segunda-feira, 29 de março de 2004

DESCIDA NO NÚMERO DE ESPECTADORES DE CINEMA EM 2003

Segundo um comunicado do European Audiovisual Observatory, de 22 de Março último, houve uma baixa nas idas ao cinema na Europa comunitária da ordem dos 5%, em todos os cinco principais mercados (França, Alemanha, Itália, Espanha e Reino Unido). A maior queda verificou-se na Alemanha (9%), enquanto nos países a entrarem em Maio a Polónia registou uma queda de 14%. Mas a Lituânia e a Letónia tiveram mais espectadores de cinema.

Estima-se que nos 15 países da EU tenha havido 890,5 milhões de espectadores (não há um valor para Portugal, estimado sequer; espero que com a recente entrada em funcionamento da automatização das bilheteiras tal óbice desapareça). A França teve 174,2 milhões de espectadores, enquanto o Reino Unido teve 167,3 e a Alemanha 149 milhões. Dos filmes produzidos no espaço comunitário, o filme alemão Goodbye Lenin registou a venda de 6,4 milhões de bilhetes, tornando-se a película de maior sucesso o ano transacto. Por seu lado, as cinematografias espanhola e sueca também tiveram um ano relativamente bom.

Quais as razões para um decréscimo nas idas ao cinema? Com certeza, na minha interpretação, a crise económica e a expansão do cinema em casa.

O FIM DA ANIMAÇÃO TRADICIONAL

Tiro as ideias dos textos produzidos no suplemento Y, do Público, de 26 de Março. A propósito do filme de animação Kenai e Koda, uma das últimas oportunidades de ver um filme feito "à moda antiga" (texto de Sara Gomes) . O uso do computador deita fora o emprego de lápis, canetas, aguarelas e folhas de papel, que foram as matérias-primas de filmes como Branca de Neve, Pinóquio e Cinderela.

Diz o mesmo artigo de Sara Gomes que o argumento de Kenai e Koda (Brother Bear, no original) foi reescrito centenas de vezes, com os realizadores à procura, nas bibliotecas, de ideias a partir de histórias, lendas e mitos (imagem retirada do sítio da AllBestMovie.com). As primeiras versões do filme recuperariam elementos dramáticos da peça de Shakespeare, Rei Lear. O músico Phil Collins assina a banda sonora. Trata-se, pois, de uma história sobre amizade e tolerância, sobre um anti-herói, feita por dois realizadores - Aaron Blaise e Robert Walker -, animadores da Disney desde há 14 anos, incluindo Mulan (1998) e O rei leão (1995).

Da animação em papel à animação em computador

A apresentação do filme à imprensa europeia ocorreu em Janeiro último, com a presença dos dois realizadores. Que, obviamente, lamentaram o fim do desenho de animação tradicional. Nesse momento, fechava o estúdio de animação tradicional da Disney, conforme escrevi neste sítio, onde trabalhavam 280 desenhadores de animação. Muitos foram reintegrados noutras unidades da Disney, outros despedidos.

A razão era o avanço no cinema de animação por computador. A Pixar (que criou o sucesso do Natal chamado À procura de Nemo) e a Dreamcast (com Shrek, em 2001) já tinham enveredado, com muito sucesso, por essa via. E a Pixar anunciara já não continuar a parceria com a Disney, como eu também já escrevi aqui.

Há quem ache que o desenho tradicional vá voltar a brilhar, pois o "computador torna tudo mais artificial e faz com que as personagens sejam muito mecânicas" (realizadora Aaaron Blaise, ainda na peça noticiosa de Sara Gomes), mas também se reconhece que desaparece o "pesadelo da criação e coordenação das cores" com a sua codificação num computador. Ou seja, com a adesão da Disney à digitalização, toda a indústria cultural vai mudar o modo produtivo dos filmes animados. Até porque, também se diz, a computação gráfica abre um novo mundo de oportunidades para a ficção. E os realizadores de Kenai e Koda estão já a desenvolver competências no mundo dos computadores, após a necessária reciclagem de conhecimentos.

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