, jornal que mistura perspectivas conservadoras com algum sensacionalismo, dá destaque ao tema com mais de meia página no seu formato broadsheet, retomando, aliás, notícias de outras semanas. Belle de Jour foi o título de um filme com Catherine Deneuve, que fazia de mulher de família à noite mas mantinha aventuras sexuais durante o dia.
Os apontamentos e leituras deste post apontam para questões de educação e moral (videojogos), tecnologias (televisão digital), cultura (CD-ROM do Expresso) e lixo mediático (televisão e blogues).
1) Hillary Clinton e a violência nos videojogos
O Sunday Times de 27 de Março chama a atenção para a violência dos videojogos. Desta feita, aproveita uma condenação feita por Hillary Clinton ao jogo Grand Theft Auto. Segundo a notícia, a antiga primeira dama americana e actual senadora democrata considera que o jogo encoraja os jogadores, em especial as crianças, a "terem relações sexuais com prostitutas e a matá-las depois". Ela entende estar-se perante uma epidemia silenciosa dos media, de perda de sensibilidade para com mulheres, pessoas de etnia diferente ou estrangeiros.
Hillary juntou-se a dois senadores republicanos, os quais querem que se faça uma investigação ao impacto dos media electrónicos nas crianças, em termos de desenvolvimento cognitivo, social, emocional e físico das mesmas. Calcula-se um custo de 90 milhões de dólares. A mulher do antigo presidente Clinton lançou o desafio em simpósio promovido pela Kaiser Family Foundation, que estuda os hábitos de leitura das crianças. A última pesquisa demonstra que o uso diário de jogos vídeo e de computador pelas crianças duplicou desde 1999. Os jogos violentos são os favoritos entre os rapazes.
2) Campanha para a televisão digital terrestre em França
Conforme o Le Monde de 26 de Março, arranca no dia 31 a campanha de publicidade a anunciar o lançamento da televisão digital terrestre (TDT) nesse mesmo dia. A campanha liga o digital (numérico, em francês) a modernidade e simplicidade.
A Leo Burnett-Paris, agência publicitária encarregada da operação, produziu um slogan que diz "a vossa televisão por zero cêntimos por mês", pondo de relevo um ponto forte da TDT: a gratuitidade, com acesso a 14 canais digitais, dos quais oito são novos. Isto significa, para os desenhadores da campanha, que a TDT não é tão só um serviço mas uma nova idade da televisão. Diz o presidente da agência publicitária: "A palavra digital produz uma associação com a fotografia digital; mas, no caso da televisão, apenas um quarto dos telespectadores optou pela oferta digital. Assim, deve falar-se de revolução digital".
3) Expresso - CD-ROM de Abril
Como de costume, filmes, música, espectáculos, livros, exposições, desporto, crianças e videojogos fazem parte do menu do CD-ROM que acompanhou a última edição do Expresso. Da muita oferta cultural, saliento a festa da música, anunciada para o CCB (22 a 24 de Abril, em torno de Beethoven e os seus amigos) e a exposição da colecção Berardo, no mesmo CCB.
Nota não muito agradável: não se consegue saltar a publicidade da Optimus, quando se acede ao CD-ROM.
4) Quinta das celebridades II
Ainda não vi qualquer sessão da nova Quinta das celebridades, mas tenciono passar pelo programa da TVI. Enquanto não faço o trabalho de casa, faço minhas as palavras de Carla Hilário Quevedo que escreve com a elegância do costume sobre o programa (Expresso, 25 de Março):
"Participam Elsa Raposo, Lili Caneças, Capitão Roby, um actor, outro actor, um cantor, uma engenheira alimentar, Rute Marques, Arlinda Mestre, uma rapariga grande, um treinador de futebol e Gonçalo da Câmara Pereira. À medida que o programa avança, vou escolhendo os meus favoritos. Lili, que faz de José Castelo Branco, que por sua vez já fazia de Lili, já ganhou! Meia hora depois, Arlinda Mestre é a minha favorita de sempre e não se fala mais nisso. Só se Elsa Raposo e a «criança grande que tem dentro dela» não participassem. Finalmente, decido: Gonçalo da Câmara Pereira. Não. Talvez José Pedro Vasconcelos, metido no tanque, descalço, a morrer de frio".
Pelas hesitações da também blogueira [bomba inteligente], vejo que estou a perder um grande programa!
Observação: a fotografia nos mupis com o conjunto dos habitantes da quinta é sofrível, para não ser mais radical. Olhando para ela, surge-nos um conjunto de fantasmas, com rostos pálidos e cheios de esgares, apesar dos sorrisos. Pela imagem, o programa não vai divertir mas ser campo de ajuste psicológico de contas com o passado. Uma das revistas que cobre o programa já fala do apoio da filha do "capitão" Roby, que enfrenta uma doença. Ou seja: as publicações cor-de-rosa e das fofocas lideram as narrativas do reality-show-parente-de-novela.
5) Será Lisa Hilton a blogueira de Belle de Jour?
Para o Sunday Times de 27 de Março, parece estar descoberta a identidade da blogueira Belle de Jour, diário de uma suposta prostituta. No começo do seu blogue, a miss de Jour explicara que começara a fazer sexo antes de discutir poesia francesa com o seu amante. Sob as iniciais LH, a autora (?) escrevia que o blogue era um veículo apropriado para falar das suas frustrações em termos pessoais e profissionais. No post de 7 de Março último, aparece uma mensagem de um português (José), que referencia a blogueira como tendo habilitações universitárias, com acento inglês (estudou em Londres há muitos anos) mas vivendo em Nova Iorque. Ora, LH - ou melhor, a escritora Lisa Hilton - tem estas características.
O Sunday Times, jornal que mistura perspectivas conservadoras com algum sensacionalismo, dá destaque ao tema com mais de meia página no seu formato broadsheet, retomando, aliás, notícias de outras semanas. Belle de Jour foi o título de um filme com Catherine Deneuve, que fazia de mulher de família à noite mas mantinha aventuras sexuais durante o dia.
quinta-feira, 24 de março de 2005
ESCOLA DE JORNALISMO DE COLUMBIA COM UM NOVO GRAU ACADÉMICO
No próximo ano lectivo, a Universidade de Columbia (Nova Iorque) vai oferecer um novo curso, com a duração de um ano. Anunciado hoje, é o primeiro grau académico profissional desde que começou a funcionar o mestrado (master of science) há 70 anos atrás, e a primeira decisão da direcção de Lee C. Bollinger, após a discussão que tem decorrido naquela escola de referência no ensino do jornalismo. O público-alvo são jovens jornalistas, integrados nos níveis intermédios das redacções, e que procurem compreender melhor os temas do século XXI. Há quatro áreas de especialização: jornalismo cultural e das artes, jornalismo económico e de negócios, jornalismo político e jornalismo médico e da ciência.
Fonte: European Journalism Centre.
No próximo ano lectivo, a Universidade de Columbia (Nova Iorque) vai oferecer um novo curso, com a duração de um ano. Anunciado hoje, é o primeiro grau académico profissional desde que começou a funcionar o mestrado (master of science) há 70 anos atrás, e a primeira decisão da direcção de Lee C. Bollinger, após a discussão que tem decorrido naquela escola de referência no ensino do jornalismo. O público-alvo são jovens jornalistas, integrados nos níveis intermédios das redacções, e que procurem compreender melhor os temas do século XXI. Há quatro áreas de especialização: jornalismo cultural e das artes, jornalismo económico e de negócios, jornalismo político e jornalismo médico e da ciência.
Fonte: European Journalism Centre.
ELEMENTOS PARA A HISTÓRIA DA SIC
Eu escrevi um texto sobre a SIC, na altura dos seus dez anos de existência ["Dez anos da história da SIC (1992-2002)". Observatório, 6: 93-105]. Agora, sirvo-me de texto de um aluno de mestrado de Ciências da Comunicação da Universidade Católica para o recente módulo de "Media, Públicos e Audiências" [irei editar mais sínteses de outros trabalhos]. Trata-se do texto de Luís Manuel Lourenço, intitulado SIC - como se constrói um líder.
Jornalista, Luís Lourenço integrou a SIC no seu primeiro ano e meio de existência (foi também um dos fundadores da TSF); por isso, tem uma memória directa [curiosamente, ele desenvolveu o tema a partir de um desafio meu, com ele a não concordar com a perspectiva que apresentei em aula sobre a evolução da televisão no nosso país. O autor do trabalho, eu e, agora, os leitores do blogue ficamos mais ricos com a sua pesquisa].
Desde o começo das emissões da SIC que se acreditava em que o canal seria o mais visto pelos portugueses "se o formato da nova televisão fosse generalista mas com uma aposta forte na «informação» que deveria ser [...] ao estilo da TSF. Nas diversas reuniões preparatórias, das quais participámos, foi defendido por Emídio Rangel que assim deveria ser com o argumento de que «o modelo informativo que serviu para a TSF poderia, se devidamente ajustado, servir para a SIC»" [imagem retirada a 22 de Março de 2005 do sítio da SIC, publicitando o noticiário das 13:00 apresentado por Bento Rodrigues].
Como a SIC progrediu nas audiências: informação, telenovelas brasileiras e primeira geração de telelixo
Não existem registos de audiometria nos primeiros três meses de vida da estação de Pinto Balsemão: os valores das audiências deveriam ser ridículos. Dos constrangimentos da época de arranque, Luís Lourenço referencia: 1) negado acesso a programas de grande audiência, como a fórmula 1 e o futebol , 2) recessão económica em 1992, 3) impossibilidade de emitir 24 horas diárias (começava a emissão às 17:00), 4) apenas 50% da população nacional acedeu teoricamente ao sinal do canal no arranque deste; três meses depois, o número já subia para 70%.
No início de 1993, o share da SIC era apenas 10%, fatia magríssima quando comparada com a da RTP2 (20%) e a RTP1 (uns esmagadores 70%). A televisão pública, prevendo a chegada da concorrência, preparara-se bem, "nomeadamente no mercado dos conteúdos onde escolheu o que muito bem quis, deixando as sobras para os outros. Por outro lado, a capacidade financeira da SIC era demasiado reduzida para poder investir na produção própria e restava-lhe, desta forma, apostar na informação" (depoimento registado por Luís Lourenço e identificado no seu trabalho). A informação era primeira marca da SIC, possibilitando "abrir «especiais» a qualquer hora e levá-los por diante durante uma noite inteira se tal se justificasse e anulando, assim, toda a programação agendada". A par disto, a estação tinha diversos programas de entrevista e grande reportagem.
No horário pós 21:30 o domínio da RTP não era tão vincado, conforme se escreve no texto que venho a citar: "depois da análise das audiometrias chegou-se à conclusão que havia uma apetência, por parte do público, à programação falada na nossa língua. Introduzimos, assim, programas como Minas e armadilhas e Labirinto e também alguns concursos e talk shows, todos ligados por essa linha orientadora que era a produção nacional" (depoimento registado por Luís Lourenço e identificado no seu trabalho).
Já no segundo semestre de 1993, a SIC lançaria dois programas de forte impacto - Chuva de estrelas, apresentado por Catarina Furtado, e Ora bolas Marina, com a actriz Marina Mota. O ano acabaria com um share de 23%, quando em Abril estava nos 10%. Contudo, a SIC estava longe de pôr em causa a primazia da RTP, pois, dos vinte principais programas emitidos em 1993, todos pertenciam ao canal público, como se pode vislumbrar no quadro ao lado.
A segunda linha de ataque da SIC seria a das telenovelas brasileiras. A Globo, a maior produtora de novelas do mundo, era accionista da SIC. Em meses, desfez o contrato com a RTP (Agosto de 1994) e fez um outro com a SIC. A audiência fiel a este género acompanharia a transferência para o novo canal. A estação privada fizera um estudo de mercado e descobrira as fragilidades da concorrência: "o binómio noticiário e novela Globo (produtos preferidos pelo auditório português) era de tal forma forte que dissuadia qualquer investimento especial nesse período" (depoimento registado por Luís Lourenço e identificado no seu trabalho).
Em Fevereiro de 1994, arrancava a novela Mulheres de areia, escrita por Ivani Ribeiro, então um sucesso no prime time da Globo, e que também teria êxito em Portugal [imagem retirada do sítio da Globo]. A RTP deixava de controlar o bloco forte e ganhador do horário nobre.
A terceira componente da ascensão da SIC foi a primeira geração de telelixo. A seguir à novela da Globo vinham programas como Perdoa-me, All you need is love e Cenas de um casamento, alargando-se o período nobre das 20:00 até à meia-noite. Aqui telelixo entende-se como constituído por "programas de fraca qualidade intelectual, que explora a debilidade ou fragilidade humana mas que levam a enormes audiências" (depoimento registado por Luís Lourenço e identificado no seu trabalho). Mas também eram lançados programas polémicos como os Donos da bola, inicialmente com Nuno Santos e depois com David Borges, os juvenis Buéréré e Muita Lôco e produção própria como Malucos do riso, Noite da má língua ou Máquina da verdade [a segunda geração de telelixo seria marcada com Acorrentados ou Big Brother e Quinta das celebridades, estes dois últimos na TVI].
Em Maio de 1995, a SIC alcançava 40,3% de share contra 39,1% da RTP. Nascia a nova estrela da televisão portuguesa.
Eu escrevi um texto sobre a SIC, na altura dos seus dez anos de existência ["Dez anos da história da SIC (1992-2002)". Observatório, 6: 93-105]. Agora, sirvo-me de texto de um aluno de mestrado de Ciências da Comunicação da Universidade Católica para o recente módulo de "Media, Públicos e Audiências" [irei editar mais sínteses de outros trabalhos]. Trata-se do texto de Luís Manuel Lourenço, intitulado SIC - como se constrói um líder.
Jornalista, Luís Lourenço integrou a SIC no seu primeiro ano e meio de existência (foi também um dos fundadores da TSF); por isso, tem uma memória directa [curiosamente, ele desenvolveu o tema a partir de um desafio meu, com ele a não concordar com a perspectiva que apresentei em aula sobre a evolução da televisão no nosso país. O autor do trabalho, eu e, agora, os leitores do blogue ficamos mais ricos com a sua pesquisa].
Desde o começo das emissões da SIC que se acreditava em que o canal seria o mais visto pelos portugueses "se o formato da nova televisão fosse generalista mas com uma aposta forte na «informação» que deveria ser [...] ao estilo da TSF. Nas diversas reuniões preparatórias, das quais participámos, foi defendido por Emídio Rangel que assim deveria ser com o argumento de que «o modelo informativo que serviu para a TSF poderia, se devidamente ajustado, servir para a SIC»" [imagem retirada a 22 de Março de 2005 do sítio da SIC, publicitando o noticiário das 13:00 apresentado por Bento Rodrigues].
Como a SIC progrediu nas audiências: informação, telenovelas brasileiras e primeira geração de telelixo
Não existem registos de audiometria nos primeiros três meses de vida da estação de Pinto Balsemão: os valores das audiências deveriam ser ridículos. Dos constrangimentos da época de arranque, Luís Lourenço referencia: 1) negado acesso a programas de grande audiência, como a fórmula 1 e o futebol , 2) recessão económica em 1992, 3) impossibilidade de emitir 24 horas diárias (começava a emissão às 17:00), 4) apenas 50% da população nacional acedeu teoricamente ao sinal do canal no arranque deste; três meses depois, o número já subia para 70%.
No início de 1993, o share da SIC era apenas 10%, fatia magríssima quando comparada com a da RTP2 (20%) e a RTP1 (uns esmagadores 70%). A televisão pública, prevendo a chegada da concorrência, preparara-se bem, "nomeadamente no mercado dos conteúdos onde escolheu o que muito bem quis, deixando as sobras para os outros. Por outro lado, a capacidade financeira da SIC era demasiado reduzida para poder investir na produção própria e restava-lhe, desta forma, apostar na informação" (depoimento registado por Luís Lourenço e identificado no seu trabalho). A informação era primeira marca da SIC, possibilitando "abrir «especiais» a qualquer hora e levá-los por diante durante uma noite inteira se tal se justificasse e anulando, assim, toda a programação agendada". A par disto, a estação tinha diversos programas de entrevista e grande reportagem.
No horário pós 21:30 o domínio da RTP não era tão vincado, conforme se escreve no texto que venho a citar: "depois da análise das audiometrias chegou-se à conclusão que havia uma apetência, por parte do público, à programação falada na nossa língua. Introduzimos, assim, programas como Minas e armadilhas e Labirinto e também alguns concursos e talk shows, todos ligados por essa linha orientadora que era a produção nacional" (depoimento registado por Luís Lourenço e identificado no seu trabalho).
Já no segundo semestre de 1993, a SIC lançaria dois programas de forte impacto - Chuva de estrelas, apresentado por Catarina Furtado, e Ora bolas Marina, com a actriz Marina Mota. O ano acabaria com um share de 23%, quando em Abril estava nos 10%. Contudo, a SIC estava longe de pôr em causa a primazia da RTP, pois, dos vinte principais programas emitidos em 1993, todos pertenciam ao canal público, como se pode vislumbrar no quadro ao lado.
A segunda linha de ataque da SIC seria a das telenovelas brasileiras. A Globo, a maior produtora de novelas do mundo, era accionista da SIC. Em meses, desfez o contrato com a RTP (Agosto de 1994) e fez um outro com a SIC. A audiência fiel a este género acompanharia a transferência para o novo canal. A estação privada fizera um estudo de mercado e descobrira as fragilidades da concorrência: "o binómio noticiário e novela Globo (produtos preferidos pelo auditório português) era de tal forma forte que dissuadia qualquer investimento especial nesse período" (depoimento registado por Luís Lourenço e identificado no seu trabalho).
Em Fevereiro de 1994, arrancava a novela Mulheres de areia, escrita por Ivani Ribeiro, então um sucesso no prime time da Globo, e que também teria êxito em Portugal [imagem retirada do sítio da Globo]. A RTP deixava de controlar o bloco forte e ganhador do horário nobre.
A terceira componente da ascensão da SIC foi a primeira geração de telelixo. A seguir à novela da Globo vinham programas como Perdoa-me, All you need is love e Cenas de um casamento, alargando-se o período nobre das 20:00 até à meia-noite. Aqui telelixo entende-se como constituído por "programas de fraca qualidade intelectual, que explora a debilidade ou fragilidade humana mas que levam a enormes audiências" (depoimento registado por Luís Lourenço e identificado no seu trabalho). Mas também eram lançados programas polémicos como os Donos da bola, inicialmente com Nuno Santos e depois com David Borges, os juvenis Buéréré e Muita Lôco e produção própria como Malucos do riso, Noite da má língua ou Máquina da verdade [a segunda geração de telelixo seria marcada com Acorrentados ou Big Brother e Quinta das celebridades, estes dois últimos na TVI].
Em Maio de 1995, a SIC alcançava 40,3% de share contra 39,1% da RTP. Nascia a nova estrela da televisão portuguesa.
quarta-feira, 23 de março de 2005
VOZ DA RÚSSIA EM ONDAS MÉDIAS A PARTIR DA ALEMANHA
Segundo o blogue Media Network Weblog, um emissor alemão de ondas médias transmitirá a Voz da Rússia (Voice of Russia). O emissor de ondas médias de 200 kW, perto de Braunschweig, vai transmitir na frequência de 630 kHZ, em alemão, russo e inglês. Anteriormente, a frequência fora usada pela estação comercial Megaradio, que fechou em 2003.
O período de licença é por dois anos, pois a proprietária da estação, a Niedersachsen, quer usar a frequência para transmissões em DRM, o que prova que as frequências de ondas médias irão ser revitalizadas. E, em Portugal, o que vamos fazer?
Segundo o blogue Media Network Weblog, um emissor alemão de ondas médias transmitirá a Voz da Rússia (Voice of Russia). O emissor de ondas médias de 200 kW, perto de Braunschweig, vai transmitir na frequência de 630 kHZ, em alemão, russo e inglês. Anteriormente, a frequência fora usada pela estação comercial Megaradio, que fechou em 2003.
O período de licença é por dois anos, pois a proprietária da estação, a Niedersachsen, quer usar a frequência para transmissões em DRM, o que prova que as frequências de ondas médias irão ser revitalizadas. E, em Portugal, o que vamos fazer?
SOBRE A TELEVISÃO DIGITAL
O texto de Gema Alcolea, saído em 2003, já está datado. O centro da sua pesquisa é a televisão digital em Espanha, nas vertentes de satélite e terrestre, sabendo-se que esta se alterou profundamente em 2004, com a falência da plataforma digital, ela que já fora assunto para fusão de duas anteriores.
Fica, contudo, um trabalho de levantamento do sector, para além da constituição das plataformas. Estratégias, promoção, produção audiovisul, estruturas económicas e financeiras e respostas dos utilizadores servem como elementos comparativos para uma análise futura. E também a origem da televisão - e da televisão digital - tema que me ocupo neste post.
O começo das experiências e das emissões analógicas
Escreve Gema Alcolea (2003: 13) que se pode estudar a história da televisão a partir de diversos níveis: 1) referência ao seu processo evolutivo, 2) transformações nos conteúdos televisivos, 3) mudanças nas formas de programação, e 4) desenvolvimento das modalidades de acesso. A perspectiva de Alcolea é a dos avanços tecnológicos na transmissão de sinais.
Há curiosidades a destacar no começo do que se chamaria televisão. Assim, o sistema chamado fonovisão era bidireccional, transmitindo uma forma combinada de imagem e som entre emissor e receptor, como hoje temos no videotelefone. Por detrás deste sistema estavam as companhias telefónicas norte-americanas. Também houve experiências na Alemanha, em 1936, entre Berlim e Leipzig. Como o processo de transmissão se fazia por cabo e necessitava de grandes investimentos, foi abandonado e substituído pelo ainda existente modelo unidireccional de radiodifusão [broadcasting], por meio de ondas hertzianas e orientando os seus conteúdos para o entretenimento.
As emissões por feixe hertziano começaram em 1928, sendo a WGY, da General Electric, a primeira emissora experimental de televisão em todo o mundo. Em 1937, funcionariam já 17 emissoras deste tipo. O primeiro serviço regular nos Estados Unidos iniciou-se em Março de 1939, na emissora W2BS, de Nova Iorque, pertencente à cadeia NBC (National Broadcasting Corporation). Mas a Europa seria a pioneira na emissão regular de programas, pois a inglesa BBC - que realizava emissões experimentais desde 1929 - arrancou com o primeiro serviço regular de televisão do mundo em 2 de Novembro de 1936, com 15 a 20 horas semanais de programação. Alcolea (2003: 15) recorda o começo das emissões em Espanha (28 de Outubro de 1956). No nosso país, a televisão arrancaria a partir da feira popular de Lisboa já em 1957.
No princípio, as emissões iniciais de televisão não atingiam distâncias elevadas. Nos anos 1930, por exemplo, a BBC não alcançava os 50 quilómetros de raio de acção. Isto porque ainda não estava desenvolvido o sistema de repetidores. A questão técnica era fundamental nessa época.
Da raridade de frequências aos novos sistemas de transmissão
Durante decénios, não houve muitos canais de televisão por país. Isto devido à escassez de frequências em sinal aberto. Cada país tinha um limite máximo até cinco ou sete canais, o que ainda acontecia nos finais dos anos de 1970. Em especial por essa razão, os governos de cada país controlavam rigidamente a atribuição dos canais que, normalmente, eram propriedade do Estado. Apenas o Reino Unido e o Luxemburgo tiveram desde há muito canais privados.
A alteração a tal estado de coisas começa a desenhar-se ainda nos anos 1970, com nova legislação das Comunidades Europeias, que a Espanha (e também Portugal) seguiram: a perda do monopólio estatal. No nosso país, como nos lembramos todos, a SIC começou a emitir em 1992, seguindo-se a TVI em 1993. Depois, nos últimos anos do século XX, a televisão passou por outra transformação: a aplicação da tecnologia digital à transmissão. Graças à digitalização e compressão do sinal tornou-se possível a multiplicação de número de canais, para além da incorporação de serviços de valor acrescentado e de interactividade.
Ainda sobre o livro de Gema Alcolea
O prólogo do livro, assinado por Francisco Iglesias (Universidade Complutense de Madrid), permite-nos compreender melhor o percurso do livro de Gema Alcolea. Trata-se de um estudo descritivo sobre a origem e evolução das plataformas digitais de televisão (satélite e terrestre), iniciadas em 1997, centrado em especial nas estratégias comerciais e de conteúdos do Canal Satélite Digital e Vía Digital. Alcolea estuda a constituição dos operadores na perspectiva legal e as primeiras polémicas em torno dos direitos de transmissão dos jogos de futebol, da compatibilidade dos descodificadores e de confrontos de ordem ideológica no começo do funcionamento das plataformas.
A autora, jornalista de profissão, observa também o capital social e a distribuição dos accionistas de ambas as plataformas, as modalidades de pagamento de assinatura, a comercialização dos descodificadores e antenas, a incidência das plataformas nos anunciantes e nas produtoras de conteúdos e a concorrência entre estes novos canais e os de sinal aberto. Estratégias de promoção, ofertas promocionais, promoção de assinantes e novas modalidades de publicidade fazem também parte do trabalho de Gema Alcolea, bem como a análise de estratégias de produção audiovisual e da oferta de conteúdos e as estruturas económicas dos canais digitais. Apesar do aumento da oferta de canais, conduzindo à televisão temática, não se deu uma tão acentuada fragmentação de públicos como se pensara inicialmente. Claro que houve uma grande concorrência na disputa pela aquisição de direitos de programas considerados estratégicos, com canais a orientarem-se para o consumo familiar, enquanto outros (caso dos musicais) mais dirigidos para usos individuais.
Post para amanhã: Elementos para a história da SIC, a partir de um trabalho académico de Luís Lourenço.
O texto de Gema Alcolea, saído em 2003, já está datado. O centro da sua pesquisa é a televisão digital em Espanha, nas vertentes de satélite e terrestre, sabendo-se que esta se alterou profundamente em 2004, com a falência da plataforma digital, ela que já fora assunto para fusão de duas anteriores.
Fica, contudo, um trabalho de levantamento do sector, para além da constituição das plataformas. Estratégias, promoção, produção audiovisul, estruturas económicas e financeiras e respostas dos utilizadores servem como elementos comparativos para uma análise futura. E também a origem da televisão - e da televisão digital - tema que me ocupo neste post.
O começo das experiências e das emissões analógicas
Escreve Gema Alcolea (2003: 13) que se pode estudar a história da televisão a partir de diversos níveis: 1) referência ao seu processo evolutivo, 2) transformações nos conteúdos televisivos, 3) mudanças nas formas de programação, e 4) desenvolvimento das modalidades de acesso. A perspectiva de Alcolea é a dos avanços tecnológicos na transmissão de sinais.
Há curiosidades a destacar no começo do que se chamaria televisão. Assim, o sistema chamado fonovisão era bidireccional, transmitindo uma forma combinada de imagem e som entre emissor e receptor, como hoje temos no videotelefone. Por detrás deste sistema estavam as companhias telefónicas norte-americanas. Também houve experiências na Alemanha, em 1936, entre Berlim e Leipzig. Como o processo de transmissão se fazia por cabo e necessitava de grandes investimentos, foi abandonado e substituído pelo ainda existente modelo unidireccional de radiodifusão [broadcasting], por meio de ondas hertzianas e orientando os seus conteúdos para o entretenimento.
As emissões por feixe hertziano começaram em 1928, sendo a WGY, da General Electric, a primeira emissora experimental de televisão em todo o mundo. Em 1937, funcionariam já 17 emissoras deste tipo. O primeiro serviço regular nos Estados Unidos iniciou-se em Março de 1939, na emissora W2BS, de Nova Iorque, pertencente à cadeia NBC (National Broadcasting Corporation). Mas a Europa seria a pioneira na emissão regular de programas, pois a inglesa BBC - que realizava emissões experimentais desde 1929 - arrancou com o primeiro serviço regular de televisão do mundo em 2 de Novembro de 1936, com 15 a 20 horas semanais de programação. Alcolea (2003: 15) recorda o começo das emissões em Espanha (28 de Outubro de 1956). No nosso país, a televisão arrancaria a partir da feira popular de Lisboa já em 1957.
No princípio, as emissões iniciais de televisão não atingiam distâncias elevadas. Nos anos 1930, por exemplo, a BBC não alcançava os 50 quilómetros de raio de acção. Isto porque ainda não estava desenvolvido o sistema de repetidores. A questão técnica era fundamental nessa época.
Da raridade de frequências aos novos sistemas de transmissão
Durante decénios, não houve muitos canais de televisão por país. Isto devido à escassez de frequências em sinal aberto. Cada país tinha um limite máximo até cinco ou sete canais, o que ainda acontecia nos finais dos anos de 1970. Em especial por essa razão, os governos de cada país controlavam rigidamente a atribuição dos canais que, normalmente, eram propriedade do Estado. Apenas o Reino Unido e o Luxemburgo tiveram desde há muito canais privados.
A alteração a tal estado de coisas começa a desenhar-se ainda nos anos 1970, com nova legislação das Comunidades Europeias, que a Espanha (e também Portugal) seguiram: a perda do monopólio estatal. No nosso país, como nos lembramos todos, a SIC começou a emitir em 1992, seguindo-se a TVI em 1993. Depois, nos últimos anos do século XX, a televisão passou por outra transformação: a aplicação da tecnologia digital à transmissão. Graças à digitalização e compressão do sinal tornou-se possível a multiplicação de número de canais, para além da incorporação de serviços de valor acrescentado e de interactividade.
Ainda sobre o livro de Gema Alcolea
O prólogo do livro, assinado por Francisco Iglesias (Universidade Complutense de Madrid), permite-nos compreender melhor o percurso do livro de Gema Alcolea. Trata-se de um estudo descritivo sobre a origem e evolução das plataformas digitais de televisão (satélite e terrestre), iniciadas em 1997, centrado em especial nas estratégias comerciais e de conteúdos do Canal Satélite Digital e Vía Digital. Alcolea estuda a constituição dos operadores na perspectiva legal e as primeiras polémicas em torno dos direitos de transmissão dos jogos de futebol, da compatibilidade dos descodificadores e de confrontos de ordem ideológica no começo do funcionamento das plataformas.
A autora, jornalista de profissão, observa também o capital social e a distribuição dos accionistas de ambas as plataformas, as modalidades de pagamento de assinatura, a comercialização dos descodificadores e antenas, a incidência das plataformas nos anunciantes e nas produtoras de conteúdos e a concorrência entre estes novos canais e os de sinal aberto. Estratégias de promoção, ofertas promocionais, promoção de assinantes e novas modalidades de publicidade fazem também parte do trabalho de Gema Alcolea, bem como a análise de estratégias de produção audiovisual e da oferta de conteúdos e as estruturas económicas dos canais digitais. Apesar do aumento da oferta de canais, conduzindo à televisão temática, não se deu uma tão acentuada fragmentação de públicos como se pensara inicialmente. Claro que houve uma grande concorrência na disputa pela aquisição de direitos de programas considerados estratégicos, com canais a orientarem-se para o consumo familiar, enquanto outros (caso dos musicais) mais dirigidos para usos individuais.
Post para amanhã: Elementos para a história da SIC, a partir de um trabalho académico de Luís Lourenço.
terça-feira, 22 de março de 2005
CULTURA ARTESANAL E AUTORIA
O texto escrito abaixo reproduz, quase por inteiro, um email que Mário Pires me enviou, e que eu reputo de muito interesse. Ele toca um aspecto que tenho trabalhado nas últimas semanas, o desenvolvimento e a promoção das indústrias criativas (segundo John Hartley, em texto que já aqui destaquei, as indústrias criativas constituem a articulação das artes criativas, como a fotografia e a cultura artesanal, com as indústrias culturais, de reprodutibilidade, através da produção e promoção pelas tecnologias digitais).
Escreve Mário Pires que "um desejo natural dos fotógrafos que levam a sério a sua paixão é mostrar o seu trabalho sob a forma de exposição ou livro. Apesar da importância que a internet tem como divulgadora de obras e autores, um conjunto de fotografias deve ser visto sobre uma forma não electrónica para que possa ser apreciado na sua totalidade. A dimensão da fotografia e a textura do papel ou do meio onde está impressa são parte da obra e é algo que falta quando se vêm fotografias num ecrã".
Ora, o problema da edição fotográfica prende-se "com os elevados custos de produção que estão envolvidos. Na produção gráfica tradicional a qualidade de reprodução depende da gramagem e qualidade do papel, da digitalização das imagens e do controle de qualidade da passagem para fotolito, não esquecendo os ajustes finais. Um livro de fotografias mal impresso é um mau serviço que se faz à fotografia e ao autor, é preferível não o produzir". Das alternativas principais, Mário Pires destaca a impressão "artesanal" em impressoras de jacto de tinta de alta qualidade e o Printing on Demand (PoD), exemplificado no sítio de Antony Rowe.
A tecnologia de impressão digital "permite imprimir o número de cópias de um livro desejadas (de um às centenas), evitando as tiragens mínimas elevadas da tecnologia offset. Envolve no entanto alguns custos associados à produção da matriz dos livros, pelo que a produção de tiragens muito reduzidas faz com que o preço por livro possa ficar elevado e portanto pouco atractivo para comercialização. Também a qualidade da impressão (quando comparada com o offset de melhor qualidade) e a durabilidade podem não ser apropriadas para livros de fotografia, embora esta seja uma área em grande evolução e essa dúvida possa desaparecer em pouco tempo" (continuação do email de Mário Pires).
Com tal tecnologia, há que fazer inicialmente uma pequena tiragem de algumas dezenas de exemplares para diluir o custo de produção da matriz. Mário Pires aponta o caso do profissional que imprime uma cópia da sua monografia (limitada a 100 cópias) quando recebe uma encomenda, utilizando a tecnologia de jacto de tinta: caso do sítio The Luminous Landscape [de onde retirei a imagem seguinte, pertencente a Michael H. Reichmann, autor do sítio]. A "alternativa parece ideal para o autor, já que este só produzirá uma cópia quando for feita uma encomenda e a qualidade de impressão poderá ser muito elevada. Os custos associados estão quase inteiramente nos materiais de produção (tintas, papéis e encadernação)".
Há um outro custo, o da maquetagem do livro. No caso de Mário Pires, tal não constituirá um encargo em si, excepto o tempo, pois ele possui "os meios necessários para produzir uma matriz que poderá ser utilizada para offset, impressão digital ou artesanal. Para os autores que não dominem essa parte do processo produtivo há esse factor extra em conta". Após a produção do livro e da atribuição de um preço de capa, "há que fazer a divulgação da obra ao público". Os autores publicados por uma editora têm uma melhor divulgação, ao passo que os autores em auto-edição precisam de ser inventivos. O "método mais económico consiste em fazer um site onde se fará a promoção do livro e publicitá-lo on-line o mais possível. Mas embora seja uma forma mais económica de publicitar um livro, os resultados variam muito em termos de eficácia, e isto muitas vezes não tem a ver directamente com a qualidade da obra. Regra geral, um autor já conhecido do público terá sempre uma maior facilidade em gerar o impulso de compra".
Mário Pires indica ainda a série de fotógrafos que produziram um livro colaborativo: toycamera.com. O processo que levou ao livro foi feito através da internet, pois os autores estão espalhados por todo o mundo. Estima-se uma produção de mil cópias, com os custos divididos pelos 26 fotógrafos participantes [no sítio, pede-se para não se fazerem cópias das imagens].
Já a revista/sítio Zonezero, editada pelo fotógrafo Pedro Meyer, iniciou recentemente a comercialização de livros electrónicos a custo reduzido, sem versão impressa equivalente, no que é um caso particular [imagem com o título End of an era, de Pedro Meyer, com data de 2004]. Para o editor de Coyoacan, na cidade do México, o objectivo é aumentar as vendas e divugar os autores: zonezero.
Finalmente, Mário Pires anota "o caso de um grupo de artistas que produziu um livro de uma forma colaborativa e posteriormente digitalizou e editou o resultado sobre a forma de livro: lookabout.com. É com este panorama, "ainda com demasiadas incógnitas - conclui Mário Pires - que me surgiu a vontade de editar pequenos livros a partir das minhas fotografias".
Adenda colocada às 21:23: Mário Pires ensina na Escola Prática de Fotografia e tem o blogue Retorta Net.
O texto escrito abaixo reproduz, quase por inteiro, um email que Mário Pires me enviou, e que eu reputo de muito interesse. Ele toca um aspecto que tenho trabalhado nas últimas semanas, o desenvolvimento e a promoção das indústrias criativas (segundo John Hartley, em texto que já aqui destaquei, as indústrias criativas constituem a articulação das artes criativas, como a fotografia e a cultura artesanal, com as indústrias culturais, de reprodutibilidade, através da produção e promoção pelas tecnologias digitais).
Escreve Mário Pires que "um desejo natural dos fotógrafos que levam a sério a sua paixão é mostrar o seu trabalho sob a forma de exposição ou livro. Apesar da importância que a internet tem como divulgadora de obras e autores, um conjunto de fotografias deve ser visto sobre uma forma não electrónica para que possa ser apreciado na sua totalidade. A dimensão da fotografia e a textura do papel ou do meio onde está impressa são parte da obra e é algo que falta quando se vêm fotografias num ecrã".
Ora, o problema da edição fotográfica prende-se "com os elevados custos de produção que estão envolvidos. Na produção gráfica tradicional a qualidade de reprodução depende da gramagem e qualidade do papel, da digitalização das imagens e do controle de qualidade da passagem para fotolito, não esquecendo os ajustes finais. Um livro de fotografias mal impresso é um mau serviço que se faz à fotografia e ao autor, é preferível não o produzir". Das alternativas principais, Mário Pires destaca a impressão "artesanal" em impressoras de jacto de tinta de alta qualidade e o Printing on Demand (PoD), exemplificado no sítio de Antony Rowe.
A tecnologia de impressão digital "permite imprimir o número de cópias de um livro desejadas (de um às centenas), evitando as tiragens mínimas elevadas da tecnologia offset. Envolve no entanto alguns custos associados à produção da matriz dos livros, pelo que a produção de tiragens muito reduzidas faz com que o preço por livro possa ficar elevado e portanto pouco atractivo para comercialização. Também a qualidade da impressão (quando comparada com o offset de melhor qualidade) e a durabilidade podem não ser apropriadas para livros de fotografia, embora esta seja uma área em grande evolução e essa dúvida possa desaparecer em pouco tempo" (continuação do email de Mário Pires).
Com tal tecnologia, há que fazer inicialmente uma pequena tiragem de algumas dezenas de exemplares para diluir o custo de produção da matriz. Mário Pires aponta o caso do profissional que imprime uma cópia da sua monografia (limitada a 100 cópias) quando recebe uma encomenda, utilizando a tecnologia de jacto de tinta: caso do sítio The Luminous Landscape [de onde retirei a imagem seguinte, pertencente a Michael H. Reichmann, autor do sítio]. A "alternativa parece ideal para o autor, já que este só produzirá uma cópia quando for feita uma encomenda e a qualidade de impressão poderá ser muito elevada. Os custos associados estão quase inteiramente nos materiais de produção (tintas, papéis e encadernação)".
Há um outro custo, o da maquetagem do livro. No caso de Mário Pires, tal não constituirá um encargo em si, excepto o tempo, pois ele possui "os meios necessários para produzir uma matriz que poderá ser utilizada para offset, impressão digital ou artesanal. Para os autores que não dominem essa parte do processo produtivo há esse factor extra em conta". Após a produção do livro e da atribuição de um preço de capa, "há que fazer a divulgação da obra ao público". Os autores publicados por uma editora têm uma melhor divulgação, ao passo que os autores em auto-edição precisam de ser inventivos. O "método mais económico consiste em fazer um site onde se fará a promoção do livro e publicitá-lo on-line o mais possível. Mas embora seja uma forma mais económica de publicitar um livro, os resultados variam muito em termos de eficácia, e isto muitas vezes não tem a ver directamente com a qualidade da obra. Regra geral, um autor já conhecido do público terá sempre uma maior facilidade em gerar o impulso de compra".
Mário Pires indica ainda a série de fotógrafos que produziram um livro colaborativo: toycamera.com. O processo que levou ao livro foi feito através da internet, pois os autores estão espalhados por todo o mundo. Estima-se uma produção de mil cópias, com os custos divididos pelos 26 fotógrafos participantes [no sítio, pede-se para não se fazerem cópias das imagens].
Já a revista/sítio Zonezero, editada pelo fotógrafo Pedro Meyer, iniciou recentemente a comercialização de livros electrónicos a custo reduzido, sem versão impressa equivalente, no que é um caso particular [imagem com o título End of an era, de Pedro Meyer, com data de 2004]. Para o editor de Coyoacan, na cidade do México, o objectivo é aumentar as vendas e divugar os autores: zonezero.
Finalmente, Mário Pires anota "o caso de um grupo de artistas que produziu um livro de uma forma colaborativa e posteriormente digitalizou e editou o resultado sobre a forma de livro: lookabout.com. É com este panorama, "ainda com demasiadas incógnitas - conclui Mário Pires - que me surgiu a vontade de editar pequenos livros a partir das minhas fotografias".
Adenda colocada às 21:23: Mário Pires ensina na Escola Prática de Fotografia e tem o blogue Retorta Net.
BARÓMETRO DA COMUNICAÇÃO
Destaquei, alguns dias atrás, o primeiro Barómetro da Comunicação lançado pelo Obercom. Agora, já estou em condições de dar mais detalhes, depois de ler o CD-ROM contendo a informação disponibilizada.
Para o Obercom, o barómetro pretende ser um instrumento de análise. Segundo a carta que acompanha os indicadores, ele contribui "para a objectivação da análise sectorial através da investigação continuada das cadeias de valor e da sobreposição comparativa dos respectivos indicadores. Mais à frente, o mesmo documento indica que "a comparação estatística e o surgimento de tendências [podem] ser analisadas e comentadas por painéis de peritos, constituídos segundo critérios de representatividade sectorial e com substrato técnico e científico". Para além da introdução, o documento inclui objectivos, histórico, nota metodológica e ficha técnica.
O trabalho agora divulgado cruza a estrutura dos anuários e com o texto teórico saído no penúltimo número da revista do Obercom (título: A cadeia de valor do audiovisual), feito por uma equipa de investigadores liderado por Carla Martins. Traz a data de Dezembro mas contém informação até 2003 e apenas no audiovisual (televisão), com alguns campos vazios na área. Embora não invalide a importância do barómetro publicado, parece-me que houve precipitação na sua concepção e divulgação. Era preferível, quanto a mim, esperar pelo final do primeiro trimestre deste ano e incluir dados referentes a 2004.
Dos elementos agora publicados, escolhi o do custo médio da produção por hora e por género de produção: em 2002, atingia a verba de €17,91 mil, baixando para €12,83 mil em 2003. Já o custo de produção por hora na ficção desceria de €129,98 mil em 2002 para €13,61 mil no ano seguinte (o que me julgo pouco provável, dada a redução de quase cem por cento!).
Destaquei, alguns dias atrás, o primeiro Barómetro da Comunicação lançado pelo Obercom. Agora, já estou em condições de dar mais detalhes, depois de ler o CD-ROM contendo a informação disponibilizada.
Para o Obercom, o barómetro pretende ser um instrumento de análise. Segundo a carta que acompanha os indicadores, ele contribui "para a objectivação da análise sectorial através da investigação continuada das cadeias de valor e da sobreposição comparativa dos respectivos indicadores. Mais à frente, o mesmo documento indica que "a comparação estatística e o surgimento de tendências [podem] ser analisadas e comentadas por painéis de peritos, constituídos segundo critérios de representatividade sectorial e com substrato técnico e científico". Para além da introdução, o documento inclui objectivos, histórico, nota metodológica e ficha técnica.
O trabalho agora divulgado cruza a estrutura dos anuários e com o texto teórico saído no penúltimo número da revista do Obercom (título: A cadeia de valor do audiovisual), feito por uma equipa de investigadores liderado por Carla Martins. Traz a data de Dezembro mas contém informação até 2003 e apenas no audiovisual (televisão), com alguns campos vazios na área. Embora não invalide a importância do barómetro publicado, parece-me que houve precipitação na sua concepção e divulgação. Era preferível, quanto a mim, esperar pelo final do primeiro trimestre deste ano e incluir dados referentes a 2004.
Dos elementos agora publicados, escolhi o do custo médio da produção por hora e por género de produção: em 2002, atingia a verba de €17,91 mil, baixando para €12,83 mil em 2003. Já o custo de produção por hora na ficção desceria de €129,98 mil em 2002 para €13,61 mil no ano seguinte (o que me julgo pouco provável, dada a redução de quase cem por cento!).
UMA FITA CHAMADA UM PEIXE FORA DE ÁGUA
No original, o filme de Wes Anderson chama-se The Life Aquatic with Steve Zissou (A vida aquática de Steve Zissou), ficando nós sem saber quem é o peixe fora de água. Provavelmente, Zissou, uma espécie de vago comandante Jacques-Yves Cousteau, a quem o filme é dedicado.
Escreve Francisco Ferreira, no último Expresso: "Aos géneros, não se mostra fidelidade, do musical ao filme de piratas, da alta comédia ao filme de aventuras e ao drama familiar". Em entrevista publicada também no semanário do último sábado e ao mesmo crítico de cinema, Anjelica Huston, que faz a personagem Eleanor, diz do realizador Wes Anderson (nascido em 1969): "é um rapaz inteligente, cavalheiro, e tem um olho de lince para inventar personagens originais" [imagens retiradas do sítio Allociné.com, num filme da Buena Vista International].
O filme tem uma acção rápida, em que a história principal se desenrola em torno de Zissou, um comandante que faz simultaneamente exploração subaquática e filmes de divulgação científica. Steve Zissou, interpretado por Bill Murray, preserva mais a aventura que a condução racional do seu projecto, envolto entre as tramas traçadas pela sua (ex-)mulher (interpretada por Anjelica Huston), o filho já adulto recentemente descoberto e tornado seu sócio (Owen Wilson) e a repórter (Cate Blanchett), dentro do barco Belafonte. De realçar o trabalho dos estúdios italianos Cinecittà, onde decorreu uma parcela significativa da rodagem, em especial o corte transversal do barco, tendo-se conseguido belas imagens.
No original, o filme de Wes Anderson chama-se The Life Aquatic with Steve Zissou (A vida aquática de Steve Zissou), ficando nós sem saber quem é o peixe fora de água. Provavelmente, Zissou, uma espécie de vago comandante Jacques-Yves Cousteau, a quem o filme é dedicado.
Escreve Francisco Ferreira, no último Expresso: "Aos géneros, não se mostra fidelidade, do musical ao filme de piratas, da alta comédia ao filme de aventuras e ao drama familiar". Em entrevista publicada também no semanário do último sábado e ao mesmo crítico de cinema, Anjelica Huston, que faz a personagem Eleanor, diz do realizador Wes Anderson (nascido em 1969): "é um rapaz inteligente, cavalheiro, e tem um olho de lince para inventar personagens originais" [imagens retiradas do sítio Allociné.com, num filme da Buena Vista International].
O filme tem uma acção rápida, em que a história principal se desenrola em torno de Zissou, um comandante que faz simultaneamente exploração subaquática e filmes de divulgação científica. Steve Zissou, interpretado por Bill Murray, preserva mais a aventura que a condução racional do seu projecto, envolto entre as tramas traçadas pela sua (ex-)mulher (interpretada por Anjelica Huston), o filho já adulto recentemente descoberto e tornado seu sócio (Owen Wilson) e a repórter (Cate Blanchett), dentro do barco Belafonte. De realçar o trabalho dos estúdios italianos Cinecittà, onde decorreu uma parcela significativa da rodagem, em especial o corte transversal do barco, tendo-se conseguido belas imagens.
UM BLOGUE CHAMADO ZONA J
O primeiro post data de 15 deste mês. Chama-se Zona J [J de jornalismo], assina-se blogaveiro [julgo ser Dinis Manuel Alves, professor da disciplina de Fotojornalismo 2004/2005 do ISCIA (Aveiro), por detrás do pseudónimo] e apresenta-se como "terminal servido por blogues que se dirigem às áreas do Jornalismo e da Comunicação. Cobrimos o país inteiro, continentes adjacentes e outros nem tanto".
Tem posts e links para os blogues Jornalismo e Comunicação, irreal tv, As Imagens e Nós, Primeira Página, Blogouve-se, Carga de Trabalhos e para este blogue. Ao IC destinou a imagem que se vê aqui em cima, retirada do sítio Hello. Desejo longa vida ao novo blogue.
O primeiro post data de 15 deste mês. Chama-se Zona J [J de jornalismo], assina-se blogaveiro [julgo ser Dinis Manuel Alves, professor da disciplina de Fotojornalismo 2004/2005 do ISCIA (Aveiro), por detrás do pseudónimo] e apresenta-se como "terminal servido por blogues que se dirigem às áreas do Jornalismo e da Comunicação. Cobrimos o país inteiro, continentes adjacentes e outros nem tanto".
Tem posts e links para os blogues Jornalismo e Comunicação, irreal tv, As Imagens e Nós, Primeira Página, Blogouve-se, Carga de Trabalhos e para este blogue. Ao IC destinou a imagem que se vê aqui em cima, retirada do sítio Hello. Desejo longa vida ao novo blogue.
segunda-feira, 21 de março de 2005
COMO ESCREVER UM BOM TÍTULO NA IMPRENSA
Há dois anos atrás, Dinis Alves lançava o livro Foi você que pediu um bom título? Lugar privilegiado do acontecimento, como o autor escreveu citando Estrela Serrano (p. 12), o trabalho seria todo dedicado à análise da construção dos títulos das notícias dos jornais.
Agora coube a vez à edição do livro Títulos das notícias, de Mário Pinto e Wlodzimierz Jósef Szymaniak (MinervaCoimbra). O subtítulo esclarece melhor os propósitos do texto: Recursos retórico-estilísticos. Intencionalidade ou acaso? Na introdução, lê-se que um dos objectivos "reside em verificar até que ponto o uso de certas figuras retóricas, nomeadamente da metáfora ou da metonímia, resulta da decisão consciente do usuário ou é tão-só produto da acção dos mecanismos universais da linguagem e da língua portuguesa em particular" (p. 10). Baseados na perspectiva da retórica aberta por Charles Perelman, os autores, nas conclusões, escreveriam o seguinte: "consideramos que o recurso às figuras retóricas no discurso jornalístico enriquece sobremaneira o texto e, em consequência, convida o leitor a um diálogo intelectual com o autor da notícia ou da reportagem" (p. 105).
Os autores partem da classificação categorial que inclui: 1) metaplasmas (figuras que incidem sobre o aspecto sonoro ou gráfico das palavras), 2) metataxes (figuras que afectam a estrutura frásica do discurso), 3) metassememas (figuras que afectam as características sémicas do discurso), e 4) metalogismos (figuras que afectam o valor lógico da frase).
De entre várias figuras da primeira, Mário Pinto e Wlodzimierz Jósef Szymaniak escolheram a aliteração, que consiste na repetição dos mesmos fonemas, como O fugitivo fugiu ou O caçador caçado (p. 16). Da categoria das metataxes, escolho a anáfora, que consiste na repetição de um vocábulo ou de uma fórmula num dado lugar do texto, exemplificado em Todos em luta contra todos (p. 24). Já na categoria dos metassememas, distingo a sinédoque, que consiste na transferência do significado para além do uso habitual ou literal, como Os olhos da América na guerra ou Torneiras da serra de Sintra vão ter mais um Verão seco (pp. 51-52). Finalmente, das figuras dos metalogismos, escolho a antonomásia, onde se substitui um nome comum por um nome próprio ou vive-versa: Lance triunfal (Lance é o nome de um ciclista) ou Ave e reboque avariam aviões (após a paragem forçada de um avião, com reactor danificado, o que o foi substituir também se avariou) (p. 34).
Mário Pinto ensina na Universidade Fernando Pessoa (Porto) e o polaco Wlodzimierz Jósef Szymaniak é professor no Instituto Piaget.
Leitura: Mário Pinto e Wlodzimierz Jósef Szymaniak (2005). Títulos das notícias. Recursos retórico-estilísticos. Intencionalidade ou acaso?. Coimbra: MinervaCoimbra. 113 páginas.
Há dois anos atrás, Dinis Alves lançava o livro Foi você que pediu um bom título? Lugar privilegiado do acontecimento, como o autor escreveu citando Estrela Serrano (p. 12), o trabalho seria todo dedicado à análise da construção dos títulos das notícias dos jornais.
Agora coube a vez à edição do livro Títulos das notícias, de Mário Pinto e Wlodzimierz Jósef Szymaniak (MinervaCoimbra). O subtítulo esclarece melhor os propósitos do texto: Recursos retórico-estilísticos. Intencionalidade ou acaso? Na introdução, lê-se que um dos objectivos "reside em verificar até que ponto o uso de certas figuras retóricas, nomeadamente da metáfora ou da metonímia, resulta da decisão consciente do usuário ou é tão-só produto da acção dos mecanismos universais da linguagem e da língua portuguesa em particular" (p. 10). Baseados na perspectiva da retórica aberta por Charles Perelman, os autores, nas conclusões, escreveriam o seguinte: "consideramos que o recurso às figuras retóricas no discurso jornalístico enriquece sobremaneira o texto e, em consequência, convida o leitor a um diálogo intelectual com o autor da notícia ou da reportagem" (p. 105).
Os autores partem da classificação categorial que inclui: 1) metaplasmas (figuras que incidem sobre o aspecto sonoro ou gráfico das palavras), 2) metataxes (figuras que afectam a estrutura frásica do discurso), 3) metassememas (figuras que afectam as características sémicas do discurso), e 4) metalogismos (figuras que afectam o valor lógico da frase).
De entre várias figuras da primeira, Mário Pinto e Wlodzimierz Jósef Szymaniak escolheram a aliteração, que consiste na repetição dos mesmos fonemas, como O fugitivo fugiu ou O caçador caçado (p. 16). Da categoria das metataxes, escolho a anáfora, que consiste na repetição de um vocábulo ou de uma fórmula num dado lugar do texto, exemplificado em Todos em luta contra todos (p. 24). Já na categoria dos metassememas, distingo a sinédoque, que consiste na transferência do significado para além do uso habitual ou literal, como Os olhos da América na guerra ou Torneiras da serra de Sintra vão ter mais um Verão seco (pp. 51-52). Finalmente, das figuras dos metalogismos, escolho a antonomásia, onde se substitui um nome comum por um nome próprio ou vive-versa: Lance triunfal (Lance é o nome de um ciclista) ou Ave e reboque avariam aviões (após a paragem forçada de um avião, com reactor danificado, o que o foi substituir também se avariou) (p. 34).
Mário Pinto ensina na Universidade Fernando Pessoa (Porto) e o polaco Wlodzimierz Jósef Szymaniak é professor no Instituto Piaget.
Leitura: Mário Pinto e Wlodzimierz Jósef Szymaniak (2005). Títulos das notícias. Recursos retórico-estilísticos. Intencionalidade ou acaso?. Coimbra: MinervaCoimbra. 113 páginas.
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