segunda-feira, 8 de março de 2004

Defendida tese de mestrado sobre ficção nacional (telenovelas)

Catarina Burnay, professora da Universidade Católica Portuguesa, defendeu hoje de manhã uma tese de mestrado sobre televisão, naquela universidade, intitulada "Ficção nacional: a emergência de um «novo» paradigma televisivo". O período de estudo foi o ano televisivo de 2000-1 e a telenovela investigada foi "A indomada". Para ela, o género telenovela produziu profundas alterações quer a nível da produção de televisão quer em termos de recepção.

A novel mestre (passou com a nota de Muito Bom) analisou a mudança de paradigma na audiência em termos de conteúdos ficcionais, quando as(os) telespectadoras(es) passaram a apreciar mais as telenovelas de produção nacional em detrimento das de origem brasileira. Antes de detalhar o seu estudo empírico, a autora analisou o fenómeno telenovela, desde Gabriela, cravo e canela (1977), na RTP - em que todo o país paralisou, obrigando mesmo ao adiamento de sessões parlamentares -, ao acordo escrito, em 1995, entre a SIC e a TV Globo para passagem em exclusivo no novo canal privado português desse formato, até à viragem entabulada pela TVI, que, na passagem da década, apostou na produção de telenovelas originais portuguesas. Tudo isto com o crescente clima de concorrência, com contra-programação e auto-promoção. Para Catarina Burnay, o novo paradigma televisivo, na TVI, deveu-se a uma associação de informação (de infotainment, com informação e entretenimento juntos), entretenimento e ficção nacional. Aqui o destaque iria para o trabalho da produtora NBP (de Nicolau Breyner).

Qual a base teórica da tese hoje defendida? Os estudos da escola de Frankfurt (indústria cultural), os cultural studies de Stuart Hall (com o seu texto fundador de 1973 de codificação/decodificação, agora disponível em português), bem como estudos da América Latina (Martín-Barbero e Maria Imacolata Lopes). Para além de uma análise quantitativa (1999-2002), a autora fez uma análise qualitativa, com entrevistas semi-directivas, em termos de produção (entrevistou responsáveis da TVI e da NBP) e em termos de recepção (21 entrevistas a consumidores de televisão). Quanto a conceitos de recepção operou quatro: quotidiano familiar/contexto de recepção, subjectividade/objectividade, género ficcional, produção e técnica.

Entre outras conclusões, o trabalho de Catarina Burnay aponta os seguintes sobre a produção ficcional portuguesa: boa representação da realidade nacional, técnica mais evoluida (se comparada com uma vintena de anos anteriores ao período estudado, em argumentos, actores e condução destes, e elementos técnicos empregues), representação de uma realidade menos violenta que a retratada nas telenovelas brasileiras, a ficção como agente socializante (no sentido de comunidades interpretativas ou imaginárias) e reconciliação do público português com o género.

Em suma, trata-se de um trabalho pioneiro em estudos de recepção de programas de ficção nacional televisiva, o que é de elogiar, estudar e continuar, no tocante à área das culturas do quotidiano, desenvolvida pela professora Isabel Ferin (Un. de Coimbra), aliás orientadora da tese de Catarina Burnay.

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