Para Georg Simmel, o homem tem uma mente estimulada pelas diferenças existentes entre as sensações do momento e as anteriores, regularidade versus diferenciação e contrastes de percurso (p. 32). O homem da metrópole protege-se contra a perturbação de sentimentos e emoções, mais adequadas ao homem da pequena localidade. Terreno do cosmopolitismo (p. 39), a metrópole significa horários e pontualidade, reflexão e distanciamento face ao outro (blasé), economia e divisão económica do mercado, calculismo.
As pessoas tomam atitudes blasé na metrópole, sem reacção e capacidade de reagir a novos estímulos com as energias adequadas, com uma atitude de reserva (pp. 35-36), a qual permite ignorar vizinhos de longa data e surgir aos olhos do bairro com distância e indiferença, considera Simmel. Às vezes, há uma leve antipatia, outras vezes, um mútuo estranhamento e aversão que podem acabar em repulsa e conflito. A reserva pode, por outro lado, dar ao indivíduo um determinado grau de liberdade pessoal (p. 37).
A vida metropolitana só se concebe quando as actividades e relações recíprocas estão organizadas e coordenadas (p. 34). Pontualidade, calendarização e exactidão associam-se ao carácter racional e capitalista e conduzem à exclusão dos traços e impulsos humanos, instintivos e irracionais. Simmel dá um exemplo: se todos os relógios de Berlim avariassem de repente, nem que fosse só por uma hora, a vida económica e comercial seria perturbada de maneira duradoura.
Aos sentimentos resguardados e ao espírito de cronómetro que existe na cidade, Simmel acrescenta a ideia de sede da economia monetária, cuja multiplicidade e concentração de actividades ultrapassa em muito o mercado agrícola. A economia monetária e o domínio do intelecto encontram-se em estreita relação entre si. O dinheiro põe em destaque o que é comum e reduz a nível quantitativo o que é qualitativo e individual (p. 33). Face à sua dimensão, a cidade oferece uma individualização intelectual das qualidades mentais, que conduz a excentricidades e a auto-distância dos indivíduos (p. 40). Se, na pequena localidade, os encontros frequentes e duradouros asseguram uma apreciação inequívoca do carácter de cada um (pp. 41-42), na metrópole constitui-se um lugar privilegiado de conflito e de tentativas de unificação.
A cidade moderna abastece-se de uma produção destinada ao mercado, orientada para compradores desconhecidos que nunca chegam a ser vistos pelos produtores, que quer dizer que os interesses de cada parte adquirem uma dimensão de objectividade (p. 33). O espírito moderno é um espírito calculista e corresponde ao ideal das ciências naturais.
Leitura: Georg Simmel (2001). “A metrópole e a vida do espírito”. In Carlos Fortuna (org.) Cidade, cultura e globalização. Oeiras: Celta
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