segunda-feira, 29 de dezembro de 2003

O contributo de Adriano Paiva (1847-1907) na origem da televisão. A hipótese do selénio

O professor português Adriano de Paiva é uma figura importante na história técnica da televisão. Aceite pelos principais investigadores de finais do século XIX, seria redescoberto pela comunidade de historiadores da televisão em 1967, quando Walter Bruch, o inventor alemão do sistema PAL, lhe fez uma homenagem pública.

O livro de Vasco Hogan Teves (História da televisão em Portugal, 1955/1979, pp. 6-7) faz-lhe referência, com direito a fotografia. Mas encontram-se mais detalhes no site de André Lange, que ensinou História da televisão na Université Libre de Bruxelas antes de se dedicar ao Observatório Europeu do Audiovisual. O endereço do site é Histoire de la télévision e nele se pode ler o texto do investigador português, dando conta das suas experiências. André Lange, no seu site, agradece ao Professor Manuel Vaz Guedes, da Universidade do Porto, o fornecimento de todas as informações sobre Adriano Paiva.

Adriano Paiva foi nomeado, em 1872, professor na Academia Politécnica do Porto, na cadeira de Química, após o que transitou para a cadeira de Física, onde publicou um tratado dos princípios fundamentais da termodinâmica. No ano de 1877-78, dirigiu a cadeira de Física teórica e experimental, durante o qual se interessou pelo telescópio eléctrico. Em 1881, tornou-se correspondente da Academia de Ciências de Lisboa. Foi também membro associado do Instituto de Coimbra, membro fundador da Sociedade de Instrução do Porto, membro fundador da Société des Electriciens de Paris e presidente da secção portuguesa dessa Sociedade. O rei D Luís I concedeu-lhe o título de Conde do Campo Belo e fê-lo par do reino.

O interesse de Paiva pelo telescópio eléctrico começaria com a primeira demonstração do telefone de Graham Bell em Lisboa, em Novembro de 1877. Adriano Paiva interrogava-se sobre as possibilidades de produzir um sistema equivalente ao de Bell para a transmissão de imagens animadas. O termo telescópio designava já um processo de comunicação óptica. A originalidade do contributo de Adriano Paiva consiste na sua proposta de utilizar o selénio como placa sensível do campo negro do teletroscópio. O selénio fora descoberto em 1817 por J.J. Berzelius e as suas propriedades estudadas desde 1873 por Willoughby Smith com a ajuda de L.May. Paiva referia-se também aos trabalhos conduzidos pelos irmãos Siemens em 1875 e 1876.

Escreveu Adriano Paiva: "Desde que as considerações precedentes se desenharam claras ao nosso espírito, para logo nos quis parecer que uma nova descoberta científica se anunciava para breve; seria a aplicação da electricidade à telescopia, ou a criação da telescopia eléctrica. [...] Uma câmara escura, colocada no ponto que houvesse de ser sujeito às observações, representaria, por assim dizer, a câmara ocular. Sobre uma placa, situada no fundo dessa câmara iria desenhar-se a imagem dos objectos exteriores, com as suas cores respectivas e acidentes particulares de iluminação, afectando assim diversamente as diversas regiões da placa. Tornava-se por tanto apenas necessário descobrir o meio de operar a transformação por nenhuma forma impossível, desta energia, absorvida pela placa, em correntes eléctricas, que em seguida recompuzessem a imagem. A importância da descoberta dum instrumento de tal ordem manifesta-se com demasiada evidência. Contudo não é talvez inútil advertir que esse telescópio eléctrico, quando realizado preencheria uma lacuna que a telescopia actual, a despeito de todos os seus progressos jamais poderia pensar em fazer desaparecer. [...] Com o novo telescópio, [...] transformado em corrente eléctrica, o movimento luminoso percorreria docilmente o caminho que nos aprouvesse dar ao fio destinado a conduzi-lo; e de um ponto do globo terrestre seria possível devassar este em toda a sua extensão".

domingo, 21 de dezembro de 2003

A IMPORTÂNCIA DA CADEIA DE VALOR NA INDÚSTRIA AUDIOVISUAL [texto publicado quase nesta forma na revista MediaXXI, nº 71, de Junho/Julho de 2003]

Tem crescido, nos últimos anos, o peso da indústria audiovisual na vida dos indivíduos, como consumidores e como produtores. Muito do que sabemos sobre o mundo aparece nos jornais, na televisão, na rádio e na Internet. Formamos a opinião sobre os acontecimentos e as grandes causas mobilizadoras da sociedade daquilo que nos chega dos media. Muito do nosso lazer reside em filmes, livros, discos e DVDs, nos jogos vídeo ou da Internet. Do lado da produção da indústria audiovisual, o volume de emprego cresce, para satisfação de um mercado cada vez maior de telenovelas ou séries, de informação ou documentários e de entretenimento em geral. Nascem ou desenvolvem-se profissões ligadas à produção, à distribuição e à sua publicitação. Além disso, um dos fenómenos recentes mais marcantes é o da transformação tecnológica, a digitalização, que tem percorrido toda a indústria audiovisual. E que promete continuar, por exemplo, com a digitalização na televisão terrestre, capaz de produzir um forte impacto económico e cultural.

A indústria do audiovisual não é mais um conjunto de actividades isoladas, com cadeias de concepção, produção e venda separadas, mas entrelaçadas e em que os interesses económicos e empresariais se fortalecem, com aquisições, fusões e surgimento de grupos de empresas. Num recente documento publicado sobre o desenvolvimento do mercado da indústria audiovisual até 2010, e destinado à Comissão Europeia, a empresa de consultoria Arthur Andersen (2002) usou um modelo de análise da cadeia de valor, o qual identificava diferentes papéis, agrupados em três categorias principais de actividades. Assim, no primeiro grupo, integram-se os produtores de conteúdo, que incluem produtores de conteúdo, detentores de direitos de autor e de direitos dos distribuidores. No segundo grupo, inserem-se os programadores e os agregadores (responsáveis pela aquisição de programas) e, no terceiro grupo, os difusores, que englobam redes, fornecedores de acesso e vendedores de equipamentos.

Claro que cada país, no caso da União Europeia, apresenta diferentes dimensões e capacidades financeiras, além de que cada mercado nacional tem uma porção diferente de rendimento consoante os meios de comunicação. Por exemplo, a publicidade nos media é maior na televisão em países mediterrânicos como Portugal, Espanha ou Grécia, relativamente aos outros meios, ao passo que os jornais no Reino Unido ou na Alemanha arrecadam uma maior fatia. Outro exemplo é o do mercado de distribuição de televisão, com pesos distintos conforme se trate de cabo, satélite ou via hertziana. Um mercado de televisão gera mais ou menos receitas se pago (cabo e canais codificados em satélite ou televisão digital) ou gratuito (acesso aos canais generalistas por feixe hertziano tradicional).

Verifica-se, na actual existência da indústria audiovisual, um constante cruzamento, reconfiguração e concentração da propriedade. Distingue-se a concentração horizontal (crescimento interno ou aquisição e fusão de empresas num só sector), vertical (cruzamento de actividades num sector alargado a duas ou mais etapas na cadeia de valor, caso do produção e distribuição de programas de televisão) e diagonal (presença de um grupo em várias indústrias, caso de jornais, rádio e televisão). O principal motivo da expansão horizontal é a economia de escala, pois a concentração reduz os custos da produção quando se orienta para uma maior audiência de leitores ou espectadores. Também a concentração vertical se traduz em menores custos, caso de elaboração de contratos entre empresas e da obtenção de informação sobre especificidades dos produtos ou mesmo do mercado em geral, sem esquecer o ganho de músculo financeiro e em produtos para enfrentar grupos económicos dominantes no mercado. Já a concentração diagonal – cuja distinção dos dois modelos anteriores nem sempre se mostra fácil – permite obter os ganhos sentidos nesses modelos e uma reformatação mais fácil e barata, de que o exemplo é a publicação electrónica ou a informação disponível num sítio da Internet. Em texto estimulante, Doyle (2002: 40) considera que a diversificação proporcionada pela concentração diagonal possibilita a assunção de maior risco empresarial no lançamento de produtos mediáticos originais, através do uso de variados formatos.

Um outro elemento importante é a compreensão dos ritmos de elaboração e entrega dos produtos audiovisuais. Se uma parte significativa da indústria audiovisual tem edição contínua (jornal, televisão), outra parte tem produção descontínua (filme, livro, disco), o que obriga a planificações e tipos de investimentos diferentes. Mas em ambas materializa-se a ideia de serialização, a série ou o continuado (ao jornal e programa de televisão diários juntam-se as séries no cinema, caso de Indiana Jones, ou nos livros, caso de Harry Potter). Torna-se, pois, necessária uma visão global das actividades do audiovisual, como aponta o investigador espanhol Enrique Bustamante. Para ele, as indústrias criativas (cinema, discos) fornecem matéria-prima para as fábricas mediáticas (rádio, televisão), numa interpenetração de interesses (Bustamante, 2002: 25). Acresce-se que as vendas dos produtos do audiovisual dependem, cada vez mais, da publicidade e do marketing feitos nos próprios media.

O surgimento das redes digitais, fenómeno associado mas distinto da digitalização de conteúdos, acelerou a própria transformação da estrutura industrial, no que constitui o último elemento fundamental desta análise. Formula-se a interactividade – cada produto do audiovisual pode ser reconstruído pelo receptor, num processo de codificação e descodificação –, enquanto se assiste à desmaterialização dos produtos da indústria audiovisual, orientados crescentemente para o domínio dos símbolos e dos valores culturais. Além disso, o digital e o multimedia estendem o âmbito do audiovisual às artes tradicionais, como o teatro e a dança, contaminadas com expressões fornecidas pelas tecnologias da informação, as quais retiram a aura do original, do irrepetível e do autêntico no espectáculo representado ao vivo (Couchot e Hillaire, 2003: 201).

Como resultado da cadeia de valor na indústria audiovisual sobre a recepção, assiste-se, por um lado, à formação de consumidores exigentes, esperando sempre novos produtos (ou, pelo menos, inovadores). Mas, por outro lado, desencadeia-se um aspecto negativo: o consumo igual por todo o planeta, controlado por um número pequeno de grupos empresariais gigantescos. O ideal será, pois, manter a inovação na indústria e alargar a diversificação na oferta de produtos.

Bibliografia
Andersen, Arthur (2002). Outlook of the development of technologies and markets for the European Audio-visual up to 2010 (acessível em http://europa.eu.int)
Bustamante, Enrique (coord.) (2002. Comunicación y cultura en la era digital. Barcelona: Gedisa
Couchot, Edmond, e Norbert Hillaire (2003). L’art numérique. Paris: Flammarion
Doyle, Gillian (2002). Media ownership. Londres, Thousand Oaks e Nova Deli: Sage

sexta-feira, 19 de dezembro de 2003

Sobre Marshall McLuhan

[a partir de: Em Griffin, A first look at communication theory, McGraw-Hill, 1994, pp. 332-343]

McLuhan divide a história da humanidade em quatro períodos ou épocas - tribal, literária, impressa e electrónica. As invenções cruciais que mudaram a vida no planeta foram o alfabeto fonético, a imprensa e o telégrafo.

A teoria de McLuhan é determinista tecnológica. As invenções na tecnologia causam, invariavelmente, uma mudança cultural. Enquanto o determinismo económico de Marx argumentava que as mudanças nos modos de produção determinam o curso da história, McLuhan concluiria que as mudanças específicas nos modos de comunicação moldam a existência humana. Ele via as invenções na comunicação como fundamentais, ao considerar qualquer nova forma de inovação dos media como extensão de uma faculdade humana. O livro é uma extensão do olho, a roda uma extensão do pé, a roupa uma extensão da pele, o circuito electrónico uma extensão do sistema nervoso central. Os media, para McLuhan, são tudo o que amplifica ou intensifica um órgão, sentido ou função. Isto é, o canadiano considerou que a nossa vida se deve muito ao modo como processamos a informação. O alfabeto fonético, a imprensa e o telégrafo são pontos de viragem na história humana porque mudaram o modo como as pessoas pensam sobre si e sobre o mundo.

Um dos aforismos mais conhecidos de McLuhan é "o meio é a mensagem". Para ele, o conteúdo de uma mensagem não tem uma grande importância. O meio muda mais do que a soma das mensagens incluídas nesse meio. As mesmas palavras ditas num frente-a-frente, impressas em papel ou apresentadas na televisão fornecem três mensagens diferentes. Oral, escrito ou electrónico, o canal primário da comunicação molda o modo como entendemos o mundo. O meio dominante numa época domina as pessoas.

McLuhan, na sua perspectiva de determinismo tecnológico, concebe a história da humanidade a partir de uma perspectiva mediática. Para ele, a aldeia tribal era um espaço acústico. O ouvido era rei; ouvir era acreditar. Os primitivos tinham vidas mais ricas e complexas que os seus descendentes letrados, porque o ouvido não selecciona o estímulo mas a entoação das palavras, que é de origem mais emotiva e provoca a raiva, a alegria, o medo e a tristeza. O alfabeto fonético foi como uma bomba no mundo acústico, instalando a visão à frente da hierarquia dos sentidos. As pessoas que lêem trocam o ouvido pelo olho. Escritor e leitor de um texto estão separados deste mesmo texto [vivem num contexto separado]. O alfabeto fonético estabeleceu a linha de um princípio organizado de vida. Ao escrever, cada letra segue outra numa linha interligada e ordenada. A lógica é modelada numa progressão linear passo a passo. McLuhan conclui que a invenção do alfabeto promoveu a emergência súbita da matemática, ciência e filosofia na Grécia antiga.

Ora, se o alfabeto fonético tornou possível a dependência visual, a imprensa alargou-a. Na Galáxia Gutenberg, McLuhan escreveu que a repetitibilidade é uma das características mais importantes da tipografia móvel. Dado que a revolução da imprensa demonstrou a produção em massa de produtos idênticos, McLuhan viu nela a primeira revolução industrial. Ele viu outros efeitos laterais não intencionais na invenção de Gutenberg, caso do nacionalismo e do isolamento da leitura. McLuhan insistiu que os media electrónicos retribalizaram a raça humana. Todos nós somos membros de uma só aldeia global. Os media electrónicos conduzem-nos a conhecer o que se passa no mundo de modo instantâneo. Os cidadãos do mundo voltam ao espaço acústico.

Uma vez que a televisão se tornou o meio dominante na comunicação, McLuhan centrou-se na descrição da natureza fundamental e no poder revolucionário da televisão. Classifica os meios como quentes ou frios. Os meios quentes são canais de comunicação com alta definição e são dirigidos para um qualquer receptor. A imprensa é um meio quente e visual. Do mesmo modo são a fotografia e a imagem em movimento. Elas contêm muita informação, pelo que não exigem um grande esforço por parte do receptor. O texto de um livro é quente mas um cartoon é frio. Os media frios exigem uma participação elevada para preencher as lacunas de entendimento ou conhecimento. A rádio é um meio quente mas o telefone é frio, porque (o interlocutor) precisa de uma resposta. Os meios quentes tendem a ser muito visuais, lógicos e privados. Organizam-se para comunicar informação discreta. Os media frios tendem a ser aurais, intuitivos e de envolvimento emocional. Os media frios clarificam o contexto envolvente para que os participantes se insiram na história. Se se pensa habitualmente que a televisão é um meio visual, McLuhan classifica a televisão como um meio aural e táctil, muito frio. A televisão é fria porque exige participação e envolvimento. Pode-se estar a trabalhar enquanto se ouve rádio, mas não se pode fazer o mesmo quando se vê televisão.

sábado, 13 de dezembro de 2003

TELENOVELAS, RECEPÇÃO E INDÚSTRIAS CULTURAIS

Defendida em 2001 na Universidade de Coimbra, a tese de mestrado de Verónica Policarpo – Telenovela brasileira: apropriação, género e trajectória familiar – é um estudo sobre a telenovela como expressão de valores e representações de determinados grupos sociais. Para a autora, a telenovela, produto ou formato de indústria cultural, possui uma narrativa dramatizada de situações imaginadas, estrutura seriada e marcas próprias em termos de duração e estrutura. Herdeira do folhetim literário e romântico do séc. XIX, a telenovela explora as emoções como rir ou chorar.

O trabalho de Verónica Policarpo, professora da Universidade Católica Portuguesa, tem como objecto a audiência e os “contextos de leitura” da telenovela, em que a família surge como contexto indicado para estudar as práticas de recepção da televisão. Pergunta-se: como é que as pessoas “lêem” as propostas da telenovela? Que significados lhes atribuem? Que factores sociais decisivos para essa apropriação? A autora – que analisou a telenovela Terra Nostra (2000) e o seu impacto na recepção – parte da hipótese que as formas de apropriação da telenovela brasileira variam em função do género e da trajectória familiar. Ela considera a audiência como social (composta por indivíduos inseridos em complexas relações sociais) e activa, orientando a explicação para as diferenças de recepção, com possibilidade de leituras de resistência (usos alternativos que as mulheres fazem das telenovelas). A telenovela constitui um interlocutor privilegiado de certo tipo de sentimentos e experiências. Por exemplo, as mulheres podem rever a sua vida e reflectir sobre a sua situação. A telenovela oferece uma forma narrativa, um léxico e uma semântica para se constituir uma história de vida.

Tendo como base empírica um conjunto de 20 entrevistas, a autora traça uma tipologia de recepção dos géneros face à telenovela: 1) mulheres casadas – distância e contenção, 2) mulheres separadas – amor-romântico, espontaneidade e emoção, 3) homens casados – desvalorização do conteúdo como prática de distinção, e 4) homens separados – amor e emoção na apropriação da telenovela. Como conclusão, Verónica Policarpo demonstra a importância do género e da trajectória familiar na forma como os actores sociais se apropriam dos valores propostos pela telenovela brasileira. Ela conclui que homens e mulheres casadas produzem um discurso – sobre a telenovela – mais descritivo e denotativo, enquanto os homens e mulheres divorciadas aderem com mais emoção aos encontros e desencontros amorosos da telenovela.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2003

REGULAÇÃO DO SECTOR DA COMUNICAÇÃO EM PORTUGAL

Realizou-se, hoje, no ISCSP, e organizada pelo Obercom uma conferência com o título acima indicado. Presentes estiveram professores universitários, dirigentes das associações de anunciantes e meios de comunicação, representantes dos canais televisivos e responsáveis de institutos públicos (Autoridade da Concorrência, Instituto da Comunicação Social, INA), assim como o vice-presidente da EPRA (European Platform of Regulatory Authorities).

Retenho apenas algumas ideias deste último elemento, o catalão Joan Botella. Ele fez uma comunicação assente em três ideias fundamentais: 1) regular consiste em quê? 2) quem faz a regulação? 3) como se faz a regulação?

Pluralismo, acesso, universalidade, protecção dos consumidores e diretios do autor incluem-se entre as cláusulas a caracterizar a regulação, afirmou Botella. Já sobre quem faz a regulação, o dirigente da EPRA distinguiu o mercado e a auto-regulação. Quem faz a regulação são os governos, os governos e organismos assessores, as autoridades independentes. Botella referiu como exemplo o Conselho Superior do Audiovisual (CSA) francês como o modelo. Ao invés, o regulador italiano (Agcom) não funciona, como tipifica o actual caso Berlusconi.

O mesmo dirigente considera a oportunidade da existência de um regulador europeu, pois neste momento existe apenas um espaço de troca de experiências, a própria EPRA. E anunciou a realização de um encontro mundial, em Barcelona, no próximo Maio de 2004. Para informações consultar: http://www.epra.org.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2003

LIVRO

Saiu recentemente um livro de Helena Matos, intitulado Salazar, a construção do mito. A autora, jornalista do Público, promete para breve a saida de um segundo volume, dado que o agora publicado cobre aquilo a que ela chama de "representações desse homem" entre 1928 e 1933.

Helena Matos diz que a obra publicada não é a de uma historiadora mas de uma jornalista. Contudo, o seu trabalho é meticuloso e organizado, tem um bom fundo bibliográfico, apesar de não estar no final do volume, mas apenas em notas de rodapé. Tem também uma excelente cronologia, que começa em 1925, ainda antes do 28 de Maio.

O livro traz citações de entidades da época, os capítulos apresentam uma introdução, há narrativa, ou, como dizem os sociólogos do jornalismo, estórias [afinal o(a) jornalista e o(a) historiador(a) não são contadores de estórias?), e até imagens da época. Estou a lembrar, por exemplo, a incluida na página 193: "qual é a rapariga mais bonita das revistas de Lisboa?", um concurso organizado pelo Notícias Ilustrado.

Apenas uma nota sobre o mito Salazar, como nos descreve Helena Matos: "O ascendente de Salazar sobre os outros ministros vai mesmo ao ponto de, em alguns casos, em nome desse «interesse superior», controlar as declarações que estes prestam à imprensa" (p. 197). Estávamos ainda em 1931! Valerá a pena cotejar com o agora também editado livro das entrevistas dadas por Salazar a António Ferro, estava este ainda no Diário de Notícias antes de "voar" para o SPN. Ou reler a tese de José Rebelo sobre o modo como as entrevistas de Salazar dadas a jornalistas estrangeiros eram referenciadas na imprensa nacional.

Os capítulos do volume agora editado referem-se a anos, começando em 1928. Mas 1932 ocupa dois capítulos, sinal da importância desse ano na biografia de Salazar.

O livro é para comprar, com uma capa sugestiva, embora o preço não seja muito convidativo (€ 31).

quarta-feira, 26 de novembro de 2003

PÚBLICOS

Realizou-se, na segunda e terça-feiras, um colóquio promovido pelo Observatório de Actividades Culturais (OAC), dedicado aos públicos da cultura, na nova casa do Instituto de Ciências Sociais, vizinho do ISCTE. Retenho um apontamento do sociólogo Firmino da Costa, para quem não se pode falar de um só público mas de uma tipologia: públicos da cultura erudita, das ciências, das indústrias culturais, dos media.

No colóquio, falou-se de mediadores (culturais, como os programadores de acontecimentos culturais), mas também se poderia ter falado dos mediadores mediáticos, como os comentaristas da televisão. Não estavam sociólogos dos media, mas apenas da cultura. Valerá a pena estar atentos e propor, quem sabe, ao OAC um estudo para avaliar a importância desses mediadores electrónicos. O OAC, pela voz da sua principal responsável, Maria de Lourdes Lima dos Santos, lançou para o ar a ideia de um Observatório dos Públicos. Há alguém na blogosfera que queira participar na sua concretização?

sábado, 15 de novembro de 2003

SEMIÓTICA

Enquanto teoria, a semiótica realça a comunicação como geradora de significação. Com ela, constitui-se um novo conjunto de conceitos: signo, significação, ícone, índice, denotação, conotação, paradigma, sintagma. No centro está o signo. Ao estudo do signo chama-se semiótica, que compreende: 1) signo, 2) códigos ou sistemas, 3) cultura – presta atenção ao texto; considera o receptor ou leitor como possuidor de um papel activo. O signo é algo físico, perceptível aos nossos sentidos.

Porque considero importante a inclusão desta ciência nas indústrias culturais, incluo aqui elementos principais de textos pertencentes a Ferdinand de Saussurre, Adriano Duarte Rodrigues (1991), Roland Barthes (1981) e Charles Sanders Peirce (1978). Uma aplicação prática é o estudo das primeiras páginas dos jornais e dos seus títulos principais [a propósito ver o livro de Dinis Manuel Alves (2003). Foi você que pediu um bom título? Coimbra: Quarteto].

Ferdinand de Saussure (1857-1913)

Interessou-se pela linguagem e pela relação entre um signo (a palavra) e os outros signos. Para Saussure, o signo é uma realidade psíquica com duas faces, um objecto físico com um significante e um significado. O signo consiste, assim, num significante (imagem do signo; marca no papel ou elemento acústico) e num significado (conceito mental a que ele se refere).

Saussure definiu dois modos dos signos se organizarem em códigos. O primeiro é o paradigma, conjunto de signos donde se escolhe aquele que vai ser utilizado. O segundo é o sintagma, mensagem na qual os signos escolhidos se combinam. Exemplo: a ementa num restaurante. A estrutura da ementa tem uma entrada, um prato de carne ou peixe e uma sobremesa (o paradigma ou sistema). Dentro de cada um destes três elementos existe uma variedade de opções. Assim, cada cliente combina-as numa refeição; o pedido feito ao empregado é um sintagma.

Adriano Duarte Rodrigues

O autor tem uma atitude pedagógica quando distingue sinais e signos. Para ele, o sinal é o impulso que desencadeia um processo de transmissão com uma resposta adequada (casos dos termóstatos no aquecimento central ou no frigorífico). Daí a informação enquanto medida estatística da probabilidade de ocorrência de um dado acontecimento. O estudo do sinal pertence ao limiar inferior da semiótica [estamos ainda no domínio da teoria matemática da informação]; por isso, estuda o código, o ruído e a redundância. Há ainda um limiar superior da semiótica, a concepção do mundo [Weltanschauungen], o domínio do mítico e do ideológico.

O professor situa o campo semiótico no meio desses dois limiares e define semiótica “como objecto de estudo as componentes expressivas ou significantes das manifestações culturais”. Mas, ainda segundo Rodrigues, toda a acção humana é significante, expressiva, pelo que a semiótica se serve do estudo de disciplinas como a sociologia, a economia ou a história. A semiótica é, assim, também o “estudo do arranjo, da organização específica que as manifestações do sentido apresentam”; ela é do domínio dos signos, entidades que se referem e/ou designam as coisas sob o modo de representação ou da cópia. Os signos possuem uma significação (ordem do conceito que permite compreender uma série de entidades particulares).

Adriano Duarte Rodrigues, como o faria Roland Barthes, parte de Ferdinand de Saussure, o pai da linguística, o qual se propôs distinguir entre parole (acto individual da fala) e langue (aspecto colectivo). A langue é de natureza institucional, arbitrária (fundada numa convenção) e linear (desenrolada no tempo). A língua constitui-se em dois tipos de relações: paradigmáticas e sintagmáticas. Além disso, uma aparente contradição mutável/imutável do signo linguístico resolve-se na oposição do aspecto sincrónico do sistema e a sua evolução diacrónica. Alguns destes temas seriam mais desenvolvidos no texto de Barthes.

Roland Barthes (1915-1980)

Este autor compara signo, sinal, índice, ícone, símbolo e alegoria, referindo a simultânea aproximação e distinção. Ora, o signo remete para a relação de dois termos ou elementos [relata] que implicam ou não a representação psíquica de um deles, a analogia, a imediatez do estímulo e resposta, a coincidência e a ligação. Deslocando-se para a figura do “pai fundador”, Saussure, este definiu signo como a união de um significante e de um significado, de uma imagem acústica e de um conceito.

A teoria do signo linguístico enriqueceu-se com o princípio da dupla articulação: 1ª articulação – unidades significativas, dotadas de sentido (palavras ou monemas), 2ª articulação – unidades distintivas, que participam na forma mas não têm um sentido (sons ou fonemas). A dupla articulação dá conta da economia da linguagem humana. O plano dos significantes constitui o plano de expressão e o dos significados o plano de conteúdos, ou a forma e a substância (obtido de empréstimo em Louis Hjelmslev).

Sobre o significado, Saussure marcou a sua natureza psíquica, chamando-lhe conceito: o significado da palavra boi não é o animal boi, mas a sua imagem psíquica. O significante é um termo puro, pois não se pode separar da definição de significado. A substância do significante é sempre material (sons, objectos, imagens). Há signos verbais, gráficos, icónicos e gestuais. O signo é talhado (biface) de sonoridade ou visualidade. A significação é um processo ou acto que une o significante ao significado e cujo produto é o signo. Na língua, o significado está atrás do significante e só pode ser atingido através deste: Se (significante)/So(significado).

Há um valor no signo, com dois termos: se se modificar um dos seus termos, modifica-se o sistema. Esses termos ou planos de valor no signo são: 1) sintagma, 2) associação (paradigma) [sistema, na linguagem de Barthes]. Cada termo fixa o seu valor da oposição com os que estão antes e depois. Na cadeia de palavras, os termos reúnem-se presencialmente. É o plano dos sintagmas. No plano das associações, as associações têm entre si coisas em comum, formam grupos em que existem relações diversas. Para Saussure, o sistema é uma série de campos associativos, ou determinados por afinidades de sons ou de sentido. A organização interna de um campo associativo ou paradigma chama-se oposição, relação ou correlação.

A linguagem humana, por ser duplamente articulada, comporta duas espécies de oposições – distintivas (entre fonemas) e significativas (entre monemas). Qualquer sistema de significação comporta um plano de expressão (E) e um plano de conteúdo (C). Há um plano de denotação e um plano de conotação. Um sistema conotado é um sistema cujo plano de expressão é ele próprio constituído por um sistema de significação. A sociedade desenvolve-se a partir do sistema da linguagem humana, sistemas segundos de sentido.

Curiosa a comparação de Saussure: cada unidade linguística é semelhante à coluna de um edifício antigo; essa coluna mantém uma relação real de contiguidade com outras partes do edifício (relação sintagmática). Se a coluna for dórica somos levados a compará-la com outras ordens arquitecturais, o jónico ou o coríntio (relação associativa, paradigmática ou sistemática). O plano associativo aproxima-se da língua como sistema; o sintagma aproxima-se da fala.

Em Elementos de semiologia (1981), editado inicialmente em 1964, Barthes definiu a semiologia como tendo “por objecto qualquer sistema de signos, sejam quais forem a sua substância ou os seus limites: as imagens, os gestos, os sons melódicos, os objectos e os complexos dessas substâncias que encontramos nos ritos, nos protocolos ou nos espectáculos constituem, senão «linguagens», pelo menos sistemas de significação”. Barthes ordenou os elementos fundamentais da semiologia em quatro rubricas: 1) língua e fala; 2) significante e significado; sistema (ou paradigma) e sintagma; 4) denotação e conotação.

Para o estudo do discurso dos media, dois desses binómios foram essenciais: significante/significado e denotação/conotação. A denotação é a significação óbvia, de senso comum, do signo. A conotação é quando o signo se encontra com os sentimentos e emoções dos utilizadores e com os valores da sua cultura. Numa fotografia, a denotação é aquilo que é fotografado; a conotação é a forma como algo é fotografado. A conotação é arbitrária e específica de uma cultura. Em O óbvio e o obtuso (1984:14-15), Barthes escreveu: “Qual o conteúdo da mensagem fotográfica? O que é que a fotografia transmite? Por definição, a própria cena, o real literal. (...) Existem outras mensagens sem código? À primeira vista, sim: são precisamente todas as reproduções analógicas da realidade: desenhos, pinturas, cinema, teatro. Mas, efectivamente, cada uma destas mensagens desenvolve de uma maneira imediata e evidente, além do próprio conteúdo analógico (cena, objecto, paisagem), uma mensagem complementar, que é aquilo a que se chama vulgarmente o estilo da reprodução; trata-se, então, de um sentido segundo, cujo significante é um certo «tratamento» da imagem sob a acção do criador, e cujo significado, quer estético, quer ideológico, remete para uma certa «cultura» da sociedade que recebe a mensagem. Em suma, todas estas «artes» imitativas comportam duas mensagens: uma mensagem denotada, que é o próprio analogon, e uma mensagem conotada, que é o modo como a sociedade dá a ler, em certa medida, o que pensa dela”.

[leituras: Roland Barthes (1981). Elementos de semiologia. Lisboa: Edições 70 (originais de 1964); Roland Barthes (1984). O óbvio e o obtuso. Lisboa: Edições 70 (original de 1982)].

Charles Sanders Peirce (Écrits sur le signe, 1978: 147-165)

Para o filósofo e lógico Peirce (1839-1914), um signo ou representante é o primeiro elemento de uma relação triádica que estabelece ligação a um segundo elemento chamado objecto e que pode determinar um terceiro elemento chamado interpretante, que também se relaciona com o objecto. O signo ou representante é aquilo que substitui qualquer coisa por alguém, isto é, significa na ausência. O interpretante é o conceito mental do utente do signo, seja orador ou ouvinte. Descodificar é uma actividade tão importante como codificar. Peirce produziu três tipos de signo (1978: 148-165).

Os signos dividem-se em ícones, índices e símbolos. Um ícone é um substituto de uma coisa a que se assemelha. Uma mensagem material como um quadro é um elemento convencional no seu modo de representação. As fotografias são elementos icónicos. A fotografia no BI é um elemento icónico que me representa. Um índice é um elemento de autenticidade. Um relógio indica-nos as horas. Um barómetro com baixa pressão e o ar húmido são índices de chuva próxima. Diz-se que não há fumo (índice) sem fogo (realidade). Um índice é uma representação que reenvia para o seu objecto não pela semelhança ou analogia, mas porque há uma ligação dinâmica. O símbolo é uma réplica ou materialização de uma palavra pronunciada. A bandeira nacional ou um sinal do código de estrada são símbolos. Um símbolo é um signo próprio para declarar que o conjunto de objectos denotados por um conjunto de índices que se lhe associam. Um símbolo não indica uma coisa em particular, denota um género de coisa.

sexta-feira, 31 de outubro de 2003

JOSEPH KLAPPER

Joseph Thomas Klapper nasceu em Nova Iorque (1917) e ensinou na Universidade de Columbia. Foi membro de vários institutos de investigação em comunicação de massa. A sua obra principal tem o título The Effects of Mass Communication (1960), patrocinada pela CBS (Columbia Broadcasting System, Inc.).

Programa do texto

O que se propõe estudar Klapper? Estudar os efeitos da comunicação de massa, pondo de lado a teoria dos efeitos ilimitados. Mas reconhece o pessimismo em desenvolver a sua teoria (p. 162). O pessimismo deriva do facto de, em muitos estudos, não haver uma resposta definitiva a perguntas como: os media geram violência? Os media elevam ou não o gosto do público? E refere uma conclusão de Berelson, que serve para todas as respostas: "certos tipos de comunicação em certos tipos de questões, levados à atenção de certo tipo de pessoas sob certas condições produzem certos tipos de efeitos".

O texto define-se em dois pontos: 1) nova orientação do estudo dos efeitos de comunicação, 2) aparecimento de algumas generalizações (p. 167). É nestas generalizações que consiste o valor acrescentado do texto de Klapper, afastando-se definitivamente da teoria hipodérmica. Vale a pena ler com atenção a referida página 167 e seguintes. O autor indica que os media não determinam os gostos mas podem ser usados em conformidade com os gostos. E destaca o peso dos grupos primários, secundários e de referência. É a defesa total da teoria dos efeitos limitados, com o recurso aos dois níveis de fluxo de comunicação e ao peso dos líderes de opinião. Em conclusão, a comunicação interpessoal tem um peso semelhante ao da comunicação dos media. Assim, e como conclusão, Klapper foca o reforço e a mudança distribuidos pelos media e pelos grupos primários, dentro de uma dinâmica geral (p. 171).

Media e persuasão

Embora concordasse com a teoria dos usos e gratificações, Klapper introduziu uma alteração importante. Para ele, quando alguém acreditava numa coisa, isso devia-se à influência cruzada da família, grupo de amigos, religião, escola, emprego ou classe social. Os media podiam reforçar a crença de um modo positivo ou negativo. O livro ocupa-se da comunicação de massa enquanto agente de persuasão e dos efeitos de determinadas classes de conteúdos dos media, a quem se atribui consequências psicológicas e sociais.

Das questões já trabalhadas anteriormente por Klapper destacam-se as seguintes: 1) a violência dos media gera delinquência?, 2) os media elevam ou diminuem o gosto do público?, 3) os media geram passividade do público? O autor analisa o grande interesse da comunicação de massa sobre as opiniões e atitudes humanas. A base inicial seria a teoria hipodérmica, que via a elevada influência da propaganda nas campanhas eleitorais, quer em estudos de caso quer em experiências laboratoriais, em pequenos grupos e inquéritos a milhares de pessoas.

Mas Klapper, na sua investigação, definia direcções de efeitos, já não acreditando na influência directa e total. Daí, dedicar espaço aos efeitos de reforço, aos fenómenos de conversão e à criação de opiniões e atitudes sobre novas questões. Pergunta: “o que é que ocorre quando os media começam a falar sobre algo que nunca se tinha falado antes”? Nessa altura, concluía Klapper – e apenas nessa altura –, os media conseguiam moldar e influenciar directamente a opinião pública, levando-a a uma dada perspectiva. Só nessas raras ocasiões os media influenciavam o público, até que a rede de factores sociais se apoderava do tema e readquiria o poder de influenciar a opinião pública.

É o novo enfoque (Klapper, 1978: 165), a que chama situacional, fenoménico ou funcional, "desvio da tendência que considera a comunicação de massa como uma causa necessária e suficiente dos efeitos de audiência, para um enfoque dos media como influências, trabalhando juntamente com outras influências, numa situação total". O novo enfoque conduz a uma série de generalizações, uma das quais considera que a comunicação de massa é um dos factores que exerce influência sobre uma audiência.

Leituras: J. T. Klapper (1974). Effectos de las comunicaciones de masas. Madrid: Aguilar (original de 1960) Joseph T. Klapper (1978). "Os efeitos da comunicação de massa". In Gabriel Cohn (org.) Comunicação e indústria cultural. S. Paulo: Companhia Editora Nacional (original de 1957/58) (pp. 162-173).

sábado, 25 de outubro de 2003

LAZARSFELD E MERTON (texto de 1948)

O programa do texto é o seguinte: 1) investigar o que se sabe a respeito dos efeitos, 2) examinar a propriedade e estrutura dos media, 3) ter um conhecimento relativo aos efeitos dos conteúdos particulares (p. 233). O texto articula-se em três aspectos:

A) Presença e poder dos media. Trata-se de um poderoso instrumento usado para fins positivos ou negativos (p. 231). Os autores destacam estes últimos; na falta de controlo há propaganda. As técnicas de manipulação incluem as relações públicas, o patrocínio de programas de rádio, os concursos com distribuição de prémios, as fundações culturais. Lazarsfeld e Merton temem os efeitos dos media na cultura popular e no gosto estético dos públicos (p. 232).

B) Funções dos media. Os autores são funcionalistas; por isso, conferem funções aos media: 1) atribuição de estatuto, dado que os media conferem estatuto a entidades individuais ou colectivas, elevando a imagem [ou também a destruindo]; 2) execução de normas sociais, pois, ao revelarem desvios ou situações sociais discordantes, estão a apontar ou projectar o conformismo social; 3) disfunção narcotizante, que opera no sentido oposto ao de uma norma, com os media a tornarem as pessoas insensíveis aos problemas, mas apenas de um ponto de vista superficial (p. 241). Há, aqui, o início da crítica à teoria dos efeitos ilimitados, substituidos por uma teoria mais benigna, como se observa no ponto seguinte do texto.

C) Propaganda com objectivos sociais. Os media são poderosos somente em três condições: 1) monopólio, quando há um controlo total do que se escreve por parte do Estado ou de uma entidade económica (p. 248); 2) canalização [prefiro o termo orientação], exemplificada na publicidade que procura convencer; 3) suplementação [prefiro o termo suplementar], através da conjugação dos efeitos dos media com a eficácia dos contactos pessoais (p. 252).

É a teoria dos efeitos limitados, com o relevo a dar à posição de líderes de opinião, que filtram as mensagens segundo a concepção dos "dois passos do fluxo de comunicação". Outro ponto importante do texto. Pela estrutura de propriedade dos media avalia-se o reforço do conformismo social, dado que os media são financiados por interesses económicos [ou políticos] e contribuem para a manutenção de um dado sistema social (p. 242). Os media comerciais estão mais interessados em estimular preferências de produtos ou marcas que efectuar mudanças radicais (p. 253).

Crítica ao texto

Após a longa duração do paradigma administrativo ou teoria dos efeitos limitados, constatou-se que o poder dos media era mais elevado, em especial devido ao impacto da televisão. A revisão foi dada pelos contributos das teorias dos efeitos cognitivos, a partir dos anos de 1970. Por outro lado, Lazarsfeld e Merton deram relevo à comunicação interpessoal, em equilíbrio com a comunicação mediática, o que implicaria uma interligação social forte, não existente na sociedade de massa.

Leitura: Paul Lazarsfeld e Robert Merton (1978). "Comunicação de massa, gosto popular e acção social organizada". No livro de Gabriel Cohn (org.) Comunicação e indústria cultural. S. Paulo: Companhia Editora Nacional (texto original de 1948).

quarta-feira, 15 de outubro de 2003

TEORIA FUNCIONALISTA

Interacção

Afastado o receio da teoria dos efeitos ilimitados, em décadas anteriores, em que se julgava que a mensagem atingia completamente o receptor ou audiência, equacionava-se o efeito limitado da mensagem dos meios de massa sobre a audiência. Contudo, a expansão da televisão - que começou a sua época de ouro nos Estados Unidos nos anos 50 - fazia abandonar a ideia de considerar o meio electrónico como instrumento de formação, educação e informação, mas acentuava o espectro da influência negativa, como autismo, dependência e delinquência.

Sucederam-se investigações para aprofundar a questão. Um dos autores com maior notoriedade seria Wilbur Schramm, ligado à universidade de Stanford. Em 1961, após três anos de investigação bem financiada, em que entrevistou seis mil crianças e dois mil pais, publicou resultados. O contributo de Schramm e do grupo de Stanford a si associado salientaria a interacção entre a televisão e os tespectadores. Isto é: a televisão seria perigosa para uns e benéfica para outros, o que não adiantou muito, portanto. E o conceito de interacção do meio com a audiência, apesar de promissor, ainda não estava suficientemente verificado no terreno.

Análise funcional

Dentro da ideia de interacção, de que Schramm foi um dos agentes, Robert Merton definiria como análise funcional a sociedade vista enquanto sistema que tende para o equilíbrio. A sociedade constitui um sistema, composto de subsistemas funcionais, que se propõem resolver problemas no seu interior. Ao invés, uma actividade (social, por exemplo) desempenha uma parcela no conjunto do sistema. Resumindo: a sociedade consiste em conjuntos complexos cujas actividades parcelares se interrelacionam, umas apoiadas nas outras. Merton publicou textos importantes como Social theory and social structure (1949) e On theoretical sociology (1967). Nele, um sistema diz-se funcional se a prática contribui para manter essa estrutura, ao passo que disfuncional é uma prática de ruptura. Além disso, distingue funções manifestas (visíveis) e latentes (não intencionais e difíceis de observar).

Estava-se já longe da perpectiva de influência imediata, da relação estímulo/resposta, e entrava-se numa investigação que atendia aos contextos e à interacção social dos receptores. O destinatário deixava de ser receptor passivo e passava a ser sujeito activo comunicativo.

Hipótese dos usos e gratificações

A teoria dos usos e gratificações insere-se em tal lógica: há influência social se um grupo social tem um interesse e se relaciona com o interesse de outro grupo. Mauro Wolf (Teorias da comunicação) analisou esta teoria. Para ele, as funções dos media são: 1) fornecer informação; 2) fornecer interpretação; 3) exprimir valores culturais e simbólicos; 4) fornecer entretenimento. Os media podem reforçar a posição social dos seus leitores e reforçar as normas sociais. Considera ainda Wolf que a hipótese dos usos e gratificações explica o consumo e os efeitos dos meios de comunicação de massa em função das motivações e das vantagens recebidas pelo destinatário.

Credita-se a Herta Herzog, antiga colaboradora de Lazarsfeld, a designação dos usos e gratificações. Num artigo seu, publicado em 1944, ela analisou o trabalho que fez junto de ouvintes de radionovelas. Mais do que medir a influência exercida pelas novelas transmitidas pela rádio, Herzog quis conhecer as razões e experiências destas fãs, os seus usos e gratificações. E descobriu que as mulheres que ouviam as novelas o faziam por: 1) prazer emocional; 2) oportunidade para pensar de modo inteligente; 3) aconselhamento.

Leituras: Mauro Wolf (1987). Teorias da comunicação. Lisboa: Presença

Stanley J. Baran e Dennis K. Davis (2003). Mass communication theory. Foundations, ferment, and future. Belmont: Thompson, 3ª ed.

terça-feira, 14 de outubro de 2003

O MODELO COMUNICACIONAL DE LASSWELL

Os anos de 1930 assistiram a um ambiente de forte conturbação – social, económica e política, com o surgimento dos totalitarismos. Ao mesmo tempo, os media – imprensa, rádio – registavam um grande desenvolvimento. Nascia a primeira teoria da comunicação, baptizada de efeitos ilimitados, da agulha hipodérmica (designação originada em Harold Lasswell) ou da bala. Entendia-se que os meios de comunicação (imprensa, rádio) exerciam um efeito poderoso, total e directo sobre o público e a massa.

Harold Lasswell (1902-1978), psicólogo e investigador nas áreas de política e das ciências sociais, é bastante conhecido pelo seu modelo de comunicação: quem diz o quê a quem, por que canal e com que efeito. O primeiro quem controla a mensagem, o segundo quem é a audiência ou receptores, o quê é a matéria comunicada, o canal conduz à análise dos media, o efeito é a reacção do público.

Um dos mais importantes trabalhos de Lasswell foi Propaganda technique in world war (1927), em que desenvolve o conceito de propaganda. Para Lasswell, a propaganda tem quatro objectivos prioritários: 1) mobilizar o ódio contra o inimigo, por meio de histórias de grande atrocidade; 2) manter a amizade dos aliados; 3) preservar a amizade e procurar a cooperação dos que se mantêm neutros; 4) desmoralizar o inimigo. A propaganda, segundo Lasswell, é a técnica de influenciar a acção humana através da manipulação das representações, como símbolos, por meio de rumores, relatos, imagens e outras formas de comunicação social.

Lasswell estudou particularmente a campanha governamental que fez alterar a opinião pública americana de uma posição anti-guerra para uma de pró-guerra e contra a Alemanha (I Guerra Mundial). Ele via na propaganda um utensílio essencial para a gestão governamental da opinião, isto é, a necessidade de gerar o apoio das massas ao seu governo. Mais tarde, Carl Hovland e um grupo de psicólogos de Yale editavam um livro, onde se descreviam experiências efectuadas durante a I Guerra Mundial sobre o exército americano, também a propósito da propaganda (1949).

Estávamos no começo da Mass Communication Research, a cargo de Lasswell, e centrada em dois eixos: os efeitos das mensagens dos media e a análise de conteúdo para descobrir as razões da influência directa total sobre as audiências, então atribuída aos media. A teoria linear da agulha hipodérmica – um modelo directo de causa e efeito – procurava trabalhar a forma de melhor influenciar os públicos.

Lasswell foi, sucessivamente, professor nas universidades de Milikan, Chicago, Columbia e Yale.

Passagem do modelo da agulha hipodérmica para o efeito limitado dos media

Menos interessado em dividir o acto de comunicação nas várias partes e mais interessado em examinar o todo face ao processo social global, Lasswell considera as três funções do processo de comunicação: 1) vigilância sobre o meio ambiente, que revelam ameaças e oportunidades que afectam a comunidade, em termos de valores; 2) correlação de forças entre os componentes da sociedade, 3) transmissão da herança social (Lasswell, 1978: 117).

Este texto, inicialmente impresso em 1948, mostra a transição feita pelo autor da teoria hipodérmica para a dos efeitos limitados. Ele destaca os líderes grupais especializados, que desempenham papéis específicos de vigilância sobre o meio e conduzem estruturas de atenção, proporcionando uma determinada condutibilidade da mensagem (1978: 107). Além disso, as mensagens ocorrem dentro do Estado mas envolvem mais os canais familiares, a vizinhança, os grupos e os contextos locais (1978: 109), podendo existir a comunicação em dois sentidos (a retroacção). Estava-se na segunda função apontada pelo autor, a correlação de forças entre os componentes da sociedade, e que conduz ao terceiro elemento do processo social: a transmissão de valores de geração para geração. Ideais como esclarecimento, respeito ou bem-estar sucedem ao longo das gerações como valores pilares de uma sociedade (1978: 111), os miranda (termo latino que designa os valores dignos de admiração e respeito), moldados e distribuídos nas instituições, como o lar e a escola.

Leituras: Harold Lasswell (1978). “A estrutura e a função da comunicação na sociedade”. In Gabriel Cohn (org.) Comunicação e indústria cultural. S. Paulo: Companhia Editora Nacional (original de 1948) (pp. 105-117), ou
Harold Lasswell (2002). “A estrutura e a função da comunicação na sociedade”. In João Pissarra Esteves (org.) Comunicação e sociedade. Lisboa: Livros Horizonte e CIMJ (pp. 49-60)

terça-feira, 7 de outubro de 2003

LIVRO DE JOÃO PISSARRA ESTEVES

[João Pissarra Esteves (org.) (2002). Comunicação e sociedade. Lisboa: Livros Horizonte e CIMJ, 159 páginas]

Professor na Universidade Nova de Lisboa, João Pissarra Esteves reuniu um conjunto de textos marcantes na problemática dos efeitos dos media. O livro começa com uma introdução do autor, onde se faz uma breve resenha histórica dos efeitos ilimitados ou teoria hipodérmica, a viragem iniciada por Paul Lazarsfeld, com a teoria dos efeitos limitados ou orientação administrativa, de produção de conhecimento útil, o declínio desta e a ascensão das teorias dos efeitos cognitivos (agendamento, newsmaking, diferencial cognitivo).

Depois, considera Pissarra Esteves, assistiu-se a um trabalho reconstrutivo, tendo por base a crítica ao paradigma dominante e a partir de de múltiplas direcções. Refere, nomeadamente, os interesses e os fins que dominam o sistema dos media, as configurações e transformações institucionais, a sua repercussão nos universos simbólicos das sociedades actuais e as relações estabelecidas com as aspirações e os interesses humanos (p. 26). No texto de introdução, Pissarra Esteves enquadra as teorias dos efeitos nas circunstâncias históricas e sociais dos anos 30 do século passado.

As tecnologias de difusão colectiva de mensagens estavam em grande desenvolvimento: imprensa de massa, rádio e, depois, televisão. Havia a ideia do enorme poder dos meios de comunicação (p. 15); daí se considerar que a comunicação de massa exercia um efeito total, directo e irreversível sobre o público. O poder dos media tornava-se propaganda, numa lógica de estímulo-resposta a uma mensagem. Harold Lasswell forneceu sistematização à teoria dos efeitos totais, embora se considere que esta teoria foi mais um corpo de conhecimentos do que propriamente uma teoria (ver também o livro de Mauro Wolf, Los efectos sociales de los media, editado em 1994).

Com a continuação de estudos empíricos, constatou-se que, afinal, as mensagens dos media não exerciam um efeito total e manipulador. Passava-se a olhar os media como exercendo um efeito limitado. Paul Lazarsfeld, que apostou no trabalho empírico, traçou a concepção do "fluxo de comunicação em dois níveis" e destacou o papel dos líderes de opinião na formação dos efeitos das mensagens. A teoria dos efeitos limitados assumiria a posição de paradigma dominante (p. 21). As universidades americanas recebiam encomendas de estudos para saber o modo como um público ou audiência reagiam à introdução de novos produtos ou a campanhas (publicitárias, políticas e outras). Depois, a partir dos anos 70, com as transformações registadas, caso da expansão da televisão, o modelo de efeitos limitados era posto em causa. Desde então, entende-se os efeitos dos media como indirectos e com carácter cumulativo (p. 23).

Esta importante antologia, que divulga clássicos da sociologia da comunicação, traz textos de: Robert Park; Harold Lasswell; Elihu Katz; Tichenor, Donohue e Olien; Gaye Tuchman; Todd Gitlin; e Elizabeth Noelle-Neumann.

Em Gitlin, é feita a crítica do paradigma dominante de Lazarsfeld, a sua ligação a Theodor Adorno e posterior afastamento. Gitlin explora, nomeadamente, o ponto de vista administrativo do trabalho de Lazarsfeld (e dos seus colaboradores), preocupado em especial com a realização de projectos de investigação em domínios comerciais (p. 125). Por exemplo, as publicações americanas Macfadden, detentoras da revista True Story, queriam conhecer o perfil das suas leitoras. O projecto de Lazarsfeld, patrocinado por aquela entidade editora, trouxe informações sobre os gostos e o sentido de compras das leitoras da revista, extrapolados para um público mais vasto em termos de escolhas e consumo (p. 135).

Pissarra Esteves tem uma importante obra publicada, com destaque para A ética da comunicação e os media modernos (1998) e Espaço público e democracia (2003). Seleccionou e apresentou o texto Niklas Luhmann: a improbabilidade da comunicação (1993).

segunda-feira, 4 de agosto de 2003

A) Definições de indústria cultural

Adorno e Horkheimer: substituíram a expressão cultura de massa por indústria cultural. No seu livro Dialéctica do Esclarecimento (1944), Adorno e Horkheimer escreveram que o cinema e a rádio já não são uma arte mas um negócio e definem-se a si mesmos como indústrias. E descrevem o carácter de montagem da indústria cultural com a fabricação sintética e dirigida dos seus produtos, industrial no estúdio cinematográfico, nas biografias baratas, romances-reportagem e canções de sucesso. Outros autores definiram as indústrias culturais como o conjunto de actividades industriais e de distribuição de mercadorias, com conteúdos simbólicos, concebidas por um trabalho criativo, organizadas por um capital económico a valorizar e destinadas aos processos de consumo, com uma função de reprodução ideológica e social (Ramón Zallo, 1992). Também a socióloga portuguesa Maria de Lourdes Lima dos Santos as definiu enquanto bens e serviços culturais que se produzem, reproduzem e difundem segundo critérios comerciais e industriais, quando há produção em série. Para a Comissão Interministerial para o Audiovisual (1997), as indústrias culturais implicam a progressiva desmaterialização dos processos de produção e distribuição, a partir da seguinte cadeia de valor: design, produção, distribuição, comércio e indústria (CIMA). Finalmente, podem entender-se como actividade centrada sobre as empresas, mercados e clientes de conteúdos culturais, tendo como fundamento a sua transformação e difusão permanentes de modo a acrescentar-lhes valor e a criar utilidade económica (Forum M, grupo dirigido por Roberto Carneiro).

B) Quais as indústrias culturais a considerar na nossa definição?

1) Imprensa, rádio, cinema, televisão, disco; 2) Publicidade, turismo, moda, organização de espectáculos; 3) Videojogos; 4) Internet.

C) Cadeia de valor [aplicação a Portugal]

1) Na produção - Tem havido fortes oscilações. Grande produção de cinema pós-1974; grande produção televisiva pós-1992 (com o arranque dos canais privados). Produção estável de livros. Aumento de produção discográfica (e em novos suportes: CD, DVD). Expansão dos videojogos. 2) Na distribuição - Maior oferta. Nos media, há novos canais: Internet, televisão por cabo, futura televisão digital terrestre, telemóveis. 3) Na recepção - Alteração de consumos. Quebra de espectadores de cinema na década de 80 e primeira metade da década seguinte; recuperação a partir de 1996 (cerca de), com as salas multiplex. Sobrevalência dos consumos indoor (domiciliários), em especial a televisão.

Novas características

Função do agente de promoção e divulgação cultural. Actividade de maior relevo no último quarto de século; em especial após as inaugurações do CCB e da Culturgest (1993), de Lisboa capital da Cultura (1994) e da Expo’98. Banalização da prática de divulgação de programas culturais e no interesse do marketing cultural.

D) Caracterização das indústrias culturais (media clássicos)

1) Maior investimento publicitário na televisão do que na imprensa e na rádio. Contudo, o mercado português é pequeno: o investimento publicitário audiovisual é 13,6% do de Espanha, por exemplo (relação de 1/5 na população); 2) O volume de negócios na televisão de sinal aberto é o mais pequeno dos países da União Europeia (10% do total do mercado espanhol e metade do mercado grego); 3) Investimentos publicitários na rádio – 6,8% do total; 4) Baixa circulação de jornais diários (91,2 exemplares por 1000 habitantes) (no Reino Unido: 383,4 exemplares por 1000 habitantes); 5) Baixo nível de audiências dos canais públicos em Portugal (25,7%) quando comparado com a média dos cinco países mais fortes da União Europeia (38%); 6) Portugal paga das taxas de radiodifusão mais baixas (16,7 € por ano) e o segundo valor mais elevado de serviços de cabo (18,3 € mensais); 7) Diversificação de receitas no sector audiovisual, caso das mensagens SMS.

E) Caracterização das indústrias de conteúdos culturais e seus consumos (novos media) (Forum M)

1) Micro-dimensão das indústrias. Empresas recentes. Carência em termos de formação em gestão – para além de produzir, criar e ganhar competências específicas, é preciso liderar e administrar; 2) Consumo elevado de televisão, música e rádio, com baixa prática de leitura de jornais e consumo emergente nos centros comerciais; 3) Necessidade de desenvolver feixes de actividades industriais na cultura; 4) Necessidade de visão estratégica do Estado; 5) Criação de um mercado lusófono e criação de competências para a produção e colocação de produtos de cultura nos mercados de grandes dimensões. Isto é: estimular o mercado, valorizar as bases de dados públicas e consolidar factores estruturantes das ICC.

F) Tendências do mercado actual e prospectiva (nível tecnológico)

Cenário actual
Lento crescimento das plataformas de canais múltiplos e/ou digital. Manutenção do share de audiências de canais em sinal aberto. Redução do poder financeiro e consolidação dos operadores. Criação de grandes grupos integrados e internacionais. Ganhos de receitas em assinaturas, telecompras, merchandising e comissões SMS.

Cenário optimista
Avanços tecnológicos combinados (banda larga no lacete local), queda contínua de preços e emergência de novos formatos de compressão de conteúdo. Aumento de assinaturas e de outras novas formas de receita (telecompras, merchandising, comissões SMS). Consumo repartido entre televisão, novos serviços de Internet e jogos on-line e em telemóvel. Novas oportunidades para os produtores de conteúdo nos meios tradicionais e, em especial, nas novas plataformas. Maiores receitas para os detentores de direitos, devido ao aumento de produção de conteúdos.

quinta-feira, 3 de abril de 2003

Valentim de Carvalho - um homem da indústria discográfica a recordar

Valentim de Carvalho nasceu na freguesia de Santa Isabel, em Lisboa, a 14 de Fevereiro de 1888, dia de São Valentim [daí o seu primeiro nome]. Os pais eram de Maxial, junto a Torres Vedras. A primeira casa de Valentim de Carvalho foi em Campo de Ourique, onde o pai tinha uma casa de pasto (restaurante), na esquina da rua Ferreira Borges com a rua Correia Teles. A família vivia no primeiro andar, sobre o armazém. A mãe queria que o jovem estudasse, mas, muito doente, não conseguiu impor a sua visão. Desde cedo, Valentim de Carvalho dedicar-se-ia à actividade comercial, primeiro como colaborador e, mais tarde, como empresário.

Assim, desde 1914, ocupava a rua da Assunção, 39, onde vendia nomeadamente capas e letras de músicas (de revistas). Depois, em 1923, ocupa também o até então chamado salão Neuparth [cujo nome mantém], à rua Nova do Almada, 95 a 99, no Chiado. O estabelecimento fora fundado por Eduardo Neuparth em 1824, ligado à música. Valentim vendia gramofones, discos, pianos e músicas. Ainda em 1923 edita o conjunto da obra de António Fragoso, considerado então a principal figura da música portuguesa. Desenvolvia-se o salão Neuparth, com publicidade feita com desenho de Stuart Carvalhais, em estilo jazzband, e na altura em que o cancan e o charleston se ouviam nos discos.

Valentim de Carvalho casaria com Maria Alice Marques, colega do conservatório da sua irmã Etelvina. Maria Alice foi fadista e uma das primeiras meninas da rádio e do disco. Para além das músicas da mulher, o catálogo discográfico da casa Valentim de Carvalho confunde-se com a edição de discos no nosso país. No fado como noutros tipos de música. Ainda hoje - embora já não ocupe a mítica loja do Chiado, que ardeu com o incêndio de 1988, e de a marca pertencer a outros proprietários - o nome Valentim de Carvalho é respeitado.

Existe já um livro sobre Valentim de Carvalho - e que me serviu para editar esta nota -, escrito por José Sarmento de Matos (Sons de Lisboa. Uma biografia de Valentim de Carvalho, 1989. Lisboa: Pub. D. Quixote/Valentim de Carvalho), muito desigual no conteúdo mas deveras interessante quanto a reproduções de capas de discos. Por isso, considero que ainda há muito a fazer para o verdadeiro balanço - estético, cultural, industrial e económico - da obra do empresário.

segunda-feira, 17 de março de 2003

OBJECTIVOS DO BLOGUE

Este blogue destina-se a apresentar textos sobre indústrias culturais (imprensa, rádio, televisão, internet, videojogos, publicidade).