quinta-feira, 17 de novembro de 2016

O Novo Dancing Elétrico

Gostei da peça, ao início a lembrar-me o neo-realismo, embora sem uma segunda mensagem de superação da alienação, o que me acordou para outra realidade. Mas persisto na ideia: afinal, são gente comum, que trabalha, é anónima, está condenada a perder - no caso, não o dinheiro nem a posição social mas a ser esquecida, a viver isolada em casa com sonhos que apenas pertencem aquelas pessoas.

São duas irmãs mais velhas - Breda e Clara - que recordam a juventude dos seus 17 anos de idade e Roller Royle, o cantor que apareceu na aldeia piscatória irlandesa, repleta de peixes e mexericos (coscuvilhices), e encantou as raparigas com a sua voz e, especialmente,o ritmar das suas ancas a lembrar o outro, o americano Elvis Presley. As mulheres acabaram por ficar sozinhas em casa, a verem a juventude a fugir, restando a memória das deslocações de bicicleta - longos quinze quilómetros - até ao Novo Dancing Elétrico. Elas e as outras mulheres ficaram apaixonadas e formaram logo sonhos, que permaneceram sem realização efetiva até à velhice. Ensaiam todos os dias, como se fosse a preparação para uma representação final. Elas conhecem tão bem as deixas que as duas repetem o papel de cada uma. Deixam as roupas de trazer em casa e engalam-se como se fossem para a discoteca, calçando sapatos de tacão alto e maquilhando-se. Mas aqui a ilusão revela-se dramática, quando a maquilhagem atinge formas ridículas.


A terceira irmã, Ada, é mais nova - mas faz o mesmo circuito entre casa e a fábrica de conservas de peixe. Parece condenada ao destino de memórias de Breda e Clara quando aparece o peixeiro Patsy. As duas irmãs mais velhas abandonam o seu delírio diário e esforçam-se, por uma vez, para servir uma xícara de chá e uma fatia do bolo de chocolate que uma delas fez. Mas o peixeiro, até aí rejeitado pelas suas histórias, acaba por se ir embora. Patsy confessa ser filho de um amor rápido da sua mãe e do próprio Roller Royle. E tudo volta ao começo.

O Novo Dancing Elétrico, de Enda Walsh, tradução de Joana Frazão, com Andreia Bento, Antónia Terrinha, Isabel Muñoz Cardoso e Pedro Carraca, cenografia e figurinos de Rita Lopes Alves, luz de Pedro Domingos, assistência de encenação de Andreia Bento e Pedro Carraca e encenação Jorge Silva Melo para Artistas Unidos - Teatro da Politécnica. O desempenho das três atrizes é muito bom, mas quero destacar o papel de Antónia Terrinha. A vantagem de estar na primeira fila a ver o desenrolar da história quase que me transporta para dentro da cena e perscrutar melhor os ambientes e o que pensam as personagens.

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