“Todos os jornais e revistas possuem leitores, poucos ou muitos. Porém, os jornais e as revistas têm tiragens que nem sempre correspondem ao seu verdadeiro número de leitores. Há que diferenciar entre os chamados leitores regulares e os leitores ocasionais ou excepcionais, como sejam os leitores de domingo, nos jornais, ou de tiragens especiais, nas revistas” [Salviano Cruz (1952). "Problemas económicos dos jornais e revistas de Portugal e os seus leitores". A Revista de Pesquisas Económico-Sociais, 3: 303-319].
Assim, pergunta Salviano Cruz, quantos leitores tem determinada publicação? E como são qualitativamente, social e economicamente? O autor parte de um inquérito feito em Lisboa e no Porto pelo processo de amostra estruturada (embora não diga o número de inquiridos, a data em que o trabalho foi feito, qual a entidade que solicitou o estudo e a margem de erro, elementos hoje fundamentais num inquérito, mas indica haver dois estudos por ano, em Junho e em Dezembro). Trata-se, a meu ver, do primeiro texto e estudo de meios em Portugal, pelo que merece uma atenção especial.
Quanto a Lisboa, o jornal mais lido em 1952 era o Diário de Notícias, seguindo-se o Diário Popular, O Século e O Diário de Lisboa, este apresentado como “o jornal mais progressivo e dinâmico desde há 20 a 25 anos”. Além dos chamados quatro grandes, o autor faz uma classificação da imprensa independente em três grupos: 1) desportiva, com A Bola à frente, 2) política, com O Diário da Manhã à frente de A República, e 3) católica, com As Novidades e A Voz. Em Lisboa, 60% dos leitores de classe média e superior, 73% da classe média baixa e 70% de homens e 59% de mulheres lêem o Diário de Notícias; no Porto, 80% de leitores da classe média alta lêem O Primeiro de Janeiro, com 66% de homens e 43% de mulheres.
Já no tocante aos jornais do Porto, O Primeiro de Janeiro aparece à frente, seguido do Jornal de Notícias, O Comércio do Porto e o Diário do Norte. Na imprensa desportiva, O Norte Desportivo aparece à frente de A Bola e O Mundo Desportivo.
Enquanto em Lisboa a imprensa do Porto não chega aos 6%, no Porto a imprensa de Lisboa alcança 27%. Em termos de leitura regular, o Diário de Notícias atinge 57% dos leitores, a que se seguem O Diário Popular e O Século.
O impacto da publicidade junto dos leitores é um dos elementos primordiais do estudo de Salviano Cruz. Por exemplo, a publicidade a produtos higiénicos de carácter feminino no Diário de Lisboa parece pouco indicada. Por outro lado, o preço da publicidade em O Século pode não se justificar, dado o número pouco representativo de leitores que a apreciam. O autor recomenda ser pouco aconselhável economicamente fazer publicidade nos quatro principais jornais de Lisboa em simultâneo. No Porto, para os produtos populares de multidão (é a palavra usada), O Jornal de Notícias é o segundo mais indicado. Destaca-se a atitude menos receptiva à publicidade por parte de O Primeiro de Janeiro.
Salviano Cruz chama a atenção para as estatísticas inflacionadas de tiragem e de vendas apresentadas pelos jornais.
Quanto a revistas, o estudo conclui que 17% da população de Lisboa e 42% da população do Porto não lê revistas. As mais lidas são O Século Ilustrado (45 mil leitores), A Flama (cerca de 43 mil leitores), Modas e Bordados (quase 38 mil leitores). Os leitores regulares predominam sobre os ocasionais. Se O Século Ilustrado é lido pela classe média superior para cima e tem mais leitores masculinos no Porto e femininos em Lisboa, A Flama é lida pela classe média baixa, principalmente no Porto, com maior afluência de leitores católicos. Modas e Bordados e Eva são publicações para mulheres e As Selecções do Reader’s Digest tem na classe média alta o maior número de leitores.
Dos assuntos mais lidos nos jornais, primeiro vem o noticiário internacional e depois o nacional. Os leitores de O Século também gostam de ler os editoriais e o caso do dia (penso que crime ou outro assunto do dia) e os leitores do Diário de Notícias apreciam os anúncios e a secção Cidade.
O autor, na parte final do seu artigo, volta ao tema da publicidade. Escreve ele que, em contraste com as dificuldades da publicidade na imprensa, a da rádio está em aperfeiçoamento, além de que existem cerca de 600 mil aparelhos espalhados pelo país. O maior jornal não ia além de 90 mil leitores, o que indica uma maior concorrência entre os meios. A televisão ainda não tinha chegado e baralhado de novo as estimativas.
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