quinta-feira, 16 de junho de 2005

MEDIA, IMIGRAÇÃO E MINORIAS ÉTNICAS

Foi ontem apresentado o trabalho conduzido por Isabel Ferin (Universidade de Coimbra) e de Clara Almeida Santos com o título acima designado, uma encomenda do Observatório da Imigração, entidade pertencente ao ACIME. A apresentação do trabalho decorreu durante a tarde, integrado num conjunto de actividades, de que destaco também a conferência de Gian Maria Bellu, jornalista do diário italiano La Repubblica sobre a temática imigração e integração (à esquerda na imagem).

No trabalho de Ferin e colega, foram observadas 1791 peças jornalísticas respeitantes a 2004 (imprensa e televisão). Da análise as autoras concluiram ter havido um pico em Janeiro, sendo a hipótese explicativa o facto de as quotas de entrada de imigrantes terem constado da agenda política nessa altura.

Dos principais temas abordados nas notícias, ressaltam o ilegal (ou indocumentado) e o policial. Mas o crime é o mais abordado enquanto assunto noticioso (19,5% das peças de imprensa e 26,6% em televisão). As autoras encontraram uma dicotomia nas peças de televisão: muito curtas (em voz off) mas também mais compridas (reportagens).

Tem havido, ao longo do tempo, uma melhor definição de minorias, deixando o singular para passar a distinguir as várias origens: de leste, brasileiros, chineses, paquistaneses, indianos. Por exemplo, na televisão deu-se uma maior ênfase à comunidade chinesa enquanto a cigana (predominante no ano anterior) quase desapareceu. Em termos de peças de imprensa, há uma dispersão geográfica ao passo que as notícias de televisão localizam-se em Lisboa (35,4%), devido às estações estarem aqui situadas. Quanto a vozes, a imprensa recorre com frequência a especialistas sobre a imigração (8%), ao passo que a televisão junta especialistas e vozes populares, verificando-se um decréscimo de vozes institucionais (SEF, governo, polícia).

O trabalho de Isabel Ferin e Clara Almeida Santos foi comentado por jornalistas, num conjunto de contributos úteis. Refira-se que este é o terceiro trabalho de análise dos media sobre imigração e minorias étnicas, fruto de encomenda do Alto Comissariado para a Integração e Minorias Étnicas, sendo o primeiro executado pelo Obercom e o segundo já liderado por Isabel Ferin. Neste momento, não se sabe se o programa irá continuar - pois prevêem-se alterações na cúpula do ACIME -, mas julgo ser muito valiosa a sua manutenção.

Prémios de jornalismo

Já ontem referi os nomes dos vencedores dos prémios [na imagem, o padre António Vaz Pinto, Alto Comissário, dava começo à sessão de entrega de prémios]. Manifesto, antes de tudo, o regozijo pela rádio ter arrecadado dois prémios, o grande prémio, atribuído a Carlos Raleiras (TSF) - Fronteiras à margem do sonho - e o da rádio, ganho por António José Soares (RR) - Sorrisos de leste. São peças de grande densidade emocional e bem construídas, em que as vozes e os sons ganham uma nova dimensão. Se Soares apresenta um trabalho optimista (casos de sucesso entre imigrantes, que ele entrevistou ao longo do país), Raleiras mostra como o sonho de chegar a uma terra prometida pode ser uma armadilha, mas onde há ajuda e possibilidades de refazer a esperança.

Na imprensa, Luís Filipe Ribeiro (Visão) - De Portugal, com amor - retratou o modo como ucranianos vivem em Portugal, muitas vezes afastados da família e o modo como se reencontram. O jornalista (e o fotógrafo) foram à Ucrânia e trouxeram retratos dessas famílias cheias de saudade e descrevem como uma jovem se reencontrou com o pai, aqui em Lisboa, quatro anos depois da separação. A sua leitura faz lembrar os pequenos dramas pessoais e familiares de portugueses que, nas décadas passadas, foram trabalhar para França, Alemanha, Suíça e Luxemburgo.

Já a peça de Carla Adão (RTP África) - Herança d'África [os dois fotogramas aqui inseridos pertencem ao trabalho da jornalista] - retrata a vida de jovens de segunda geração de imigrantes de países africanos, já aqui nascidos e que se sentem bem em Portugal mas onde há memórias e apelos de outras latitudes e culturas. Sem ter um texto construído pela jornalista - que preferiu recorrer a uma psicóloga de educação para fazer de "apresentadora" dos vários casos pessoais - a peça retrata esse misto de pertença e não-pertença, positivo porque traz novas mentalidades e perspectivas, negativo porque pode conduzir a uma descrença no futuro pessoal.


Observação: o blogueiro foi presidente do júri deste prémio de jornalismo.

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