segunda-feira, 3 de junho de 2019

Bernardino Pires (7)

Gosto particularmente da composição da fotografia de Bernardino Pires, a primeira em baixo. O local é a Ribeira do Porto, próximo da ponte D. Luís, que se observa em fundo. O mercado é informal. O fotógrafo encontrou vendedeiras de legumes e de pequenos animais vivos. Seria outono ou inverno, a ver pela roupa da mulher, guarda-chuva da criança e chapéu do homem. Das imagens que eu conheço de Bernardino Pires, esta é uma construção para a máquina fotográfica, com os modelos a olharem para a câmara.
Volto à roupa: do xaile, avental e socos (socas) da mulher aos tamancos de madeira do rapaz e ao sobretudo do homem. E detenho-me no olhar: incerteza nela, desconfiança nos dois companheiros da imagem. O fotógrafo deve tê-los abordado não como cliente mas apenas para fazer o retrato, o que motivou as suas expressões. Há duas caixas de animais, a de cima, mais evidente, de aves, a de baixo talvez de coelhos. O conjunto de vendedores está no passeio junto à margem do rio. O fundo da paisagem é, para mim, majestoso: a ponte, o mosteiro (quartel) e escarpa da serra do Pilar, esta densamente povoada (fabriquetas?), e o rio sereno. O dia estaria húmido, sem sol.
A segunda imagem, tirada no mesmo local mas em dia de sol, mostra o potencial cliente, de fato, gravata e sobretudo, a inquirir preços dos galináceos. A vendedeira está de costas mas a fotografia permite-nos ver os adereços de vestuário, a incluir o lenço enrolado na cabeça e uma grossa argola no ouvido. As duas jovens, do lado direito da imagem, são parecidas no vestuário e nos gestos, possivelmente acompanhando o homem mas nada interessadas em animais vivos. As saias e casacos e o estilo de penteados do cabelo que usam indicam tratar-se de uma imagem previsivelmente do começo da década de 1950.
Por detrás das duas mulheres, a porta do prédio número 24 indicia uma adega (tasco ou tasca), a associar o trabalho e o lazer. À esquerda, por detrás da cabeça do comprador, há uma placa presa à parede, a lembrar as que indicavam os serviços dos CTT.
A última imagem, já aqui abordada e comentada, fornece-nos outro ângulo do mercado informal, com um novo potencial cliente a abordar as vendedeiras e igualmente bem vestido. Além dos comentários surgidos na inserção anterior da imagem, noto o ar sereno - como o rio da primeira imagem. Ou uma quase sabedoria da espera que as vendas se efetuem, com os vendedores sentados ou em cócoras, como a figura no extremo esquerdo.




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