terça-feira, 1 de junho de 2004

TESE DE MESTRADO SOBRE RÁDIO EM DEFESA NA UNIVERSIDADE DE COIMBRA

João Magalhães Perpétuo Correia defende hoje, pelas 15:00, a sua tese de mestrado intitulada A convergência das novas tecnologias para o reforço do interesse e utilidade pública das rádios locais, na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Em discussão, as estações locais de Viseu. Prometo voltar ao assunto.

AS NOTÍCIAS EM MAIO DE 1974 - II

[continuação da mensagem de ontem]

Faz-se um registo performativo, no sentido dado por John L. Austin (li a tradução francesa: Quand dire, c’est faire. Paris, Seuil, 1970) pela enunciação, produz-se a acção. Um esclarecimento, declaração, desmentido ou comunicado bastavam para negar a ligação de indivíduos à Pide. Uma curiosa carta, assinada pelo secretário-geral da Cidla, desmentia qualquer ligação com o anterior regime e declarava as suas “reconhecidas convicções liberais”, puro acto elocutório. A linguagem transporta a mudança e expressa a nova mentalidade, que incluiu lutas pela abolição de exames nas escolas, do traje de rigor no teatro S. Carlos, das gravatas na Casa do Alentejo, do boné, gravata e crachá dos motoristas de táxi, da gravata ou qualquer outra imposição de roupa nos alunos de uma escola comercial, da farda da empregada doméstica e do cinto de segurança nos instrutores de automóveis e examinadores. A defesa da integridade física, nos primeiros casos, e a liberdade expressa pela assunção de um vestuário mais informal, nos casos seguintes, definiam, pelo discurso, as novas regras sociais.

Houve também a redefinição das carreiras profissionais, com mudança de nomes. Os enfermeiros do centro de saúde mental do Porto exigiam o fim das hierarquias, unindo tudo numa só categoria profissional. Quanto aos 2500 auxiliares de enfermagem, lutaram pela extinção da categoria e a promoção a enfermeiros. Em plenário, os mestres do ensino secundário reivindicaram a substituição da categoria de mestre pela de professor, enquanto os auxiliares de limpeza das escolas queriam passar à categoria de contínuos. Em anúncio dos hospitais centrais de Lisboa, pedia-se a admissão de empregadas auxiliares, abandonando a velha designação de “criada”, e os jardineiros consideravam-se floricultores e não trabalhadores rurais. As mudanças de nomes pertenciam, na maioria, a carreiras de base. Os nomes antigos estavam depreciados; a alteração dava uma aparência democrática de elevação de classe, de aceitação social pelas tarefas desempenhadas.

De reconhecido papel no futuro do país, a escola e a educação têm uma dimensão apreciável nas notícias do mês de Maio de 1974. Sujeitas a tremendas contradições, fruto de uma polifonia de vozes e de interesses, emergem a utopia e os ideais nos discursos sobre a educação. Para os professores de História do liceu D. João III, era preciso redefinir o “papel da história como elemento primordial da integração consciente e responsável do aluno na nova sociedade”. Para um grupo de professores do Porto, em comunicado, “torna-se urgente que libertemos a criança. (Elas) continuam nas escolas e nos liceus a fazer redacções sobre a Primavera, a carochinha, a desenhar canecas, púcaros e outras futilidades. Ainda não se lhes deu oportunidade de tomar parte activa na onda de liberdade que varreu a ideologia fascista do nosso país”. Um grupo de mobilização dos alunos dos liceus de Sintra escrevia, também em comunicado: “o ensino é cooperação. Temos de trabalhar no sentido da destruição das barreiras clássicas entre professores e alunos. Não se trata mais de amontoar conhecimentos à custa de métodos repressivos, autoritários, negação constante da personalidade dos alunos”.

Os professores, em diversas ocasiões e locais protestaram, no início do mês, contra a possível recondução do ministro Veiga Simão. Estudantes da Faculdade de Letras de Lisboa pediam a abolição da tese de licenciatura e na do Porto reivindicavam a abolição dos exames e o fim do ano lectivo. Em reunião geral, aprovava-se a passagem administrativa. Alunos da escola Aurélia de Sousa destituiam a directora, ao passo que a Faculdade de Letras de Lisboa exigia a expulsão de Veríssimo Serrão, Borges Macedo e outros professores e a readmissão de professores afastados por razões ideológicas e políticas. Mas outros alunos defendiam a manutenção de Borges de Macedo. Um abaixo-assinado propunha baixar a média de dispensa de exames do 7º ano de 14 para 12 valores. Os alunos do 3º ano dos liceus do Porto, em petição, pretendiam a dispensa de exames com média de 10 valores. Outros estudantes do secundário iam mais longe, ao exigirem aprovação com 8,5 valores na escrita ou na oral. Outros ainda, um pouco mais moderados, pediam dispensa de exames liceais a partir de 9,5 valores.

Em Coimbra, os estudantes pretendiam a abolição dos exames de admissão à universidade. Uma manifestação em Lisboa, com cerca de sete mil estudantes, estava contra os exames no secundário e selecção para a universidade. A greve pela abolição de exames atingiu os liceus de todo o país. Na sequência disto, o ministro da Educação disse, temeroso: os exames iam realizar-se, “embora num espírito de benevolência”. O discurso de pais e encarregados de educação dos alunos do liceu Rainha D. Leonor era mais radical, ao mostrar-se a favor da abolição do exame, que “não é mais do que uma contraprova redundante de conhecimentos já devidamente avaliados no decurso do ano lectivo”. Quanto aos alunos da escola comercial D. Maria, eles pediam a “anulação dos exames de dactilografia e caligrafia, pois o estado de nervoso do aluno nestes casos específicos não lhe permite dar a mostra real do seu valor”! Uma última reivindicação: acabar com as aulas ao sábado.

[continua]

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