Patilhas e Ventoinha foram duas personagens que marcaram muito a vida dos Parodiantes de Lisboa (1947-2007), grupo de humoristas que trabalharam na rádio, nomeadamente no Rádio Clube Português. Eles começariam com um programa que se chamava Meia Bola e Força, à segunda-feira. Depois, alargaram horários e temas até passarem a ter rubricas diárias. A graça deles combinada com a publicidade que afluía ao programa tornaram-nos famosos e com bom retorno financeiro. Na foto de cima, da esquerda para a direita: Fernando de Almeida, Callaty Santos, António Gomes d’Almeida, Francisco Ataíde, Maria Artur, Ruy Andrade, Gomes Ferreira, Maria Eduarda, João Capela, Eduardo Andrade, Lívia Jacques e José Andrade. Publicação de 1962, com textos de António Gomes d’Almeida, Ruy Andrade e Manuel Puga.
Textos de Rogério Santos, com reflexões e atualidade sobre indústrias culturais (imprensa, rádio, televisão, internet, cinema, videojogos, música, livros, centros comerciais) e criativas (museus, exposições, teatro, espetáculos). Na blogosfera desde 2002.
domingo, 27 de julho de 2014
Parodiantes de Lisboa
Patilhas e Ventoinha foram duas personagens que marcaram muito a vida dos Parodiantes de Lisboa (1947-2007), grupo de humoristas que trabalharam na rádio, nomeadamente no Rádio Clube Português. Eles começariam com um programa que se chamava Meia Bola e Força, à segunda-feira. Depois, alargaram horários e temas até passarem a ter rubricas diárias. A graça deles combinada com a publicidade que afluía ao programa tornaram-nos famosos e com bom retorno financeiro. Na foto de cima, da esquerda para a direita: Fernando de Almeida, Callaty Santos, António Gomes d’Almeida, Francisco Ataíde, Maria Artur, Ruy Andrade, Gomes Ferreira, Maria Eduarda, João Capela, Eduardo Andrade, Lívia Jacques e José Andrade. Publicação de 1962, com textos de António Gomes d’Almeida, Ruy Andrade e Manuel Puga.
sábado, 26 de julho de 2014
A Emigrante
De Varsóvia, recordo o centro histórico todo reconstruído como se fosse um cenário de papel – e os inúmeros monumentos a guerras que assolaram a Polónia (imagem tirada em Outubro de 2010). Não conheço o suficiente a história daquele país, mas recordo ainda o fervor religioso – na missa, os crentes ajoelhavam-se todos para receber a comunhão.
A visão do filme A Emigrante (do ponto de vista do país receptor, os Estados Unidos, é imigrante; a tradução brasileira do título segue, a meu ver bem, o original) trouxe-me essas imagens de um país entalado entre dois colossos – a Alemanha e a Rússia. Se um e outro entram em guerra, a Polónia é envolvida, mesmo que não queira. No momento, a Ucrânia tem um problema próximo pelo facto de ser vizinha da Rússia e por ter muitos habitantes oriundos daquele país de fronteira da Europa com a Ásia.
No filme, as irmãs Magda (Angela Sarafyan) e Ewa (Marion Cotillard) deixam a Polónia devastada pela I Guerra Mundial, onde assistiram à morte dos pais pelos invasores e chegam aos Estados Unidos em 1921. O sonho de uma vida melhor é alimentado pela presença de tios em Nova Iorque (Brooklin). À chegada, Magda é colocada no hospital, por suspeita de tuberculose. A outra irmã, falhado o encontro com os familiares, é vítima de Bruno (Joaquin Phoenix), homem que explora um teatro e um negócio de prostituição.
Como Ewa precisa de dinheiro para pagar os tratamentos à doença da irmã, engrena nos negócios daquele homem que ela detesta. Até que se cruza com Orlando/Emil (Jeremy Renner), primo daquele e também emigrante judeu, ilusionista, e que procura convencer a jovem emigrante a abandonar aquela vida. Uma das discussões acaba com a morte de Emil às mãos de Bruno. Mas uma prostituta que testemunhou de modo anónimo atirou as culpas à polaca. A testemunha precisava da orientação de Bruno e Ewa era uma concorrente na profissão. Ewa vê-se uma vez mais a ser apanhada pela polícia e deportada (já fora denunciada pelo próprio tio, que recebera informação de mau comportamento moral da rapariga na viagem da Europa para a América). É então que Bruno trata do resgate de Magda do hospital e as duas mulheres recebem os bilhetes para viajarem para a Califórnia e acabar o pesadelo.
Registo o impacto das imagens e planos da casa onde Ewa seria acolhida e o balneário público, numa espécie de iniciação. Mas destaco o “teatro dos bandidos”, onde Bruno apresentava as mulheres com designações europeias e asiáticas, atraindo um público masculino imigrante da classe baixa ao teatro de vaudeville ou saloon de concerto. Este oscilava entre o legítimo e o proibido, certamente muito mais perto do último, incluindo a venda ilegal de álcool e o tráfico sexual de raparigas bonitas, espaços ligados ao roubo e assassínios, como lembra Richard Butsch (The Making of American Audiences, 2000, p. 99) e à compra de favores policiais. Ewa era a nova estrela do espectáculo do saloon. Expulso do teatro, Bruno e as mulheres vão representar sob um viaduto, onde os deserdados viviam, sinal da regressão total, como se fossem apenas espíritos e clowns perseguidos pelos polícias.
O sonho de melhor vida mantido por Ewa parecia desmoronar-se ali. Contudo, a fé muito forte, visível na igreja quando se confessa, mantê-la-ia viva e determinada. Ao invés, Bruno fraquejou ao longo do tempo e viu-se até expulso da sociedade de bas-fond onde vivia.
Li que o filme de James Gray (ele próprio descendente de uma família soviética que se mudou para os Estados Unidos) podia ser um representante do cinema italiano dos anos de 1950. Neo-realista, talvez, agora a cores e concentrado no rosto das personagens, nomeadamente o da actriz francesa Marion Cotillard. Li ainda que o realizador explora dois temas que gosta de filmar: o estilo de vida americano e a entrada de imigrantes no país. A entrada na ilha onde está a estátua da Liberdade não me parece muito diferente de há cem anos, com a grande diferença de hoje não haver refugiados europeus à procura do sonho americano de vida.
A visão do filme A Emigrante (do ponto de vista do país receptor, os Estados Unidos, é imigrante; a tradução brasileira do título segue, a meu ver bem, o original) trouxe-me essas imagens de um país entalado entre dois colossos – a Alemanha e a Rússia. Se um e outro entram em guerra, a Polónia é envolvida, mesmo que não queira. No momento, a Ucrânia tem um problema próximo pelo facto de ser vizinha da Rússia e por ter muitos habitantes oriundos daquele país de fronteira da Europa com a Ásia.
No filme, as irmãs Magda (Angela Sarafyan) e Ewa (Marion Cotillard) deixam a Polónia devastada pela I Guerra Mundial, onde assistiram à morte dos pais pelos invasores e chegam aos Estados Unidos em 1921. O sonho de uma vida melhor é alimentado pela presença de tios em Nova Iorque (Brooklin). À chegada, Magda é colocada no hospital, por suspeita de tuberculose. A outra irmã, falhado o encontro com os familiares, é vítima de Bruno (Joaquin Phoenix), homem que explora um teatro e um negócio de prostituição.
Como Ewa precisa de dinheiro para pagar os tratamentos à doença da irmã, engrena nos negócios daquele homem que ela detesta. Até que se cruza com Orlando/Emil (Jeremy Renner), primo daquele e também emigrante judeu, ilusionista, e que procura convencer a jovem emigrante a abandonar aquela vida. Uma das discussões acaba com a morte de Emil às mãos de Bruno. Mas uma prostituta que testemunhou de modo anónimo atirou as culpas à polaca. A testemunha precisava da orientação de Bruno e Ewa era uma concorrente na profissão. Ewa vê-se uma vez mais a ser apanhada pela polícia e deportada (já fora denunciada pelo próprio tio, que recebera informação de mau comportamento moral da rapariga na viagem da Europa para a América). É então que Bruno trata do resgate de Magda do hospital e as duas mulheres recebem os bilhetes para viajarem para a Califórnia e acabar o pesadelo.
Registo o impacto das imagens e planos da casa onde Ewa seria acolhida e o balneário público, numa espécie de iniciação. Mas destaco o “teatro dos bandidos”, onde Bruno apresentava as mulheres com designações europeias e asiáticas, atraindo um público masculino imigrante da classe baixa ao teatro de vaudeville ou saloon de concerto. Este oscilava entre o legítimo e o proibido, certamente muito mais perto do último, incluindo a venda ilegal de álcool e o tráfico sexual de raparigas bonitas, espaços ligados ao roubo e assassínios, como lembra Richard Butsch (The Making of American Audiences, 2000, p. 99) e à compra de favores policiais. Ewa era a nova estrela do espectáculo do saloon. Expulso do teatro, Bruno e as mulheres vão representar sob um viaduto, onde os deserdados viviam, sinal da regressão total, como se fossem apenas espíritos e clowns perseguidos pelos polícias.
O sonho de melhor vida mantido por Ewa parecia desmoronar-se ali. Contudo, a fé muito forte, visível na igreja quando se confessa, mantê-la-ia viva e determinada. Ao invés, Bruno fraquejou ao longo do tempo e viu-se até expulso da sociedade de bas-fond onde vivia.
Li que o filme de James Gray (ele próprio descendente de uma família soviética que se mudou para os Estados Unidos) podia ser um representante do cinema italiano dos anos de 1950. Neo-realista, talvez, agora a cores e concentrado no rosto das personagens, nomeadamente o da actriz francesa Marion Cotillard. Li ainda que o realizador explora dois temas que gosta de filmar: o estilo de vida americano e a entrada de imigrantes no país. A entrada na ilha onde está a estátua da Liberdade não me parece muito diferente de há cem anos, com a grande diferença de hoje não haver refugiados europeus à procura do sonho americano de vida.
quarta-feira, 23 de julho de 2014
A Rádio em Portugal, 1941-1968
Cada livro parece ser mais importante que os anteriores, pois cada um deles tem uma história, uma razão de ser e uma contextualização da investigação e da sua produção. É o que eu penso após a saída de A Rádio em Portugal, 1941-1968, publicado pela Colibri em 2014, e que representa o meu esforço de continuação da escrita da história da rádio em Portugal, após As Vozes da Rádio, 1924-1939, publicado em 2005 pela Editorial Caminho.
Agora, a procura de informação foi ainda mais rica. A jornais, revistas e memórias de profissionais, procurei nos arquivos do SNI e da RTP e ouvi antigos profissionais. Questões como concursos (Rainha e Rei da Rádio), programas em ondas médias e FM, produtores independentes, concursos de locutores do SNI, publicidade, géneros radiofónicos (relatos desportivos, notícias, programas infantis, teatro radiofónico) e censura do Estado Novo foram alguns dos trabalhados no livro. E ainda personalidades da rádio, como Luís Filipe Costa, António Miguel, Fernando Curado Ribeiro, Etelvina Lopes de Almeida, Artur Agostinho, Maria Leonor Magro, Pedro Moutinho, Domingos Lança Moreira, Francisco Igrejas Caeiro, Carlos Silva, Aurélio Carlos Moreira, Jorge Gil, João David Nunes, José Fialho Gouveia e José Nuno Martins.
Se, no período de 1924 ao começo da II Guerra Mundial, a rádio era feita por amadores e curiosos, os senfilistas vindos da telegrafia e da fonia, as estruturas saídas após o conflito mundial eram já profissionais. Alargamento de horários e apoio publicitário fizeram desses anos o período de ouro da rádio. Mesmo com o arranque da RTP em 1957, a rádio aguentou o embate da televisão até ao final da década de 1960.
A rádio - e a sua história - é fascinante, pois é um meio sempre em alteração, inovação e reinvenção. O exemplo da FM do Rádio Clube Português, em 1963, com programação autónoma de ondas médias, fez nascer um grupo de produtores, realizadores e locutores de uma geração pouco ou nada identificada com a ordem cultural e, mesmo, política, mesmo que a estação estivesse comprometida com o regime. Aí nasceu o slogan "Sempre no Ar, Sempre Consigo".
Agora, a procura de informação foi ainda mais rica. A jornais, revistas e memórias de profissionais, procurei nos arquivos do SNI e da RTP e ouvi antigos profissionais. Questões como concursos (Rainha e Rei da Rádio), programas em ondas médias e FM, produtores independentes, concursos de locutores do SNI, publicidade, géneros radiofónicos (relatos desportivos, notícias, programas infantis, teatro radiofónico) e censura do Estado Novo foram alguns dos trabalhados no livro. E ainda personalidades da rádio, como Luís Filipe Costa, António Miguel, Fernando Curado Ribeiro, Etelvina Lopes de Almeida, Artur Agostinho, Maria Leonor Magro, Pedro Moutinho, Domingos Lança Moreira, Francisco Igrejas Caeiro, Carlos Silva, Aurélio Carlos Moreira, Jorge Gil, João David Nunes, José Fialho Gouveia e José Nuno Martins.
Se, no período de 1924 ao começo da II Guerra Mundial, a rádio era feita por amadores e curiosos, os senfilistas vindos da telegrafia e da fonia, as estruturas saídas após o conflito mundial eram já profissionais. Alargamento de horários e apoio publicitário fizeram desses anos o período de ouro da rádio. Mesmo com o arranque da RTP em 1957, a rádio aguentou o embate da televisão até ao final da década de 1960.
A rádio - e a sua história - é fascinante, pois é um meio sempre em alteração, inovação e reinvenção. O exemplo da FM do Rádio Clube Português, em 1963, com programação autónoma de ondas médias, fez nascer um grupo de produtores, realizadores e locutores de uma geração pouco ou nada identificada com a ordem cultural e, mesmo, política, mesmo que a estação estivesse comprometida com o regime. Aí nasceu o slogan "Sempre no Ar, Sempre Consigo".
Diário de Notícias
Com um curto lapso de tempo, surgiram duas obras sobre a história do Diário de Notícias, uma memorialista, assinada por Fernando Pires e segundo a perspectiva dos profissionais, a outra sobre o período de liderança de José Saramago e com uma visão de trabalho académico.
Pires começou a trabalhar nos jornais em 1945. Em 1957, entrou para o quadro do Diário de Notícias, jornal a que pertenceu até 2004, há dez anos, portanto. Ele é, assim, um observador privilegiado do jornal, pelo que escreve sobre a geografia da redacção, a família, a produção e o modo de fazer o jornal, sem esquecer as normas da redacção, treze páginas dactilografadas que Fernando Pires elaborou. Depois, o autor e organizador dá voz a outros jornalistas.
Já o livro de Pedro Marques Gomes começou sob a forma de tese de mestrado, entretanto alargada. O tema é o documento publicado por trinta jornalistas em Agosto de 1975 que não estão contentes com a orientação política do jornal e que origina um longo conflito que acaba em processo de saneamento e despedimento de 24 jornalistas. Nessa altura, o jornal chegava a ter tiragens superiores a cem mil exemplares.
Já o livro de Pedro Marques Gomes começou sob a forma de tese de mestrado, entretanto alargada. O tema é o documento publicado por trinta jornalistas em Agosto de 1975 que não estão contentes com a orientação política do jornal e que origina um longo conflito que acaba em processo de saneamento e despedimento de 24 jornalistas. Nessa altura, o jornal chegava a ter tiragens superiores a cem mil exemplares.
terça-feira, 22 de julho de 2014
Conselho Geral da RTP
Retiro do Expresso online a informação que os nomes das primeiras quatro personalidades a integrar o novo Conselho Geral Independente (CGI) da RTP ficaram definidos hoje. O jornalista e crítico de cinema João Lopes e a investigadora e professora universitária Ana Lourenço foram as escolhas do Governo, enquanto o professor universitário Manuel Pinto e a antiga presidente do Instituto Camões, Simonetta Luz Afonso, foram os nomeados pelo Conselho de Opinião da RTP. Estes quatro elementos cooptarão mais dois, que preencherão a equipa.
domingo, 20 de julho de 2014
Clara Riso na Casa Fernando Pessoa
A nova directora da Casa Fernando Pessoa, Clara Riso, considerou ser "um grande desafio" trabalhar numa instituição ligada ao universo do poeta, cuja riqueza "será um motor para criar uma programação criativa".
Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, desempenhou funções nas áreas de produção e internacionalização na Real Pelágio, coordenou as duas edições de Grandes Lições (publicações do programa Gulbenkian de cultura contemporânea) e o "Próximo Futuro" da Gulbenkian - com direcção artística de António Pinto Ribeiro. Em 2004, tornou-se leitora do Instituto Camões, tendo sido responsável pelo Centro de Língua Portuguesa desse instituto em Budapeste, na Hungria. Publicou nomeadamente Ou o poema contínuo de Herberto Helder: o livro de agora, uma espécie de lapso (Budapeste, 2008) e Um corpo escrevente - a poesia de Luiza Neto Jorge (Colóquio/Letras, 2002) (a partir do Diário de Notícias e do Expresso).
Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, desempenhou funções nas áreas de produção e internacionalização na Real Pelágio, coordenou as duas edições de Grandes Lições (publicações do programa Gulbenkian de cultura contemporânea) e o "Próximo Futuro" da Gulbenkian - com direcção artística de António Pinto Ribeiro. Em 2004, tornou-se leitora do Instituto Camões, tendo sido responsável pelo Centro de Língua Portuguesa desse instituto em Budapeste, na Hungria. Publicou nomeadamente Ou o poema contínuo de Herberto Helder: o livro de agora, uma espécie de lapso (Budapeste, 2008) e Um corpo escrevente - a poesia de Luiza Neto Jorge (Colóquio/Letras, 2002) (a partir do Diário de Notícias e do Expresso).
sábado, 19 de julho de 2014
O olhar inabitado das manhãs
Num pavilhão do Jardim Botânico ouviam-se, ao longe, os sons urbanos. Por vezes, um avião sobrevoava à procura de aterrar no aeroporto não distante do centro da cidade. A noite prometia ser de tempestade em dia de verão, mas apenas caíram uns pingos, que se ouviam sobre as folhas do jardim. Insectos rodeavam os holofotes que iluminavam a cena do interior do pavilhão.
Aqui, com texto de Cátia Terrinca a partir do universo poético de Sophia de Mello Breyner Andresen, e com direcção artística de Daniel Gorjão, execução de figurino de Teresa Capitão e cartaz de Ricardo Aço, para o Teatro do Vão, a actriz Sara Carinhas interpretou o papel único da peça. Às vezes, não ouvi bem o que ela disse, porque a poesia é uma arte difícil. De ler, de ouvir. Mas bastava a magia das palavras - os sons das palavras que se juntavam a outros sons vindos de fora, como escrevi acima.
No verdadeiro começo, Sara Carinhas indicara o caminho do pavilhão. Depois, elegante nos seus passos de dançarina, entrou no pavilhão. Ali não havia a divisão clássica de palco e plateia mas uma espécie de separador de fios, de onde se via a actriz. Uma vez, ela passou essa barreira de fios e ficou junto aos espectadores, evocando as palavras da poetisa que descansa agora no Panteão. Sara Carinhas elogiou, quase chorou, falou das coisas da vida, do amor e da maternidade, e também da separação.
Quanto tempo durou a representação? 30 minutos? 40 minutos? A poesia correu depressa, os gestos delicados concluíram-se. A noite de verão ficava serena. E acabava a contradição com o título O olhar inabitado das manhãs. Afinal, a noite e a manhã fazem parte do dia e da arte e da poesia.
Aqui, com texto de Cátia Terrinca a partir do universo poético de Sophia de Mello Breyner Andresen, e com direcção artística de Daniel Gorjão, execução de figurino de Teresa Capitão e cartaz de Ricardo Aço, para o Teatro do Vão, a actriz Sara Carinhas interpretou o papel único da peça. Às vezes, não ouvi bem o que ela disse, porque a poesia é uma arte difícil. De ler, de ouvir. Mas bastava a magia das palavras - os sons das palavras que se juntavam a outros sons vindos de fora, como escrevi acima.
No verdadeiro começo, Sara Carinhas indicara o caminho do pavilhão. Depois, elegante nos seus passos de dançarina, entrou no pavilhão. Ali não havia a divisão clássica de palco e plateia mas uma espécie de separador de fios, de onde se via a actriz. Uma vez, ela passou essa barreira de fios e ficou junto aos espectadores, evocando as palavras da poetisa que descansa agora no Panteão. Sara Carinhas elogiou, quase chorou, falou das coisas da vida, do amor e da maternidade, e também da separação.
Quanto tempo durou a representação? 30 minutos? 40 minutos? A poesia correu depressa, os gestos delicados concluíram-se. A noite de verão ficava serena. E acabava a contradição com o título O olhar inabitado das manhãs. Afinal, a noite e a manhã fazem parte do dia e da arte e da poesia.
sexta-feira, 18 de julho de 2014
Sessenta anos de música de Elvis Presley
No Guardian de hoje, Michael Hann escreveu sobre Elvis Presley. Amanhã, dia 18, faz sessenta anos que o Rei lançou o seu primeiro disco. Não mudou tudo na música mas quase tudo.
Antes, havia música adolescente, mas Elvis foi o primeiro a fazer música feita por adolescentes em vez de para adolescentes, disse o historiador pop Jon Savage. Elvis Presley era ainda adolescente quando fez esse registo. Depois, a indústria percebeu que tinha de fazer isso para os adolescentes gostarem de música, o que continua hoje a ser a regra.
No final de uma sessão fracassada nos Sun Studios, durante um intervalo de gravação, Presley começou a cantar uma música, acompanhado por Bill Black no contrabaixo e Scotty Moore na guitarra (na imagem ao lado). Impressionado com o contraste com o registado antes, o produtor Sam Phillips pediu ao trio para tocar de novo a música para a sua gravação em fita. Como contaria o historiador Jon Savage, demorou algum tempo para se compreender a música de Elvis. Ele era um músico local a gravar numa etiqueta local. Mas acabou por ser uma grande notícia em Memphis. Em 1956, Elvis tornou-se conhecido como cantor nacional e internacional, com o lançamento de Heartbreak Hotel, Don't Be Cruel and Hound Dog.
Ver aqui vídeo That's Alright Mama.
No final de uma sessão fracassada nos Sun Studios, durante um intervalo de gravação, Presley começou a cantar uma música, acompanhado por Bill Black no contrabaixo e Scotty Moore na guitarra (na imagem ao lado). Impressionado com o contraste com o registado antes, o produtor Sam Phillips pediu ao trio para tocar de novo a música para a sua gravação em fita. Como contaria o historiador Jon Savage, demorou algum tempo para se compreender a música de Elvis. Ele era um músico local a gravar numa etiqueta local. Mas acabou por ser uma grande notícia em Memphis. Em 1956, Elvis tornou-se conhecido como cantor nacional e internacional, com o lançamento de Heartbreak Hotel, Don't Be Cruel and Hound Dog.
Ver aqui vídeo That's Alright Mama.
domingo, 13 de julho de 2014
Curado Ribeiro e Milú
"Aconteceu nesta casa [Emissora Nacional, actual RDP, então em instalações da Rua do Quelhas, Lisboa]. Estávamos no hall e terão dito ao senhor Burnay, que era o padrasto da Milú: «precisamos de um rapaz que cante para fazer uma fita com a Milú». A Milú falou-me nisso. Depois o senhor Burnay falou-me também e disse-me se eu [Fernando Curado Ribeiro] queria. Eu queria tudo. «Quer fazer cinema»? «Quero sim senhor», disse logo. «Vai a provas». «Sim, senhor». E, pronto, fui fazer provas, que era para o Costa do Castelo, perdão, que eram para A Menina da Rádio e não para o Costa do Castelo. Mas as provas feitas com a Milú agradaram e anteciparam a feitura do Costa do Castelo e ficámos ambos, tanto a Milú como eu. E, depois, quando se fez A Menina da Rádio, eu continuei a ser a pessoa que estava indicada. Só a Milú por razões particulares é que não fez A Menina da Rádio. Foi feito o papel dela pela Maria Eugénia" (entrevista de Luís Garlito a Fernando Curado Ribeiro, programa A Minha Amiga Rádio, RDP, 3 de Junho de 1991, Arquivo Sonoro da RTP, AHD 11861-1).
Num dado momento, a actriz Milú decidiu ir para Espanha, para continuar a sua vida no cinema. Fernando Curado Ribeiro entrevistou-a e a fotografia ao lado foi reproduzida no semanário Rádio Nacional, de 18 de Julho de 1943.
Num dado momento, a actriz Milú decidiu ir para Espanha, para continuar a sua vida no cinema. Fernando Curado Ribeiro entrevistou-a e a fotografia ao lado foi reproduzida no semanário Rádio Nacional, de 18 de Julho de 1943.
quinta-feira, 10 de julho de 2014
Artistas da Emissora Nacional
A revista O Mundo Gráfico foi agora digitalizada na Hemeroteca Municipal de Lisboa. Ela foi editada entre entre 1940 e 1948, com o jornalista Artur Portela como primeiro director. O último número, 135, de Fevereiro de 1938, traz duas fotografias curiosas, a primeira respeitante ao coro feminino da Emissora Nacional e a segunda à orquestra típica portuguesa da mesma estação de rádio. Estes grupos actuavam nomeadamente nos Serões para Trabalhadores. Uma das cantoras que mais se destacou no coro feminino foi Maria de Lourdes Rezende, que rapidamente fez uma carreira a solo (pela má qualidade da imagem não consigo saber se ela ainda faz parte do agrupamento). O coro participava nos espectáculos com um vestuário uniformizado. A orquestra tinha 24 elementos e o maestro, podendo ver-se na fotografia uma cantora que a orquestra acompanhava.
quarta-feira, 9 de julho de 2014
As notícias sobre os festivais musicais
Durante o mês de Junho, o NOS Primavera Sound foi o festival de Verão com melhor desempenho mediático nos meios de comunicação social, com 986 notícias apuradas e mais de doze horas e vinte minutos no meio televisivo. Em segundo lugar, tendo perdido a liderança que mantinha desde Janeiro, o festival Rock in Rio teve 1392 notícias e oito horas e quarenta e cinco minutos de antena em televisão. Em terceiro lugar, surgiu o festival Sumol Summer Fest, com 232 notícias apuradas e uma hora e treze minutos registados na televisão (dados fornecidos pela Cision, empresa de planeamento, monitorizacão e análise dos media).
terça-feira, 8 de julho de 2014
Scannell e a televisão
O livro de Paddy Scannell, Television and the meaning of live, editado pela Polity (2014), chegou-me agora pelo correio. Fenomenologia da televisão, com grande destaque ao pensamento de Martin Heidegger, tecnologias, a voz na rádio e na televisão, a televisão e a história - eis alguns dos tópicos do novo livro do professor de Estudos de Comunicação da Universidade de Michigan. Dos textos mais recentes dele, retenho o livro Media and Communication (2007) e os capítulos de livro “The Question of Technology” (Michael Bailey (ed.), 2009 Narrating Media History) e “The Dialectic of Time and Television” (The Annals of the American Academy of Political and Social Sciences, 2009, vol 625). O prazer que me vai dar a sua leitura.
segunda-feira, 7 de julho de 2014
Pirandello no Porto
Com encenação de Nuno Carinhas, no Teatro Helena Sá e Costa, num exercício de alunos finalistas de teatro da ESMAE (Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo), representou-se Luigi Pirandello, Esta Noite Improvisa-se.
Os actores e actrizes, num total de quase quarenta alunos finalistas, foram generosos, alguns quase profissionais (por exemplo Maria Quintelas, Alexandre Calçada e Alejandro Rodríguez). A personagem encenador (Fábio A. Costa, que se intitula "moço de recados e actor em part-time" na sua página do Facebook) improvisa e procura apresentar as outras personagens artistas. Alguns protestam por causa da improvisação.Havia personagens-público, que barafustavam igualmente, com alguns a saírem da plateia. Alguns quadros gostei muito, caso da dança-aviadora e da procissão. A parte final, mais dramática, foi bem executada. Tudo a conferir alegria e intriga que interessa num espectáculo como este, arrancando gargalhadas sonoras no público aqui e ali (ver vídeo de apresentação).
Os actores e actrizes, num total de quase quarenta alunos finalistas, foram generosos, alguns quase profissionais (por exemplo Maria Quintelas, Alexandre Calçada e Alejandro Rodríguez). A personagem encenador (Fábio A. Costa, que se intitula "moço de recados e actor em part-time" na sua página do Facebook) improvisa e procura apresentar as outras personagens artistas. Alguns protestam por causa da improvisação.Havia personagens-público, que barafustavam igualmente, com alguns a saírem da plateia. Alguns quadros gostei muito, caso da dança-aviadora e da procissão. A parte final, mais dramática, foi bem executada. Tudo a conferir alegria e intriga que interessa num espectáculo como este, arrancando gargalhadas sonoras no público aqui e ali (ver vídeo de apresentação).
domingo, 6 de julho de 2014
Tubitek
A loja de discos Tubitek reabriu ontem no Porto, no mesmo local onde fez fama à volta da década de 1980. Nessa altura, coincidiu com dois movimentos distintos no campo da cultura musical: a passagem do vinil para o CD e as emissões de rádios livres.
Na abertura da loja, muita gente desse tempo estava ali para comprar e rever amigos ou revisitar uma época. A música pop-rock está muito presente no vinil e no CD, mas também há outros géneros, como a clássica.
Na abertura da loja, muita gente desse tempo estava ali para comprar e rever amigos ou revisitar uma época. A música pop-rock está muito presente no vinil e no CD, mas também há outros géneros, como a clássica.
Colóquio sobre história da rádio
Foi ontem no Porto que se discutiu sobre a história da rádio, com organização de Jorge Guimarães Silva.
Deixo momentos visuais desse encontro, realizado na loja MUUDA, onde se falou da rádio desde o começo até às rádios livres da década de 1980, casos da Rádio Delírio e da Rádio Caos (o segundo vídeo tem algumas irregularidades de boa captação de imagem).
Deixo momentos visuais desse encontro, realizado na loja MUUDA, onde se falou da rádio desde o começo até às rádios livres da década de 1980, casos da Rádio Delírio e da Rádio Caos (o segundo vídeo tem algumas irregularidades de boa captação de imagem).
sexta-feira, 4 de julho de 2014
Museu do ano segundo o Guardian
O que faz com que um museu seja nomeado indicado como o mais importante do ano? O Guardian de hoje ouve o artista Tracey Emin, o historiador David Starkey, a designer Margaret Howell e outros, que traçam o modelo de espaço favorito de exposição. Pelas fotografias, fico cheio de vontade em visitar: Hayward Gallery, Yorkshire Sculpture Park, Mary Rose Museum, Tate Britain, Ditchling Museum of Art + Craft e Sainsbury Centre for Visual Arts. Grande óbice: ficam a milhares de quilómetros de Lisboa.
A notícia conclui que o prémio de melhor museu será anunciado pela National Gallery no próximo dia 9 de Julho. E em Portugal?
A notícia conclui que o prémio de melhor museu será anunciado pela National Gallery no próximo dia 9 de Julho. E em Portugal?
quarta-feira, 2 de julho de 2014
Sophia
Retiro do Diário de Notícias online: "«A concessão das honras de Panteão Nacional a Sophia de Mello Breyner Andresen faz da sua memória um símbolo colectivo», afirmou hoje José Manuel dos Santos, no elogio fúnebre à poetisa, na sua trasladação para este o monumento nacional. Na sua alocução, José Manuel dos Santos, membro da Academia Nacional de Belas Artes, sublinhou que esta decisão da Assembleia da República «não faz - nunca fará - de Sophia um escritor oficial ou um poeta de regime, mesmo daquele que a reconheceu e que ela reconheceu». Santos ressalva que a entrada de Sophia no Panteão Nacional «é rito, símbolo e sinal». «Tem aquela solenidade, irmã do silêncio e da solidão, que é o contrário da pompa e da propaganda»".
terça-feira, 1 de julho de 2014
Carlos do Carmo
Do Expresso online: "Carlos do Carmo acaba de ser distinguido com o Lifetime Achievement Award, o Grammy que premeia a obra das grandes referências do panorama musical internacional. É a primeira vez que a maior e mais importante distinção da indústria musical internacional é atribuída a um artista português".
Paisagens sonoras
A paisagem sonora incorpora duas dimensões (som e silêncio) (p. 48), quer dizer som e vibração acústica (p. 13), actua na relação entre escutar e produzir som (p. 17), na harmonização de soar e ouvir (p. 18). Resumo para Carlos Alberto Augusto: paisagem sonora inclui ruído, silêncio e música. O seu livro Sons e Silêncios da Paisagem Sonora Portuguesa (2014) contém quatro capítulos (Rebates, Silêncios, Trovas, Harmonias), uma introdução e uma conclusão (Coda).
Seguindo um investigador (Bernie Krause), distingue três tipos de paisagem sonora: geofonia (sons da natureza, mar e vento), biofonia (sons dos animais e das plantas) e antropofonia (sons dos objectos feitos pelo homem, como as máquinas) (p. 24). O ruído é o caso do som intimidatório que invade a privacidade individual (p. 27), como o escape de uma motoreta ou o concerto na praça pública. Aparentemente, o ruído opõe-se ao silêncio. Mas John Cage concluiu que o silêncio não existe: fechado numa câmara anecóica (compartimento usado pelos especialistas de acústica, que elimina todos os ruídos do ambiente), Cage começou a ouvir ruídos - sons do fluxo sanguíneo e da corrente eléctrica que percorre o corpo humano (p. 47). Isso levou Carlos Alberto Augusto a preparar uma teoria do silêncio em seis constatações, uma delas em que indica que cada sociedade produz o seu silêncio (p. 52). Pode prevalecer o silêncio da suspeita e da desconfiança (p. 53), por exemplo nos países sem liberdade de expressão.
O primeiro símbolo que o autor estuda é o sino, instrumento poderoso cujo domínio sempre foi praticado pela Igreja e, em cada paróquia, dá conta da passagem do tempo mas também de acontecimentos sociais e de alerta (toque de rebate) (p. 20). O sino ainda repercute uma relação do espaço sonoro que define a área da paróquia: o sino da minha aldeia. Mas o autor estudo outros meios sonoros, caso da rádio. O som que se ouve através da rádio é transportado de um espaço para um outro espaço e tempo, a esquizofonia, que significa a não coincidência entre o espaço/tempo de produção e a sua recepção (pp. 40-41).
Leitura (muito aprazível): Carlos Alberto Augusto (2014). Sons e Silêncios da Paisagem Sonora Portuguesa. Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos, 94 p., 3,50 € (capa mole)
Seguindo um investigador (Bernie Krause), distingue três tipos de paisagem sonora: geofonia (sons da natureza, mar e vento), biofonia (sons dos animais e das plantas) e antropofonia (sons dos objectos feitos pelo homem, como as máquinas) (p. 24). O ruído é o caso do som intimidatório que invade a privacidade individual (p. 27), como o escape de uma motoreta ou o concerto na praça pública. Aparentemente, o ruído opõe-se ao silêncio. Mas John Cage concluiu que o silêncio não existe: fechado numa câmara anecóica (compartimento usado pelos especialistas de acústica, que elimina todos os ruídos do ambiente), Cage começou a ouvir ruídos - sons do fluxo sanguíneo e da corrente eléctrica que percorre o corpo humano (p. 47). Isso levou Carlos Alberto Augusto a preparar uma teoria do silêncio em seis constatações, uma delas em que indica que cada sociedade produz o seu silêncio (p. 52). Pode prevalecer o silêncio da suspeita e da desconfiança (p. 53), por exemplo nos países sem liberdade de expressão.
O primeiro símbolo que o autor estuda é o sino, instrumento poderoso cujo domínio sempre foi praticado pela Igreja e, em cada paróquia, dá conta da passagem do tempo mas também de acontecimentos sociais e de alerta (toque de rebate) (p. 20). O sino ainda repercute uma relação do espaço sonoro que define a área da paróquia: o sino da minha aldeia. Mas o autor estudo outros meios sonoros, caso da rádio. O som que se ouve através da rádio é transportado de um espaço para um outro espaço e tempo, a esquizofonia, que significa a não coincidência entre o espaço/tempo de produção e a sua recepção (pp. 40-41).
Leitura (muito aprazível): Carlos Alberto Augusto (2014). Sons e Silêncios da Paisagem Sonora Portuguesa. Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos, 94 p., 3,50 € (capa mole)
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