quinta-feira, 20 de setembro de 2007

POSTAIS DE BERLIM - 5


O Museu do Cinema, no complexo do Sony Center, é uma atracção da nova Berlim. Fica na praça Potsdamer.
Quais os principais relevos? Imagens e ecrãs. Espaço dado às primeiras divas, a Robert Wiene, à República de Weimar, com Ernst Lubitsch, Friedrich Murnau, Fritz Lang, Wilhelm Pabst e ao cinema expressionista, a Marlene Dietrich - no centro do museu e ocupando mais espaço que qualquer outro artista ou realizador (três salas), ela que nasceu em Berlim, o Anjo Azul de Josef von Sternberg, a quem acompanhou até Hollywood -, ao III Reich e a Leni Riefenstahl, ao exílio e pós-guerra, os nomes mais recentes como Wim Wenders, Rainer Werner Fassbinder e a sua musa Hanna Schygulla (nomeadamente em Die Ehre der Maria Braun, A Honra Perdida de Maria Braun). As últimas salas são dedicadas ao cinema fantástico e misterioso, como King Kong, 2001 Odisseia no Espaço, Guerra das Estrelas, etc., em que o centro do mundo é o cinema dos Estados Unidos.

No Filmmuseum Berlin - que apresenta, em colecção permanente, parte do espólio da Cinemateca Alemã, fundada em 1962 - destaque ainda para os modelos de vestuário usados por Marlene Dietrich, mas igualmente guarda-roupa usado em diversos filmes ao longo da história do cinema alemão (e não só) e uma sala-armazém onde todos os modelos de roupa estão arrumados como se pudessem ser alugados ou utilizados ao dia, bem conservados e dando a ideia de organização de uma responsável pelo guarda-roupa num filme.

Além da ênfase dada a Marlene Dietrich, o museu - e o livro catálogo Film Museum Berlin, editado por Wolfgang Jacobsen, Hans Helmut Prinzler e Werner Sudendorf (2000) - dão destaque aos inventores Max Skladanowsky, Oskar Messter e Guido Seeber, aos pioneiros e divas como Henry Porten (Berlim), Asta Nielsen (Copenhaga) e Fern Andra (Illinois, Estados Unidos). Os autores do catálogo evidenciam Fern Andra: Madonna sofredora, mulher moderna, acrobata audaz. E escrevem mais sobre ela: uma das primeiras personalidades do ecrã, capaz de respirar expressão e tornar popular géneros, tipos e papéis distintos.

Depois de Dietrich, o segundo principal destaque é conferido ao filme de Robert Wiene (1920), Das cabinet des Dr. Caligari (O Gabinete do Dr. Caligari). O expressionismo patenteia-se nos cartazes, nos ângulos de visão desses cartazes, nas memórias do filme, nos múltiplos ecrãs onde se visionam diversos planos do filme. É um momento alto na visita ao museu.

Embora compreensível mas comentável (criticável), há uma linha ideológica no traçado do museu - leia-se: nacionalista. A Alemanha disputou com a França a paternidade da invenção do cinema, mas rapidamente ultrapassou o país vizinho e tornou-se o maior mercado mundial na produção do cinema. O espaço dado ao expressionismo é disso significativo. A ascensão de Hitler ao poder significou o êxodo de realizadores, artistas e divas para o outro lado do Atlântico. O cinema americano lucrou muito com esta passagem. Marlene Dietrich é um exemplo: artista de vários sucessos mas também envolvida na política, quando apoiou as tropas aliadas contra o ditador alemão. A reflexão sobre o período nazi e a área reservada aos exilados acentuam a ruptura entre dois mundos não conciliáveis. Os anos pós-guerra são a recuperação da ferida. Sissi, a jovem imperatriz (protagonizada por Romy Schneider), é a representação feliz e ingénua desse voltar a página (filmes de 1955). De Sissi, que desce o Danúbio até ao imperador que a espera, mais a tiara real, ficaria a imagem da jovem rebelde e apaixonada mas igualmente conciliadora e humanista que procurou modernizar uma corte barroca e ossificada, com quem muitas raparigas e mulheres simpatizaram, numa Alemanha do então rígido sistema político de Konrad Adenauer. O muro de Berlim (1961) faria regressar suspeitas de calma não alcançada. Nas estações de metro do lado oriental, os
passageiros tinham de sair em determinadas portas, pois nem em todas as carruagens as portas abriam. Fora, soldados de metralhadora acompanhavam a identificação desses passageiros. Os anos de chumbo aparecem representados nos filmes de Fassbinder, caso de A Honra Perdida de Maria Braun. As brigadas Baader-Meinhof, ou Fracção do Exército Vermelho (fundada em 1970), iriam ser responsáveis por 34 assassinatos políticos.


[imagem de Berlim leste a partir da torre da televisão]

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